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Caso das gémeas brasileiras. Por que é o Zolgensma tão caro? E funciona mesmo?

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Portugal foi um dos primeiros países do mundo a suportar, através do Serviço Nacional de Saúde (SNS), o custo do Zolgensma, um dos medicamentos mais caros do mundo que está no centro da polémica do caso das gémeas brasileiras tratadas em Lisboa. Mas, afinal, que medicamento é este e por que é tão caro?

Foi em 2021 que o Infarmed aprovou o financiamento público do Zolgensma, um dos medicamentos mais caros do mundo que é usado para tratar a atrofia muscular espinal (AME), uma doença neurodegenerativa.

Uma autorização que surgiu no rescaldo da campanha dos pais da bebé Matilde, uma criança que sofre de AME. Os pais chegaram a conseguir angariar os dois milhões de euros que eram necessários para pagar o tratamento, mas o Estado português acabou por custear o tratamento através do SNS.

Desde então, mais 33 crianças foram tratadas, em Portugal, com este medicamento inovador de toma única, incluindo duas gémeas brasileiras que obtiveram, entretanto, a nacionalidade portuguesa.

O caso destas gémeas deu que falar porque só terão sido tratadas no Hospital de Santa Maria, em Lisboa, devido a uma alegada “cunha” de Marcelo Rebelo de Sousa.

No meio da polémica, há muitas dúvidas no ar. Para lá das circunstâncias do caso referido, questiona-se, desde logo, por que é o medicamento tão caro? Vamos tentar esclarecer esta e outras dúvidas, começando pela doença que trata.

O que é a Atrofia Muscular Espinhal (AME)?

A AME é uma doença neuromuscular degenerativa que tem origem génetica. É hereditária e afecta uma em cada 10 mil pessoas, o que a coloca na categoria das doenças raras.

Caracteriza-se pela “morte” de células do sistema nervoso que são essenciais para controlar os movimentos dos músculos. E, por isso mesmo, origina a fraqueza muscular progressiva à medida que evolui.

A AME divide-se em vários tipos, do I ao IV, conforme a idade de início dos sintomas e a capacidade motora da pessoa afectada. O I é o tipo mais grave.

Em termos de sintomas, os bebés podem apresentar atrasos no desenvolvimento motor, mas também fraqueza muscular, reflexos reduzidos e hipotonia (ou seja, falta de firmeza e de elasticidade).

O que é o Zolgensma?

O Zolgensma é um tratamento baseado na terapia genética, ou seja, na troca de genes deficitários/problemáticos por genes saudáveis/funcionais.

Foi lançado em 2019, pela empresa farmacêutica Novartis. Contudo, não foi esta farmacêutica que o desenvolveu.

O medicamento foi criado pelo laboratório AveXis que foi adquirido pela Novartis quando o Zolgensma estava pronto para ser lançado, em 2018.

Como é que funciona o medicamento?

O Zolgensma tem como substância activa o onasemnogene abeparvovec (OA) e é também referido desta forma, por vezes. É de toma única, sendo administrado por via intravenosa, gota a gota, durante cerca de uma hora.

Antes de receber o tratamento, o paciente deve realizar vários exames, nomeadamente ao fígado e ao sangue, para aferir os riscos em termos de efeitos secundários.

Os doentes com AME têm um defeito num gene que é conhecido como “SMN1”. Sem este, o organismo não consegue produzir a proteína que permite o normal funcionamento das células do sistema nervoso que controlam os movimentos dos músculos.

Ora, a substância activa do Zolgensma contém uma cópia funcional deste gene que restaura a função nervosa deficitária.

Por que é tão caro?

Na verdade, não há uma explicação clara para o elevado custo do medicamento. E é algo que acontece também com outros medicamentos.

A indústria famacêutica socorre-se, habitualmente, do argumento de que criar um medicamento novo é sempre arriscado, e exige um elevado investimento.

No caso de doenças raras, como a AME, pode sempre alegar que investir neste campo é ainda mais dispendioso devido à pouca procura de medicamentos.

De qualquer modo, o Zolgensma é o primeiro medicamento que recorre à nanotecnologia para tratar a AME.

Por isso, é um medicamento inovador e que pode levar ao desenvolvimento de muitos outros tratamentos – isso acaba por diluir os custos do desenvolvimento, já que abre a porta a várias outras utilizações e a lucros alargados.

Como é que o Infarmed aprovou o financiamento público?

O Infarmed aprovou o financiamento público do Zolgensma em 2021, no seguimento da luta dos pais da bebé Matilde, uma menina que recebeu o tratamento para a AME no SNS.

No relatório que levou a essa decisão, publicado em Outubro de 2021, o Infarmed justifica a decisão com o facto de “o custo da terapêutica com Zolgensma” ser “inferior ao custo da terapêutica com Nusinersen”, o outro medicamento que é usado para tratar a AME.

O Nusinersen foi o primeiro tratamento aprovado para doentes com AME e é administrado por injecção, tendo que ser tomado durante toda a vida.

