Muitos dos eleitores que votaram em Jean-Luc Mélenchon na primeira volta das presidenciais francesas estão divididos entre votar em Emmanuel Macron, para travar Marine Le Pen, ou votar em branco, para não dar um “poder absoluto” ao candidato centrista.
Jean-Luc Mélenchon, da esquerda radical e o quarto candidato mais votado (19,2%) na primeira volta, apelou este domingo, aos eleitores, no canal de televisão TF1, para “não cometerem o terrível erro de votar FN“,
As declarações de Mélenchon surgem depois de o candidato da extrema-esquerda ter estado uma semana em silêncio e de ter dito que Emmanuel Macron e Marine Le Pen representam «um a extrema finança e o outro a extrema-direita».
Em vez de dar uma indicação de voto logo após a primeira volta, Mélenchon defendeu não ser “um guru, nem um guia” e pediu aos 440.000 militantes inscritos na plataforma digital de A França Insubmissa de escolherem entre o voto por Emmanuel Macron, a abstenção ou o voto branco, tendo logo excluído o voto FN.
Nina da Silva votou na plataforma, tendo gostado “muito da proposta de consultar os aderentes” porque representa “mais democracia direta” e uma forma de “guardar a unidade do movimento”, aplaudindo a atitude de Mélenchon de não apelar ao voto em Macron “de maneira incondicional” como se fosse o suposto “herói”.
“Acho que vou votar Macron mas ainda não tenho a certeza. A minha primeira reação foi que temos que votar em Macron, mas quando vi as reações histéricas nas redes sociais, nos media em geral, isso revoltou-me e deu-me vontade de, se calhar, votar em branco”, diz a operadora de imagem franco-portuguesa.
“Mas acho que vou votar Macron porque há sempre este risco de a Le Pen passar”, conclui.
A lusodescendente de 40 anos lamentou, no entanto, as críticas de que se é alvo “quando se diz que ainda não se sabe em quem se vai votar e quando se diz que não se pode dar uma grande vitória ao Macron”.
Nina da Silva rejeita as acusações de favorecimento da Frente Nacional, até porque “a FN combate-se sempre, no terreno, em todas as eleições, não só na segunda volta das presidenciais”.
O sindicalista José Roussado, de 62 anos, vai votar em Emmanuel Macron contra “o risco” de Marine Le Pen ser eleita porque considera que apesar de ela “ter lavado a fachada” da Frente Nacional (FN), o partido “foi criado pelos ex-nazis”.
Ainda assim, o franco-português relembrou que Emmanuel Macron, quando era ministro da Economia, defendeu a reforma do código de trabalho El Khomry, implementada no ano passado.
“Ganhar com 70,80% como o Chirac? Nem pensar porque aí vamos ter uma lei El Khomry do trabalho pior que do que a que existe. Andámos a lutar este tempo todo contra o Macron porque essa lei é nefasta para os trabalhadores e agora vamos a correr votar por ele? Eu vou certamente, mas não mando pedra nenhuma àqueles que não vão“.
Apesar das críticas que surgiram na imprensa ao silêncio de Jean-Luc Mélenchon, José Roussado compreende a atitude do líder de A França Insubmissa em não apelar ao voto em Emmanuel Macron, ao contrário do conservador François Fillon e do socialista Benoît Hamon que o fizeram na própria noite eleitoral de 23 de abril.
“Se o Mélenchon aparece às 21 horas no dia da eleição a dizer para votarem Macron, é dar uma maioria confortável nas legislativas e um poder absoluto ao Macron“, defendeu o sindicalista, apontando que Emmanuel Macron, enquanto ministro, “baixou as horas suplementares de 25 para 10% e baixou as indemnizações em caso de despedimento”.
A sua filha, Sandrine Roussado, de 36 anos, também votou Mélenchon na primeira volta e pensa votar em branco a 7 de maio por ter “a certeza que Macron vai passar” e para não lhe dar uma vitória tão sonante quanto a de Jacques Chirac (82,21%) face a Jean-Marie Le Pen (17,79%) em 2002.
“Penso que ele vai ganhar mesmo à vontade, mas ganhar com 75 % dos votos é dar uma liberdade e uma legitimidade que eu que não quero que ele tenha”, afirmou a economista que é contra a reforma do código do trabalho e o “comércio-livre absoluto”.
Hélder Gonçalves também é apoiante de Jean-Luc Mélenchon mas criticou uma “atitude um pouco irresponsável” do líder do movimento A França Insubmissa porque, na sua opinião, ele deveria contribuir para dar “o mínimo de votos para aquela senhora“.
“Há pouca probabilidade que ela vá passar mas ter muitos votos já é um perigo. Ela deve ter um mínimo de votos. Ela tem uma cara de anjo, ou quase, mas na realidade há intolerância, racismo. O populismo nunca deu bom resultado”, considerou.
Segundo o português de 57 anos, um bom resultado da Frente Nacional poderia criar “uma espécie de guerra civil psicológica” entre as diferentes comunidades em França.
// Lusa