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Portugueses gastam 160 euros por ano na “epidemia das raspadinhas”. 11 vezes mais do que os espanhóis

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De acordo com um estudo recente, há cada vez mais pessoas a chegarem aos consultórios médicos com a doença do jogo patológico desencadeada pela raspadinha.

Num artigo científico publicado na The Lancet, Pedro Morgado e Daniela Vilaverde, investigadores da Escola de Medicina da Universidade do Minho, alertam para os perigos desta lotaria instantânea dos Jogos Santa Casa, que tem “potencial para encorajar o jogo excessivo”.

Segundo o Público, para isso contribuem vários fatores: “as raspadinhas não exigem conhecimentos em jogo, não são caras e são altamente acessíveis“, escrevem os autores. Além disso, as raspadinhas são “experiências de recompensa e têm uma rápida frequência de eventos e intervalos de pagamento curtos”, o que contribui para o potencial para o jogo excessivo.

Em 2018, foram vendidos 1.594 milhões de euros em raspadinhas, o que significa que, em média, foram gastos 160 euros por português em raspadinhas nesse ano. Este número ganha ainda mais dimensão quando posto ao lado dos 14 euros por pessoa gastos pelos espanhóis.

Para Pedro Morgado, por trás destes valores está “um problema negligenciado”. “Os números são brutais. Gastamos demasiado dinheiro em raspadinhas e isso significa que o número de pessoas com problemas de jogo patológico, adição ou vício do jogo, associado a raspadinhas é potencialmente maior.”

Os investigadores notam que, em Portugal, não há estudos epidemiológicos que observem os aspetos aditivos das raspadinhas, mas afirmam que “existe a perceção de um aumento no número de pacientes à procura de tratamento médico para problemas com o jogo associados a esta lotaria em Portugal”.

“A economia da indústria do jogo (incluindo os impostos coletados pelos governos) pode resultar na falta de políticas efetivas para regular tipos específicos de jogos”, acrescentam os investigadores da Universidade do Minho.

Nesse sentido, a venda e a revenda de raspadinhas está isenta de IVA e, para que esta isenção seja aceite pelo Fisco, não é necessário que a fatura mencione o nome do jogo. Basta que refira o valor de venda da raspadinha.

Em novembro, a AT esclareceu que, como se trata de um jogo social do Estado, a raspadinha está isenta de IVA, sem direito a dedução. Assim, e uma vez que a menção do nome “raspadinha” na fatura permite identificar “a natureza dos bens transmitidos”, o Fisco considera “suficiente” a mera indicação de que se trata de uma raspadinha.

“Há pessoas que gastam 500 euros num dia”

Ao contrário dos jogos de casino, em que o paciente pode pedir para ser proibido de entrar nesses estabelecimentos, tal não é possível com as raspadinhas, aponta Morgado ao diário, sugerindo que obrigar os jogadores a fazer um registo para poderem comprar uma raspadinha nas papelarias e tabacarias por ser um dos mecanismos de controlo.

“Isso permitiria, com recurso ao cartão de cidadão, que o doente pedisse essa auto-exclusão”, evidencia o autor do estudo, que considera que é “urgente e necessário” abordar a epidemia da raspadinha em Portugal.

Para os investigadores, a proliferação e disponibilidade das raspadinhas são outro dos problemas. Além de estarem “disponíveis em qualquer quiosque“, como não há qualquer estigma associado, “ninguém se sente envergonhado por comprar raspadinhas”, disse o investigador ao Expresso.

“A sobreexposição a notícias de casos em que as pessoas gastam três euros e ganham 30 mil também criam a ilusão de que é fácil ganhar”, sublinha o autor. “É preciso aumentar a literacia da população face a estes problemas, dado que a maior parte das pessoas desconhece que é possível ficar viciado neste jogo.”

Normalmente, não são as próprias pessoas quem procura ajuda, mas sim os familiares que se apercebem do problema, que ocorre “tanto em homens como mulheres, e nas várias idades”. Ainda assim, há “uma ligeira prevalência entre as pessoas com idades mais avançadas”.

“Às vezes recebo pessoas que gastaram todas as poupanças da sua vida nas raspadinhas sem que nenhum familiar se tivesse apercebido. Ou pessoas que pediram emprestado dinheiro a vários familiares dizendo que era para outros fins que não o jogo, como tratamentos no dentista ou para pagar o arranjo do carro”, conta Morgado.

Há pessoas que chegam a gastar 500 euros num só dia ou 20 a 30 mil euros ao longo de um ano. “Estão sempre na expectativa de que vão ganhar e se não for agora é na próxima vez ou na próxima ou na próxima.”

Além de mais controlo e mais investigação, Pedro Morgado fala também em prevenção, através da divulgação de “informação sobre os riscos associados” e de “sensibilização junto dos meios de comunicação social no sentido de não publicarem tantas histórias de grandes ganhos com pequenos investimentos”.

“A verdade é que Portugal tem as taxas mais baixas da Europa em termos de toxicodependência, o que se explica pelas políticas públicas que foram adotadas no país. O mesmo terá de ser feito para este problema em concreto e esse é o nosso apelo. São necessárias políticas públicas para diminuir os problemas associados às raspadinhas”, remata.

ZAP //

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