A campanha junta-se a outras que as autoridades japonesas têm implementado para tentarem incentivar os jovens a terem mais filhos. Até agora, o programa já juntou 17 casais.
Não tem sorte no amor e o Tinder só lhe dá desgostos? Então talvez esteja na hora de se mudar para Miyazaki. Nesta cidade no sul do Japão, a autarquia decidiu arregaçar as mangas para ajudar os habitantes na busca pelas suas almas gémeas — e como os métodos modernos não estavam a resultar, foi preciso voltar às estratégias de outros tempos.
As autoridades locais decidiram assumir o papel das tias ou avós casamenteiras e estão a encorajar os solteiros a deixar de parte as desilusões do namoro online para voltarem a fazer a corte à moda antiga — com cartas de amor.
Desde o início da campanha há dois anos, já 450 pessoas decidiram tentar assim a sua sorte no amor, sendo este valor o dobro das estimativas iniciais da cidade. Cerca de 70% estão na casa dos 20 e dos 30 anos.
E parece que a ideia está a dar frutos, tendo já havido 32 encontros presenciais entre os participantes. Por enquanto ainda não houve casórios nem bebés no bico da cegonha, mas a campanha já juntou 17 casais de pombinhos.
“Demora mais tempo do que namorar online e inspira-nos a imaginar a pessoa com quem estamos a comunicar. Tem menos a ver com a qualidade da caligrafia e mais a ver com o facto de se escrever cada letra com sinceridade e carinho, pensando profundamente na pessoa a quem se está a escrever. É isso que torna as cartas tão poderosas”, revela Rie Miyata, directora da firma organiza o programa, à AFP.
Se as aplicações de namoro são muitas vezes criticadas por serem insípidas e superficiais, esse problema não existe dentro deste esquema, que impede os participantes de saberem a aparência dos seus destinatários.
Outros detalhes pessoais, como o nomes completos ou os empregos, também não são revelados, sendo a idade a única informação que é divulgada. Aqui, a única coisa que importa são os interesses em comum dos participantes, que enviam informações à equipa de Miyata sobre as suas actividades favoritas.
A empresa usa estes dados para se transformar no cupido e sugerir os pares para a correspondência. “A aparência é muitas vezes um factor decisivo, mas nas cartas, somos julgados pela nossa personalidade“, explica Miyata.
Os casalinhos podem trocar até cinco cartas sem saberem mais dados sobre os seus pares. Se depois disto se quiserem conhecer, a firma dá-lhes os contactos uns dos outros e deixa o resto nas mãos de cada um.
“Quando era miúdo, escrevia cartas para um menina de quem gostava. Gosto de quão antiquadas as cartas são. Isso fez-me querer entrar no programa”, revela um residente de Miyazaki de 25 anos que decidiu manter o anonimato.
Bebés, precisam-se
Mas por detrás do aparente altruísmo do programa, está a razão do costume — a economia. O número de bebés nascidos no Japão bateu um novo mínimo histórico em 2021, ficando-se pelos 811,604, um valor que o primeiro-ministro, Fumio Kishida, considera “chocante”. A taxa de fecundidade no país está nos 1,3, muito abaixo dos 2,1 filhos por mulher que são necessários para haver a reposição da população.
O país tem também uma enorme população de idosos, com os dados do ano passado a revelar que 28,7% dos japoneses têm mais de 65 anos. Para além disto, os jovens estão cada vez menos interessados nas relações amorosas.
Um inquérito governamental concluiu que um em cada quatro japoneses na casa dos 30 anos não quer casar e nos últimos anos tem crescido o fenómeno dos “homens herbívoros”, que não estão interessados em namorar ou dar o nó.
Um estudo de 2019 analisou dados de 2015 e concluiu também que cerca de um quarto dos japoneses — tanto homens como mulheres — entre os 18 e os 39 anos nunca tinham tido relações sexuais.
Face à bomba demográfica que se adivinha e que ameaça a sustentabilidade do sistema de pensões, Tóquio tem aberto os cordões à bolsa na criação de campanhas para encorajar os jovens a ter mais filhos.
Para além do esquema em Miyazaki, o Governo já financiou programas de inteligência artificial para criarem correspondências entre solteiros e em 2018, os homens da vila montanhosa de Otari até produziram um calendário onde mostram as suas aptidões no trabalho na esperança de atraírem as suas caras-metade.