Cientistas identificam o primeiro anfíbio que põe ovos e alimenta as crias com leite

Carlos Jared

Depois de analisarem imagens de cecílias-aneladas, os investigadores descobriram que estas criaturas têm métodos invulgares de cuidar das crias, que incluem a produção de leite e o crescimento de pele nova.

Segundo o ati, os investigadores brasileiros descobriram o primeiro anfíbio que põe ovos e que alimenta as suas crias com “leite: a cecília-anelada.

E, ao contrário dos mamíferos, a cecília-anelada produz o leite rico em nutrientes a partir da sua extremidade traseira.

Para além disso, o leite serve de suplemento a uma camada de pele repleta de proteínas que a mãe também produz para alimentar as suas crias.

Agora, esta descoberta está a mudar a compreensão científica do comportamento de nascimento dos anfíbios.

As cecílias-aneladas são uma das 220 espécies conhecidas de cecílias — um grupo de anfíbios sem membros que passam a maior parte das suas vidas debaixo da terra.

“Eles são um dos vertebrados menos conhecidos, porque o acesso a estes animais é muito difícil”, disse Carlos Jared, principal autor do estudo publicado na revista Science e biólogo do Instituto Butantan, de São Paulo.

A indefinição desta criatura dificultou a descoberta da sua capacidade de produzir leite. De facto, se não fosse a produção de uma série da BBC, os investigadores poderiam não ter observado as estratégias parentais únicas do ceciliano anelado.

Há mais de uma década, uma equipa da BBC que trabalhava na série Life in Cold Blood, de 2008, captou imagens raras de uma cecília-anelada fêmea com a sua cria.

Os pequenos anfíbios pareciam estar num frenesim, arrancando pedaços da pele da mãe. Mais tarde, os investigadores descobriram que as fêmeas reprodutoras desenvolveram esta camada exterior repleta de proteínas para alimentar as suas crias.

Ficamos tão intrigadas com isso que não prestamos muita atenção aos outros comportamentos que vimos”, disse Marta Antoniazzi, coautora do estudo, outra pesquisadora do Instituto Butantan.

As imagens iniciais incentivaram os investigadores a aprofundarem as suas estratégias parentais da cecília-anelada e o que eles descobriram mudou a sua compreensão do comportamento dos anfíbios.

Os investigadores decidiram rever cuidadosamente as imagens da BBC e tomar nota de quaisquer outros comportamentos estranhos.

Primeiro, notaram que as crias de cecílias-aneladas se mantinham perto da abertura cloacal da mãe, o canal traseiro que serve para fins urinários, digestivos e reprodutivos.

“As cabeças das bebés estavam sempre perto da abertura cloacal da fêmea”, afirma Jared. “Alguns até colocavam a cabeça lá dentro e pareciam muito excitados”.

A equipa decidiu comparar os intestinos, bexigas, cloacas e ovidutos de cecílias-aneladas fêmeas com e sem crias. Dentro dos ovidutos das mães, encontraram grandes glândulas cheias de ácidos gordos e uma substância leitosa rica em açúcar“.

A composição deste “leite” era muito semelhante à dos mamíferos. Os investigadores notaram que, provavelmente, complementava a pele rica em proteínas de que as crias se alimentavam uma vez por semana.

Além disso, os investigadores dizem que estas descobertas oferecem possíveis perspetivas sobre a evolução das cecílias.

“Torna mais fácil conceber como algumas [cecílias vivíparas] poderiam ter evoluído a partir de espécies [ovíparas] que já usavam os seus ovidutos para produzir alimentos”, disse Mark Wilkinson, biólogo evolucionista do Museu de História Natural de Londres. “Aprendemos muito sobre os cecilianos nas últimas décadas, mas estamos apenas a ver a ponta do icebergue”.

Teresa Oliveira Campos, ZAP //

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