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Portuguesa em Londres explica porque interrompeu o direto da Sky News

Sean Dempsey / EPA

A portuguesa que interrompeu um direto da Sky News durante um protesto em Londres contra o Brexit, Ana Rocha, está, esta semana, a trabalhar na Escócia por receio de represálias, depois da entrevista emotiva ao canal britânico.

Ao Diário de Notícias, Ana Rocha explicou que durante o dia de quarta-feira, tinha visto “em casa, as notícias de que o Boris pediu à Rainha para suspender o Parlamento e eu fiquei muito chateada porque percebi que ele vai apostar numa saída sem acordo, apesar deles terem dito na campanha que nunca iriam fazer isso.”

A lisboeta que reside em Londres há 20 anos, decidiu sair de casa e ir até à zona de Westminster, onde decorria um protesto contra a decisão governativa, em frente à residência do primeiro-ministro em Downing Street.

“Eu comecei a protestar em frente ao Parlamento. Estive a observar. Não tinha voz porque estava tão emocionada e tão paralisada com a frustração. Fui dar uma volta e vi as pessoas a fazerem uma entrevista. Nem sabia quem eram mas achei que já chegava as pessoas europeias não terem voz”, explicou.

Ana Rocha diz que a interrupção do direto foi “muito abrupta e foi um ímpeto de minutos ou segundos” mas assegura que conseguiu passar a mensagem que lhe “ia na alma”.

A portuguesa foi transferida para a Escócia por receio de represálias. “Quero ficar na Escócia por mais algum tempo a trabalhar porque estou mais segura. Tenho medo de ir no autocarro agora, vou ter medo de andar no metro e de andar na rua”, confessou Ana Rocha à Lusa.

A emigrante que disse ao DN, que sente que os cidadãos comunitários não têm voz. “Já chega de estar calado! Porque é um processo interno inglês? Não é! É um processo em que nós temos que estar todos envolvidos, porque todos trabalhamos para Inglaterra”, disse. A portuguesa assegura ainda que a principal mensagem que quis passar é a de que o regime de atribuição do estatuto de residente permanente “não está a funcionar.”

Ana Rocha diz que iniciou o processo de obtenção desse estatuto via Internet, com o apoio da empresa em que trabalha, mas adianta que foi contactada, há cerca de três semanas, pelo Ministério da Administração Interna a dizer que os seus dados de identificação não estavam corretos.

“Disseram que o meu número de segurança social estava incorreto. Não havia detalhes nenhuns no sistema sobre mim e eu disse que isso era impossível porque eu estou cá há 20 anos, há 20 anos que trabalho“, acrescentou.

O conselho que Ana recebeu foi de que deveria reiniciar todo o processo. “Entrei numa frustração incrível porque estou sempre a trabalhar, não tenho muito tempo disponível, tenho um filho deficiente [que vive em Portugal] e o facto de eles não terem resolvido o problema deixou-me numa situação em que fiquei em pânico total. Não devia ser posta nessa situação porque trabalhei imenso neste país. Eu dei-lhes a minha juventude”, garantiu.

O esquema de registo dos cidadãos comunitários permite que os emigrantes europeus se candidatem à atribuição do estatuto de residente permanente, obrigatório depois do Brexit. O estatuto garante a continuidade do acesso ao mercado de trabalho e de arrendamento, bem como aos serviços sociais, saúde e ao sistema de ensino britânico.

Para obter o “settled status” é preciso provar que se vive no Reino Unido há mais de cinco anos consecutivos e os comprovativos podem ser os descontos para a segurança social ou documentos alternativos, como contratos de trabalho ou de arrendamento, por exemplo. Caso contrário, é atribuído o estatuto provisório até alcançar o prazo mínimo necessário.

Ana Rocha manifestou-se preocupada com a data de saída do Reino Unido da União Europeia: 31 de outubro, temendo não ter tempo para recomeçar e terminar o processo. No entanto, os prazos de candidatura ao “settled status” estão ainda longe de terminar. Se não houver acordo entre Londres e Bruxelas, o último dia é 31 de dezembro de 2020. Se a saída for ordeira, o prazo só acaba a 30 de junho de 2021.

Desde março, mais de um milhão de emigrantes europeus já se candidataram à atribuição do estatuto de residente. O último relatório do Home Office, de 15 de agosto, dá conta de que apenas 0.5% candidatos não obteve nem o título definitivo nem o provisório. As candidaturas devem ser feitas pela Internet, mas também há vários centros de apoio, onde é possível realizar o processo.

Entre a comunidade portuguesa do Reino Unido, estimada em cerca de 400 mil pessoas, mais de 90 mil já obtiveram um dos estatutos disponíveis. Portugal ocupa o quarto lugar na lista de países com mais cidadãos com a sua situação já regularizada.

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