Esta segunda-feira assinala-se o 800.º aniversário da assinatura da Magna Carta, documento icónico na história inglesa e símbolo mundial de liberdade, justiça e proteção contra o poder absoluto.
Para celebrar a data, no local onde a Magna Carta foi assinada, nos prados de Runnymede, 32 quilómetros a oeste de Londres, será inaugurada no domingo uma estátua da rainha Isabel II com quatro metros de altura, e no dia seguinte a própria rainha estará no local para uma cerimónia oficial.
A centenária regata de Egham no Tamisa, a 28 de junho, será este ano a “Regata Egham da Magna Carta”, e no castelo, recém renovado, da cidade britânica de Lincoln estará em exposição uma das cópias originais do histórico documento.
As celebrações dos 800 anos da Magna Carta já começaram em fevereiro, com a organização pela ‘British Library’ da primeira exposição a juntar as quatro cópias existentes do documento original, enquanto a Casa da Moeda britânica emitiu uma moeda comemorativa de duas libras.
A Magna Carta foi, na sua origem, um acordo de paz: em 1215, um grupo de barões ingleses, descontentes com os pesados impostos a que eram submetidos para financiar as campanhas militares – fracassadas – do rei João “Sem-Terra”, revoltaram-se.
Peculiarmente para a época, os rebeldes não se reuniram em redor de um pretendente ao trono, exigindo não o derrube do monarca, mas a confirmação de liberdades e privilégios a que pensavam ter direito.
Conquistada Londres, o rei foi obrigado a ceder, e as duas partes encontraram-se num campo a oeste de Londres à beira de um rio.
O documento assinado continha 63 cláusulas que confirmavam a amnistia dos nobres revoltados, a liberdade da igreja inglesa, mas também princípios que ainda hoje estão na base das democracias ocidentais, como o direito a um julgamento justo, a proteção contra prisões ou confiscações de bens arbitrárias e a instituição de mecanismos de limitação do poder.
Para os seus contemporâneos a Magna Carta foi um fracasso, com aplicação problemática uma vez que nenhuma das partes tinha a intenção de cumprir o acordado.
Dois meses depois da sua assinatura a Magna Carta foi anulada pelo papa Inocêncio III.
Mas os compromissos que continha foram retomados nas décadas seguintes e, com algumas alterações, acabou por ser integrada na legislação inglesa.
Apesar da importância que acabou por alcançar no seu tempo, a história da Magna Carta não é apenas a história de um documento físico, mas sobretudo a história do seu simbolismo.
Ao mesmo tempo que ao longo dos séculos ia perdendo influência legal, foi crescendo a sua mitologia como documento consagrador de liberdades individuais antigas, cuja origem se perdia no tempo.
Esta visão, desligada da história real do documento, perdurou pelos séculos seguintes, inspirando a formação do sistema constitucional inglês, o liberalismo dos novos Estados Unidos da América, e os direitos reclamados pelos revolucionários franceses.
Na história medieval de Portugal não existe um documento comparável, mas a influência da Magna Carta, direta ou não, paira sobre os documentos fundadores do liberalismo português e estende-se até à Constituição que hoje rege a República Portuguesa.
Curiosamente, embora as cláusulas da Magna Carta na sua grande maioria tenham sido anuladas ao longo do tempo, substituídas ou simplesmente tornadas irrelevantes, 800 anos depois três delas – sobre a liberdade da igreja de Inglaterra, sobre as liberdades da cidade de Londres e sobre a recusa da privação de liberdade de forma arbitrária – continuam em vigor na lei inglesa, provando a imortalidade e invulgar atualidade de um dos mais importantes documentos da história universal.
/Lusa