Decisão de Marcelo “não era necessária e pode ser perigosa”. Escutas são “um grande abuso”

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António Cotrim / Lusa

Augusto Santos Silva

Dissolução do parlamento “significa que o MP, ou parte do MP, pode determinar o tempo dos mandatos políticos”. Recurso à técnica das escutas na investigação é “um grande abuso”, defende o Presidente da Assembleia da República.

O presidente da Assembleia da República comentou esta quarta-feira toda a polémica crise política que se vive atualmente em Portugal, defendendo que a decisão do Presidente diz que “não era necessária e pode ser perigosa porque há uma maioria parlamentar coesa e estável”.

Em Grande Entrevista à RTP3, Augusto Santos Silva começou por considerar a decisão “legítima“, mas completou dizendo que não era necessária.

“Porque é que pode ser perigosa? É porque na prática significa que o Ministério Público, ou parte do Ministério Público, pode determinar o tempo dos mandatos políticos, o tempo da agenda política e o tema da agenda política”, explicou.

Além disso, lembrou que “não houve saída voluntária do primeiro-ministro”.

“Não se tratava de nenhuma responsabilização do Presidente” e teria sido evitado o fim da estabilidade política, “um triunfo essencial que o país tem e se arrisca a perder”.

Uso de escutas é “um grande abuso”

O presidente da Assembleia da República criticou também a existência de “um grande abuso” do recurso à técnica das escutas na investigação, sendo da opinião de que se trata de uma técnica que permite “descontextualizações” de conversas em muitos casos e que é muito invasiva da privacidade e, igualmente, a “tentação de se deter” para investigar.

Segundo Augusto Santos Silva, verifica-se um recurso a diligências “gravosas”, como buscas domiciliárias, em fases muito iniciais de processos de investigação, ”tipo pesca de arrastão”.

Aproveitou também para atacar o “cinismo” dos argumentos do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público.

“Respeito o Sindicato dos Magistrados do Ministério Público nas suas funções sindicais, mas não aceito que seja o sindicato, e não a senhora procuradora [Geral da República, Lucília Gago], ou quem ela entender, a ser a porta-voz do Ministério Público e a agir publicamente como se fossem os chefes do Ministério Público”, declarou o ex-ministro socialista.

Pediu ainda desculpa ao autarca de Sines, por este ter saído de detenção após seis noites sem qualquer suspeita de corrupção.

“Ainda ninguém lhe pediu desculpa. Peço eu. E sabe porque é que lhe peço? Porque eu sou o presidente da Assembleia da República”, disse: “Estou bastante triste com isto, com as consequências para o país, mas também muito inconformado”, acrescentou.

“Temos o direito de pedir rapidez à Justiça”

Santos Silva aproveitou para lembrar os erros sucessivos da Justiça com casos que envolvem políticos. Em relação à Operação Influencer, que envolve o primeiro-ministro, pede à Procuradoria-Geral esclarecimentos e ao Supremo Tribunal da Justiça (STJ) agilidade no processo.

“Ao constituir arguidos em processos de que depois não avançam – em alguns casos não chega a haver acusação, noutros há a acusação mas as pessoas são inocentadas em primeira instância —, provavelmente a constituição de arguido por si só, ao contrário do que é a perceção pública, não significa que haja suspeitas fundadas”, referiu.

“É um caso muitíssimo grave e é muito importante que se esclareça o mais depressa possível. Creio que temos o direito de pedir ao STJ que seja lesto na realização do inquérito”, disse, sublinhando que “entretanto, ficámos a saber que esse inquérito já corre desde o dia 17 outubro”.

“Cinco meses é um período de tempo que me parece mais do que suficiente para que o inquérito seja concluído e o conjunto dos portugueses saiba — da única fonte que deve saber, que é a justiça — o que realmente se passou e se há alguma responsabilidade penal do primeiro-ministro”, sustentou.

“Acho que a justiça tem todas as condições para que nos informe – só as justiça nos pode informar – a tempo das pessoas perceberem e poderem avaliar o que se passou”.

ZAP //

1 Comment

  1. Concordo com este senhor, mas mesmo assim acho que este Governo já está (estava) de tal modo fragilizado, descredibilizado e instável (por todas as polémicas anteriores e mais esta última) que eleições antecipadas são o melhor remédio. Pena é não serem mais cedo.

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