A primeira reunião do BCE desde o início da guerra mostra o dilema em que a instituição se encontra, tentando conter a inflação quando se antecipa um crescimento económico mais lento.
Dado o novo contexto de guerra na Ucrânia, o Banco Central Europeu anunciou esta quinta-feira que vai diminuir ligeiramente nos próximos meses o programa APP, referente à compra de activos, revela o Público.
Este Asset Purchase Programme (APP), que também incluía a compra de dívida pública, estava a absorver títulos detidos pelos bancos comerciais a um ritmo de 20 mil milhões de euros por mês.
O BCE anunciou o fim do programa de compras de emergência pandémica (PEPP) em Dezembro e para evitar um choque no mercado, decidiu subir temporariamente o fluxo de compras do APP para 40 mil milhões no segundo trimestre de 2022.
O APP vai assim ser reduzido progressivamente de 40 mil milhões em Abril, para 30 mil milhões em Maio e 20 mil milhões em Junho, podendo voltar ao ritmo normal já em Outubro, caso se confirme “a expectativa de que o cenário de médio prazo para a inflação não se torna mais fraco”, nota o comunicado.
De acordo com Christine Lagarde, presidente do BCE, a “a guerra da Rússia contra a Ucrânia”, agitou a economia europeia e acelerou a inflação e causou incerteza, estando tudo ainda em xeque, como nota o Dinheiro Vivo.
Esta decisão pretende acelerar o processo progressivo de retirada de medidas de estímulo que já tinha sido definido antes do início da guerra. O BCE já estava preocupado com a evolução da taxa de inflação, que chegou aos 5,8% na zona euro em Fevereiro, e a escalada dos preços da energia trazida pelo conflito pode agravar ainda mais este problema.
A instituição europeia já tinha anunciado uma subida das taxas de juro, que estão em mínimos históricos, para tentar combater a inflação descontrolada, tendo o objectivo de a manter à volta dos 2%, mas esta subida pode vir um pouco mais tarde do que se previa. O BCE avançou hoje que “quaisquer ajustamentos nas taxas demorarão algum tempo depois do fim das compras líquidas de dívida” e não serão imediatos.
“A inflação pode ser consideravelmente mais alta no curto prazo”, avançou Lagarde. O BCE também não se compromete com os 30 mil milhões de euros em compras por mês no terceiro trimestre acordados na reunião de dezembro e afirma que vai ter em conta os novos dados que forem saindo.
A reunião do conselho de governadores desta quinta-feira foi a primeira desde o início da guerra na Ucrânia e das sanções de que a Rússia tem sido alvo, que vieram trazer mais instabilidade à economia europeia e alterar o contexto das previsões iniciais do Banco Central Europeu.
Antes da guerra, esperava-se que o BCE avançasse, após a reunião de hoje, com o fim progressivo das compras de dívida pública ao longo deste ano, seguindo-se uma subida das taxas de juro imediatamente a seguir, podendo esta acontecer ainda no final deste ano ou, o mais tarde, no início de 2023.
Mas o conflito obrigou o BCE a fazer uma escolha, já que este poderia ter optado por adiar o fim das medidas de estímulo económico. No entanto, a inflação que já se estava a notar foi ainda mais agravada com a guerra, obrigando Lagarde a adoptar políticas para combater a subida a pique dos preços, mesmo que estas possam causar uma recessão.
A Europa corre assim o risco de entrar num cenário de estagflação — com inflação alta, recessão económica e subidas nas taxas de desemprego. O BCE espera assim que a retirada das medidas de estímulo e a consequente subida das taxas de juro possa conter a inflação.
Em conferência de imprensa, Christine Lagarde adiantou ainda que o PIB europeu deverá crescer 3,7%, em vez dos 4,2% anteriormente esperados. Já a inflação média chegará este ano aos 5,1%.