Na sua avaliação, o Infarmed entende que “não existe demonstração de valor terapêutico acrescentado” do Zolgensma “em relação a Nusinersen”.

“Contudo, é reconhecido o efeito benéfico do fármaco”, acrescenta, salientando que “esteve associado a maior sobrevivência livre de ventilação permanente do que o Nusinersen”.

A Autoridade Nacional do Medicamento repara, contudo, que os “resultados devem ser interpretados com cuidado”, uma vez que não há “dados comparativos” suficientes quanto ao efeito do tratamento a longo prazo.

Assim, a autorização do financiamento público assenta, essencialmente, na ideia de “minimização de custos e do impacto orçamental” no SNS.

E é mesmo eficaz?

A Autoridade Europeia do Medicamento (EMA na sigla original em Inglês) autorizou a comercialização do Zolgensma na Europa, considerando que pode melhorar a sobrevivência dos pacientes com AME.

A EMA cita “um estudo principal” para tomar esta decisão, frisando que “demonstrou” que o fármaco “reduz a necessidade de ventilação artificial em bebés com atrofia muscular”.

“Neste estudo, 20 dos 22 bebés que receberam Zolgensma estavam vivos e a respirar sem ventilador permanente após 14 meses, quando normalmente apenas um quarto dos pacientes não tratados sobreviveriam sem precisar de ventilador”, aponta a EMA.

A mesma pesquisa nota ainda que “o Zolgensma pode ajudar os bebés a ficarem sentados sem ajuda por pelo menos 30 segundos”, algo impossível em crianças não tratadas, como frisa ainda a EMA.

Um outro estudo publicado em Março de 2023 considera também que, embora seja “altamente criticado pelo seu custo, é um tratamento eficaz para a AME”. E “é mais rentável do que terapias comparáveis”, sublinha esta pesquisa que se refere ao Zolgensma como “um dos melhores tratamentos” para a AME de tipo 1 que estão disponíveis actualmente.

“Existem evidências substanciais de melhores resultados quando Zolgensma é administrado precocemente a crianças com menos de dois anos de idade”, realçam ainda os investigadores.

Há outra pesquisa publicada em Fevereiro deste ano que descreve “a primeira experiência do mundo real” com o uso deste medicamento na Suíça, concluindo que é “um tratamento potente” que leva a “melhorias significativas na função motora”.

“Todos os participantes do estudo apresentaram melhorias significativas na sua função motora”, reparam os autores deste estudo.

Contudo, “a necessidade de suporte respiratório e principalmente nutricional, bem como o desenvolvimento de escoliose, foram comuns em pacientes com AME de tipo 1” na avaliação efectuada pelos cientistas suíços.

Portanto, recomenda-se que estas situações devem ser “cuidadosamente avaliados mesmo no curto prazo após o tratamento”.

Quais são os riscos associados ao Zolgensma?

O medicamento tem vários efeitos colaterais adversos. Os mais comuns são lesões no fígado, níveis baixos de plaquetas sanguíneas, danos no músculo cardíaco, febre e vómitos.

Também se pode verificar o aumento das enzimas hepáticas, algo que pode ser tratado com esteróides.

Em todo o caso, os efeitos do fármaco a longo prazo não são ainda conhecidos, dado que está há pouco tempo a ser administrado.

Susana Valente, ZAP //

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3 Comments

  1. Sendo discutível a utilização do medicamento como se infere da notícia, o caso mais grave não assenta nesse aspecto.
    Porque carga de água, os portugueses devem pagar um tratamento de 4 milhões de euros mais as restantes alcavalas de duas gémeas brasileiras ?
    Ainda ontem foi descoberto um aposentado de mais de 80 anos que matou a mulher e se suicidou pois era o cuidador há vários anos da esposa doente com Alzeimer, tal era o desespero do sr.
    Já para não referir que os Ucranianos quando chegaram tinham direito a consultas e os Portugueses que pagam o SNS é o que se vê …
    É muito bonito fazer de rico à conta dos outros, que nessa perspectiva se amanhem e aguentem

  2. Medicamentos de 2 milhoes de euros arranja-se, já uma consulta no centro de saúde, esquece.
    Se curar completamente as criancas e elas possam ter hipótese de uma vida boa acho bem, se for para prolongar uns meses de sofrimento, não acho. Sinceramente por muito que custe tem que se canalizar o dinheiro público para o maior custo/benefício.

  3. Subscrevo inteiramente.
    Porque razão é que o estado Brasileiro não comparticipa com o seu dinheiro os contribuintes Brasileiros para que façam o tratamento fora do pais, já que não tem esse medicamento? É obrigação do Estado Brasileiro tratar dos seus não do Estado Português, não somos a Santa Casa da Misericórdia, brincamos ou que?

    Agora qualquer um chega cá naturaliza-se para ter direitos iguais aos meus? Mas que pouca vergonha é esta?

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