Os doentes que podem recuperar para uma vida normal devem ter prioridade face aos que têm baixa probabilidade de recuperação e a idade não pode por si só ser critério, recomenda um parecer do Colégio da Especialidade de Medicina Intensiva.
O parecer, homologado esta terça-feira pelo Conselho Nacional da Ordem dos Médicos e a que a agência Lusa teve acesso, tem seis recomendações para ajudar a gerir as decisões em medicina intensiva, numa altura em que o aumento de procura dos serviços de saúde por causa da pandemia de covid-19 pode dificultar a disponibilidade de recursos, “colocando os Intensivistas em cenários de grande complexidade ética”.
Como princípios gerais refere que a decisão de admissão em Medicina Intensiva deve assentar “no dever de planear, no dever de cuidar, no respeito pelos quatro princípios bioéticos – beneficência, não-maleficiência, autonomia e justiça distributiva – e na equidade de tratamento”.
Lembra que, face a uma pandemia, o dever de planear é prioritário e que o não planeamento em situações de previsível escassez de recursos pode levar à ineficiência e desperdício, à perda evitável de vidas e ao “uso de estratégias de priorização e racionamento, de outro modo, desnecessárias”.
O documento datado de sexta-feira (dia 20 de novembro) defende que esta planificação passa pela elaboração e implementação pela Medicina Intensiva de um Plano de Contingência, consensualizado com outros serviços hospitalares e aprovado pelo conselho de administração de cada instituição de saúde e que este plano deve ter um nível local e um nível regional de organização.
Sublinha que é absolutamente essencial o funcionamento em rede, pois traduz natureza cooperativa e solidária do Serviço Nacional de Saúde.
Para ajudar a gestão de decisões na medicina Intensiva, o parecer faz uma série de recomendações, entre elas o dever de planear e o “dever de maximização do benefício”.
Para maximizar o benefício, devem ser ponderados critérios como a apresentação e gravidade da doença aguda, nomeadamente número e gravidades das disfunções orgânicas (SOFA), a reversibilidade e prognóstico da doença aguda, a presença prévia de comorbilidades e o estado funcional e de fragilidade (Frailty Scale) prévio à situação aguda ou agudizada que motiva a admissão do doente em Medicina Intensiva.
“A idade, embora se relacione com a probabilidade de existência de comorbilidades e com o estado funcional, não é critério a utilizar, por si só, nesta avaliação”, frisam os especialistas.
A boa aplicação desta recomendação, refere o Colégio da Especialidade de Medicina Intensiva, “reduzirá a necessidade de interrupção de cuidados, mas esta é imperativa na dimensão individual, omitindo tratamentos fúteis e evitando o encarniçamento terapêutico, ou num contexto de catástrofe, orientado por critérios de justiça relativa”.
Além dos critérios descritos, o Colégio da Especialidade diz que a decisão de admissão em Medicina Intensiva deve igualmente basear-se num modelo de decisão partilhada com o doente ou com os seus familiares, em metodologia colegial, ouvindo profissionais qualificados, “num processo coordenado por intensivistas seniores” e em que se admite a audição de pares externos à instituição de saúde.
“Estes mecanismos favorecem uma melhor decisão, mitigam a angústia e o desconforto individual dos profissionais, atenuam a subjetividade e promovem um modelo de decisão partilhado com o doente, os seus representantes e a sociedade”, sublinha.
Diz também que qualquer decisão de limitação ou interrupção de cuidados “deve ser construída em equipa, partilhada com os cuidadores, e mantendo o foco, no limite do exequível, no envolvimento do doente e dos seus representantes”.
“Quando aplicável, este processo deve suscitar reapreciações periódicas, visando a reavaliação de premissas críticas para a decisão e assegurando o dever de informação e partilha. Só a total transparência poderá manter a confiança do cidadão no sistema de saúde”, sublinha.
O Colégio da Especialidade de Medicina Intensiva da Ordem dos Médicos defende também que “não deve haver diferença de critérios de alocação de recursos escassos entre doentes com covid-19 ou com outras condições clínicas” e que “o princípio da máxima beneficência deve ser exercido de forma transversal para todos os doentes críticos, seja qual for o motivo de admissão.
“A covid-19 não desaparecerá em poucos meses e será necessário reforçar várias linhas de atividade entretanto suspensas ou muito diminuídas. Será necessário capacitar a Medicina Intensiva de forma sustentada, estruturando uma melhor resposta a este desafio de coabitação”, sublinha a Ordem.
Para doentes com prognóstico semelhante, a Ordem dos Médicos defende que “deve ser invocada a equidade e operacionalizada de forma que evite o ‘quem chega primeiro, primeiro é servido’, que não pode ser aplicado em situações em que a resposta tem de ser urgente e rápida e a inexistência de recursos pode ser fatal para o doente”.
“A decisão de não admissão em Medicina Intensiva ou a decisão de não encarniçamento terapêutico nunca podem ser confundidas com abandono. Pelo contrário, exigem a elaboração de plano de cuidados em que o intensivista é parte integrante”, sublinha.
E exemplifica: “a decisão de não oferecer ventilação mecânica invasiva não impede que se ofereça ventilação não invasiva ou oxigenoterapia nasal de alto fluxo e a decisão de oferecer ventilação mecânica invasiva não implica que se escale tratamento para suporte de outros órgãos”.
O Colégio da Especialidade de Medicina Intensiva insiste que cada decisão deve ser ponderada de acordo com o melhor interesse global de cada doente, “tendo em atenção a previsível qualidade de vida após a doença aguda, a sua autonomia e o resultante de cada proposta terapêutica”.
“O dever de cuidar é fundacional ao exercício clínico. Este dever requer fidelidade ao doente, que em nenhum momento nem por nenhuma razão pode ser abandonado”, frisa.
// Lusa
Coronavírus / Covid-19
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Isso é a lógica dos Nazis, quem não serve ao estado é dispensável!!!!
São os mais vulneráveis que devem ter as maiores ações paliativas, os mais fortes têm mais condições de combater a doença sem auxílio externo.
O estado tem meios para reforçar os serviços de saúde, as pessoas passaram uma vida inteira a pagar impostos para agora serem consideradas dispensáveis?
O país agora é uma Venezuela?
Ou seja, recorrer a ortotanasia por necessidade selectiva devido ao aumento de internamentos !……tem muito receio de divulgar o termo exacto !…mas é disso mesmo que se trata !
Para mim, quem devia ficar para trás são as pessoas que não cumprem as medidas impostas para a contenção da pandemia, achando-se imunes e demasiado livres a ponto de interferirem com a liberdade dos outros. Não usam máscara, não querem ficar em casa ao fim de semana, então não há lugar para eles no SNS porque é este tipo de gente que o está a pôr à prova!!
Prometi não voltar a comentar mas não resisto.
Se o facto de prescindir do SNS me libertar das obrigações que acho aberrantes, então eu prescindo do SNS e de viver a pandemia do medo colectivo.
Note que eu tenho que cuidar de mim mesmo, não tenho nada que cumprir obrigações para cuidar dos outros, cada um que cuide de si e seja responsável por si mesmo.
Se quiser viver apavorada com medo de ser contagiada e morrer, cuide-se, não obrigue os outros a fazerem aquilo que não querem e de que não estão de acordo.
Obrigação e proibição são características das ditaduras e eu gostava de viver num país minimamente livre em que a minha liberdade não colidisse com a sua, nem a sua liberdade colidisse com a minha.