Ana dos Olivais, banda sonora de Jorge Palma e fantasma de Passos Coelho. Começou o debate do OE

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António Cotrim / LUSA

António Costa sorri durante debate

As acusações de austeridade, os velhos rancores com a geringonça e a “Ana dos Olivais” foram os temas de eleição do primeiro dia de debate da proposta do Governo de Orçamento de Estado para 2023.

O fantasma da austeridade voltou a assombrar o Parlamento no primeiro dia de debate da proposta de Orçamento de Estado para 2023, com a culpa a morrer solteira entre o PS e o PSD.

O primeiro a trazer o tema à baila foi Joaquim Miranda Sarmento, o líder da bancada parlamentar dos sociais-democratas, que começou por defender o PSD antes de sair ao ataque. “Escusa de falar da direita e da austeridade porque nos últimos 27 anos, o PS governou 20″, lembrou, acusando ainda a governação socialista de ser responsável pelo pedido de ajuda internacional em 2011.

O confronto continuou pela boca de Eurico Brilhante Dias, que aproveitou a deixa para assinalar que o actual líder do PSD, Luís Montenegro, foi um dos principais aliados de Passos Coelho e foi líder parlamentar durante o período de austeridade.

O deputado socialista distinguiu ainda as “contas certas” do PS das “contas erradas do PSD”. “É que contas certas não é austeridade, mas a austeridade nunca trouxe nem traz contas certas”, acusou.

Na sequência deste confronto, toda a direita saiu em defesa do PSD. André Ventura, do Chega, declarou estar “farto do Canal História” e de ouvir sempre as mesmas acusações vindas do PS.

O partido acusou ainda o Governo de causar uma “trapalhada” com os problemas com o IBAN nas transferências de 125 euros e disse que vai remeter ao Ministério Público a alegada alteração de dados no site das Finanças.

A Iniciativa Liberal seguiu-se no mesmo tom, com João Cotrim Figueiredo a acusar António Costa de estar “preso no atoleiro das políticas de há sete anos” e de fazer “brilharetes orçamentais” à custa dos “sacrifícios dos portugueses” e assinalou que Portugal vai bater um novo “recorde da carga fiscal“.

Na resposta, Costa trouxe à discussão um exemplo internacional e comparou a ideologia da Iniciativa Liberal com os planos económicos desastrosos de Liz Truss.

“Já provou que resiste mais tempo que a sua parceira Liz Truss resistiu como primeira-ministra, mas só resistiu mais porque não teve oportunidade de pôr em prática o seu programa porque o seu resultado seria exatamente o mesmo do que teve o Reino Unido”, considerou.

Divórcio litigioso

As feridas causadas pelo divórcio litigioso da geringonça também ficaram bem à vista, principalmente entre o Bloco de Esquerda e o PS. Catarina Martins foi a primeira a atacar, considerando que o Governo “está a premiar quem ganha e está a deixar que quase todos empobreçam” com este “mau” Orçamento e que a “direita faria igual“.

Sobre a polémica das pensões, o BE acusa ainda o Governo de cometer “fraude” nos anúncios e de justificar o corte a partir de 2024 com “aldrabices”.

O primeiro-ministro retorquiu acusando o BE de ódio cego ao PS e de debater à base de “insultos”. “A cegueira do ódio ao PS é tão grande que a deputada até consegue estabelecer uma equivalência entre um aumento menor de pensões que propõe com o corte de pensões que a direita fez enquanto governou”, disse Costa, que afirma ainda que os bloquistas traíram o seu eleitorado com o fim da geringonça.

O tom da discussão com os comunistas foi mais contido, mas o conteúdo foi o mesmo. O PCP reforça que teve razões para chumbar o Orçamento de 2022 e que este não era o “OE mais à esquerda de sempre”. Sobre o OE para 2023, os comunistas dizem que o PSD nem tem “assunto” porque não discorda de nada da proposta e falam em “empobrecimento” para a população.

A resposta de António Costa foi semelhante à dada ao BE, mas menos hostil, com o primeiro-ministro a dizer que o PCP se pôs de fora das soluções e que está agora resumido ao papel de oposição.

“Que fofinho!”

As relações com o PAN e o Livre são bem mais amigáveis. “Numa situação inflacionária com indícios já muito claros de recessão, um Orçamento do Estado não deve apenas possibilitar contas certas ao Estado, mas também contas certas das famílias, dos trabalhadores”, recomendou Rui Tavares.

Já o PAN anunciou que se vai abster por este não ser um “Orçamento PAN”, mas Inês Sousa Real afirma que “o que o PAN não faz nem fará é deitar a toalha ao chão e desistir da oportunidade que a generalidade nos dá”.

Costa aproveitou para elogiar a “visão construtiva” do Livre e prometeu ter em conta as propostas do partido e em também “plena disponibilidade” para dialogar com o PAN, com quem quer “encontrar-se” na especialidade. Um deputado da Iniciativa Liberal resumiu as interacções com uma frase: “Que fofinho!“.

