A mítica Cúpula de Ferro que defende Israel esteve quase para não existir

Avichai Socher / IDF

Iron Dome, ou “Cúpula de Ferro”, o sistema antimíssil de Israel

Israel tem atualmente as defesas anti-mísseis mais famosas — e testadas — do mundo, incluindo a lendária Cúpula de Ferro. Mas a oposição dos militares israelitas quase deitou por terra estas defesas, décadas antes de se virem a revelar essenciais.

A famosa “Iron Dome”, a “Cúpula de Ferro” de Israel que recentemente voltou a mostrar-se eficaz na defesa do país contra os mísseis lançados pelo Irão, esteve quase para não existir, revela um relatório do grupo de reflexão britânico RUSI – Royal United Services Institute.

Segundo o relatório, durante a década de 2000, as Forças de Defesa de Israel decidiram que a melhor forma de defesa anti-míssil seria uma estratégia de “primeiro ataque”, ou “contra-força”, para destruir os foguetes inimigos antes que pudessem ser lançados.

A visão das FDI sobre esta ameaça, diz o relatório, baseava-se no pressuposto de que os ataques de precisão israelitas poderiam reduzir rapidamente o número de ameaças num conflito importante, mesmo que não as pudessem eliminar completamente.

Algumas das chefias das FDI receavam que um sistema de defesa antimíssil conduzisse a uma mentalidade defensiva, em vez de levar a guerra até ao inimigo.

Mas o problema da estratégia de “contra-força” era encontrar os foguetes e lançadores inimigos antes de serem disparados, uma vez que o Hamas e o Hezbollah escondiam as suas armas em túneis e em zonas civis — e atacar os mísseis iranianos era difícil porque o Irão está a milhares de quilómetros de Israel.

“Uma campanha de contra-força pode ser eficiente ou pode ser rápida, mas raramente consegue ser ambas as coisas”, salientam Sidharth Kaushal, investigador do RUSI, e o Brigadeiro-General Ran Kochav, antigo chefe do sistema de defesa aérea e antimíssil de Israel.

A defesa integrada contra mísseis e ameaças aéreas de Israel, ou IAMD, é um sistema em camadas, explica o Business Insider.

A primeira camada é constituída por interceptores de longo alcance Arrow-2 e Arrow-3 para destruir mísseis balísticos enquanto estão no espaço, antes de descerem pela atmosfera.

Numa segunda camada, são usados interceptores “Funda de David” de médio alcance para atingir mísseis balísticos de curto alcance e projéteis de artilharia de grandes dimensões.

Finalmente, na terceira camada, a famosa Cúpula de Ferro, que usa pequenos foguetes Iron Dome que interceptam foguetes de curto alcance, obuses e morteiros.

No entanto, na década de 1980, quando a ideia foi concebida, as Forças de Defesa de Israel recusaram-se a desviar recursos de armas tradicionais, como tanques e aviões de ataque, para a defesa antimíssil.

“Os críticos questionavam a viabilidade técnica e os custos do sistema e se este traria os benefícios estratégicos prometidos”, escreveram Kaushal e Kochav no relatóro do RUSI.

Na altura, eram apontadas críticas semelhantes nos EUA sobre se a defesa antimíssil “Guerra das Estrelas” do presidente Ronald Reagan funcionaria eficazmente.

As forças armadas de Israel tiveram então uma vitória que serviu de base ao seu argumento a favor da criação de uma defesa aérea: a Operação Mole Cricket 19, durante a Guerra do Líbano de 1982.

Nesta operação, a Força Aérea Israelita usou drones e aviões de ataque para destruir 29 baterias de mísseis terra-ar sírios em duas horas, sem sofrer quaisquer perdas. Se a Força Aérea podia fazer isso aos mísseis antiaéreos, porque não aos lançadores de mísseis balísticos?

A ideia da Cúpula de Ferro contou também na altura com a preserverança do antigo primeiro-ministro Yitzhak Rabin, então chefe do Estado-Maior israelita, e com a ajuda de um generoso financiamento dos Estados Unidos, que dissipou as preocupações das FDI quanto aos recursos disponíveis para armas tradicionais.

Criar sistema de defesa antimíssil tornou-se também mais desejável depois de o então líder iraquiano Saddam Hussein ter disparado mísseis balísticos Scud contra Israel durante a Guerra do Golfo de 1991.

Na altura, Israel teve de confiar nos mísseis interceptores Patriot controlados pelos norte-americanos, que tinham sido estacionados em Israel para deter os Scuds — mas quase nenhum dos 40 Scuds foi intercetado.

A desilusão de Israel com o sistema Patriot foi um dos factores que levou os israelitas a criar as suas próprias defesas aéreas.

Em 2011, Israel colocou em campo a Cúpula de Ferro, que se tem revelado, na sua maioria — embora não totalmente — bem sucedida na identificação e interceção de rockets antes de atingirem áreas povoadas.

Mas a defesa antimíssil será sempre difícil, até porque é mais barato para um adversário construir mais mísseis ofensivos do que para o defensor interceptá-los a todos, e há ainda quem considere que a melhor defesa é um bom ataque.

“Os críticos salientam que, embora a Cúpula de Ferro tenha atenuado eficazmente a ameaça imediata dos ataques com rockets, não abordou as causas profundas do conflito nem forneceu uma solução a longo prazo para os desafios de segurança que Israel enfrenta”, apontam Kaushal e Kochav no relatório do RUSI.

Em última análise, os críticos argumentam que as defesas antiaéreas e antimísseis introduziram nos israelitas “uma mentalidade Maginot” — numa referência às linhas defensivas francesas que falharam miseravelmente no início da Segunda Guerra Mundial, e que os exércitos nazis contornaram facilmente.

ZAP //

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