Representando os dados como dobras num papel, os princípios do origami podem, teoricamente, ser usados para calcular qualquer coisa imaginável.
Depois de habitats na Lua, painéis solares portáteis, adesivos, escudos balísticos, cirurgiões-robô e microscópios, as aplicações práticas do origami não cessam de nos surpreender.
O papel dobrado de acordo com as regras do origami pode, teoricamente, efetuar qualquer cálculo imaginável — da simples soma de números até à execução do mais recente software de inteligência artificial.
Embora normalmente pensemos na computação como algo feito com chips de silício, qualquer coisa capaz de representar e manipular informação pode ser usada como um computador – por exemplo, peças de dominó dispostas num padrão correto são capazes de somar dois números.
Foi precisamente um vídeo no YouTube de um computador de dominó que inspirou Michael Assis, investigador da Universidade de Melbourne, na Austrália, a investigar as capacidades do origami — que o físico, matemático, artista e educador norte-americano, de origem brasileira, tem como hobby há 30 anos.
“Pensei que se algo tão estúpido como um dominó a cair pode computar alguma coisa, então certamente o origami também pode“, diz Assis, citado pela revista New Scientist. “Passei alguns anos a pensar em formas diferentes de o provar.”
Para representar informações usando origami, o físico atribuiu um 0 ou 1 a cada dobra de papel, sendo que as dobras que vão para um lado representam um 0 e as que vão para o outro um 1.
Usando esta estrutura, Assis criou uma porta NAND, um dos blocos de construção lógicos da computação. Uma porta NAND tem duas entradas que podem ser 0 ou 1, e produz um 0 apenas se ambas as entradas forem 1; caso contrário, produz um 1, permitindo realizar operações lógicas binárias.
As portas de origami imaginadas por Assis, que foram descritas num artigo recentemente pré-publicado arXiv, têm várias dobras que representam 0 ou 1 e que alimentam outras dobras, replicando as entradas e saídas das portas lógicas.
Estas portas são particularmente importantes porque podem ser combinadas, em grande número, para criar qualquer outra porta lógica e, assim, executar qualquer computação.
“Teoricamente, se tivermos uma folha de papel infinita e a configurarmos com um número suficiente destas engenhocas, podemos tratá-la como um computador moderno”, diz Assis.
“Há duas dobras que têm de ser feitas, mas só serão feitas se a terceira for dobrada de uma forma ou de outra, o que é essencialmente um cálculo muito, muito simples. E depois o truque é combinar algumas destas engenhocas muito simples para criar algo um pouco mais complexo”, detalha o físico.
Assis diz que, apesar de ter provado que a computação com papel é teoricamente possível, não há qualquer hipótese de se fazer uma máquina funcional na vida real; essencialmente, seria necessário um pedaço de papel infinitamente grande, incompreensivelmente complexo de dobrar e, provavelmente, demasiado frágil e frouxo para efetuar quaisquer cálculos.
A única exceção poderá ser em robôs de origami simples, diz Assis, onde os chips de computador e a memória são demasiado volumosos e as reacções lógicas simples podem ser incorporadas com dobras de origami cuidadosamente concebidas.
Assis conseguiu no entanto dobrar uma porta NAND com papel, usando uma folha de papel de tamanho A0 com 841 milímetros por 1189 milímetros — essencialmente o tamanho de 16 folhas de A4.
“Não é mesmo fácil dobrar”, diz Assis. “Sou um pouco um artista de origami, por isso sei muito sobre origamis, tenho muita experiência em dobrar, mas é um bocado difícil.”
O conceito teórico de um computador de origami é romântico, mas, dadas as aparentes dificuldades técnicas de o pôr em prática, é muito provável que a teoria nunca passe do… papel.