Ana dos Olivais, a jovem condenada a emigrar

Um dos momentos mais caricatos do debate foi a intervenção do deputado Alexandre Poço, do PSD, que inventou uma personagem chamada “Ana dos Olivais“, que nasceu quando António Costa era Secretário de Estado, foi adolescente enquanto Costa era autarca de Lisboa e entrou para a Universidade quando o PS formou Governo em 2015, mesmo depois de ter ficado em segundo lugar nas legislativas.

De acordo com o líder da juventude do PSD, o futuro de Ana é o mesmo que o de muitos outros jovens portugueses: está condenada à emigração. “O que tem o primeiro-ministro para dizer à Ana, além de lhe dever um pedido de desculpa?”, questionou Alexandre Poço.

Como resposta, António Costa deu uma lição de História aos deputados, lembrando que a Ana só pôde beneficiar de uma educação universal e gratuita graças aos anteriores Governos do PS.

“Não teríamos hoje o número de licenciados, de mestres e de doutores se há 25 anos não tivéssemos feito essa aposta, se não houvesse extensão da obrigatoriedade do ensino até ao 12º ano de escolaridade. Provavelmente, a Ana já foi uma das primeiras alunas a ter ensino de inglês logo no primeiro ciclo”, afirmou.

Sobre o seu período como autarca, Costa lembra que Ana cresceu numa cidade que “já não estava a cair aos pedaços“. “Se a Ana vive nos Olivais, a Ana já beneficiou das piscinas dos Olivais recuperadas e não encerradas, como estiveram quando a direita governou o município de Lisboa”, disse.

O primeiro-ministro falou ainda no futuro da Ana, que terá uma “forte diminuição na tributação em IRS” agora que está pronta para entrar no mercado de trabalho e que, caso entre para a função pública, beneficiará de um salário mais alto como técnica superior.

“Há um grande conselho que tenho a dar à Ana, que nunca vote no PSD, porque se votar no PSD arrisca-se a ter um primeiro-ministro que a convida a emigrar. Se não votar no PSD, vai continuar a ter um primeiro-ministro que prosseguirá a lutar para que ela não emigre, realizando em Portugal todo o seu potencial”, acrescentou.

Mas outros deputados discordam e acreditam que a Ana não tem assim tantos motivos para sorrir. Alma Rivera, do PCP, voltou a pedir a redução do IVA da energia para os 6%: “Se isto não é política de direita isto é o quê? Ou vai dizer à Ana que isto é a política de direita mais à esquerda de sempre?”.

OE ao som de Jorge Palma

Se fizéssemos uma playlist com as músicas que marcaram as negociações do OE, Jorge Palma seria o artista dominante. Na intervenção de abertura, António Costa lembrou o hino das negociações do ano passado — “A Gente Vai Continuar“.

“Faz amanhã um ano, que tomando de empréstimo as palavras de Jorge Palma, garanti nesta tribuna que ‘enquanto houver ventos e mar a gente não vai parar’”, para acrescentar: “Não parámos! E não vamos parar!”

A oposição já está farta da inspiração de Costa no cantor. “Deixem o Jorge Palma em paz, porque ele não tem culpa nenhuma dos disparates que foram aqui ditos”, atacou o deputado comunista Bruno Dias.

Mas os apelos não valeram de nada, com Tiago Brandão Rodrigues, ex-Ministro da Educação e deputado do PS, a voltar a fazer uma referência a Jorge Palma ao prometer aos partidos da oposição que não os iria convidar a encostarem-se a si.

O Chega decidiu alinhar na brincadeira, com o deputado Filipe Melo a sacar de outra música para criticar a política das contas certas do PS. “Deixa-me rir“, declarou.

Adriana Peixoto, ZAP // Lusa

5 Comments

  1. Este tipo de debates são vergonhosos e indignos de quem representa o povo. Insultos de crianças em idade escolar pautam aquilo que deveria ser um debate em prol do país. Então aquela tirada do Costa para a IL “vocês são uns meninos”. Mas quem é que ele pensa que é para chamar meninos a quem quer que seja? A IL e todos os outros partidos estão lá com o mesmo direito do PS! Foram eleitos por uma franja do povo para os representar. Tratar assim um partido é tratar assim todo o povo. Falta de consideração pelo povo português, o mesmo que o meteu lá. Isto são tiques de quem tudo pode, e que faz o que bem quiser. Depois de encaixar os votos de alguns portugueses (mais precisamente 2 em cada 10), o Costa já não quer saber do povo para nada e trata-o abaixo de cão.
    A verdade é que o nosso sistema democrático baseia-se no princípio de que uma dada classe privilegiada, usa o povo de 4 em 4 anos para legitimar as suas negociatas. Depois desse momento, rapidamente descarta o povo.

    • Maior ofensa do que faltar ao compromisso eleitoral , não conheço, em termos políticos claro, prometer aos eleitores que votasse no IL para experimentar o sistema liberal, e chegados á AR e adotar uma política de Protesto, de bocas, tal como o BE PCP e os outros, é defraudar os eleitores que no IL confiou o voto, isso sim é uma grande ofensa.

      • O amigo é iletrado?! É que eu estou-me a borrifar por completo para esse partido pelo qual não dou nada. Leia novamente e veja se percebe. Se mesmo à segunda não conseguir, leia mais uma, duas ou mesmo três vezes. Olhe… vá lendo até perceber.

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