Volodymyr Zelensky, o novo presidente da Ucrânia, tem três problemas para resolver: acabar com a guerra, baixar o preço do gás e lutar contra a corrupção.
Estes são os três desejos mais repetidos pelos ucranianos esta segunda-feira, um dia depois das eleições presidenciais, que separaram os dois candidatos da segunda volta por mais de 48% de votos – uma vitória esmagadora.
Petro Poroshenko, o candidato que perdeu as eleições, é oligarca, dono de fábricas de chocolates, detém uma estação de televisão e sentou-se pela primeira vez no Parlamento em 1998 – década em que a política na Ucrânia estava a tomar forma, depois da brusca queda da União Soviética.
A maior parte dos intervenientes na formação da nova classe vinham formatados pela URSS e isso deixou marcas nas formas de governação, nomeadamente pela corrupção intrínseca das mais baixas às mais altas ramificações políticas.
Volodymyr Zelensky venceu as eleições. Entrou na política na passagem de ano de 2018 para 2019, quando anunciou a candidatura para ser o novo líder da Ucrânia. Até então, todo o seu sucesso vinha das comédias e dos programas humorísticos que fazia, o que fez com que o Ocidente reagisse de forma agridoce à vitória.
A questão russa é um dos pontos mais importantes do mandato do novo Presidente: dialogar com o Kremlin, mas nunca ceder. O conflito com os separatistas pró-russos no leste da Ucrânia já dura mais de cinco anos e é responsável pela morte de mais de 13 mil pessoas.
A corrupção endémica que ficou por resolver é outro e a crise financeira que deixou milhares de pessoas praticamente na miséria é o terceiro e igualmente importante. São três problemas com os quais Zelensky vai ter que lidar.
Mas, primeiro, Zelensky vai ter de passar um teste: a barreira parlamentar. “Poroshenko detém a maioria no Parlamento, e por isso, Zelensky vai ter uma grande dificuldade em gerir o país. Tem até 27 de outubro, data das eleições legislativas, para criar uma forte equipa política para servir de base para os próximos cinco anos de mandato”, explicou o jornalista e historiador José Milhazes ao Expresso.
A questão da língua também é importante. “Na Ucrânia, toda a população fala russo, mas nem toda a gente sabe falar ucraniano”, recorda Milhazes. Zelensky faz parte do segundo grupo.
Numa entrevista à BBC, a mulher do novo líder, Yelena, garantiu que o marido vai ter um tutor para aprender a língua na perfeição. Esta pode ser uma questão que acabe por jogar a seu favor e servir de exemplo de união para o resto do país, dividido por este problema há décadas.
Zelensky é visto pelos meios de comunicação ucranianos com algumas reservas, mas a população olha-o como uma última esperança de mudança.
Rússia manifesta otimismo moderado
A Rússia considerou ser “demasiado cedo” para determinar a perspetiva de um “trabalho em comum” com o novo Presidente ucraniano Volodymyr Zelensky, eleito no domingo por maioria na segunda volta das presidenciais face ao cessante Petro Poroshenko.
“Em relação às eleições na Ucrânia, de momento é muito cedo para evocar a possibilidade de um trabalho em comum. Apenas será possível determiná-lo com casos específicos”, declarou aos media o porta-voz do Kremlin, Dmitri Peskov.
“Moscovo respeita a escolha do povo ucraniano, e em particular quando essa escolha é muito clara”, prosseguiu Peskov, apesar de questionar a “legitimidade” do escrutínio pelo facto de “os três milhões de cidadãos ucranianos residentes na Rússia não serem contemplados com a possibilidade de votar”.
Ao pronunciar-se sobre o escrutínio no país vizinho, a presidente do Senado russo, Valentina Matvienko, garantiu por sua vez que a Rússia está “disposta a dialogar com o presidente em que confiam os cidadãos da Ucrânia”, citada pela agência Interfax.
Na sua perspetiva, a Rússia está interessada em “normalizar as relações, solucionar rapidamente o conflito interno entre o leste e as autoridades, para que exista paz e estabilidade na Ucrânia”.
A senadora assegurou que o diálogo e a cooperação deverão assegurar o cumprimento por Kiev dos Acordos de Minsk para “garantir uma solução pacífica a esta crise política interna”. O primeiro-ministro russo Dmitri Medvedev também se exprimiu na sua página na rede social Facebook. Existe a “uma possibilidade de melhorar a cooperação” com a Rússia, mas Medvedev admite não ter “qualquer ilusão” a esse respeito.
O ano passado foi caracterizado por um agravamento das tensas relações entre Kiev e Moscovo. A Ucrânia terminou 2018 sob regime de lei marcial, instaurada no início de dezembro e em vigor durante um mês na sequência do incidente no Mar Negro (estreito de Kerch) entre as marinhas russa e ucraniana, com a detenção de dezenas de ucranianos.
O incidente no estreito de Kerch fez recordar o conflito que se prolonga há cinco anos no leste da Ucrânia entre Kiev e os separatistas pró-russos da região do Donbass, que Poroshenko não conseguiu solucionar.
Com fracos resultados nas sondagens, o Presidente também tentou beneficiar politicamente da decisão do patriarcado de Constantinopla, que no outono reconheceu a independência do patriarcado de Kiev face ao de Moscovo.
Um sucesso que não fez esquecer os fracassos da presidência Poroshenko, que subiu ao poder na sequência da revolta de Maidan (Euromaidan) nos inícios de 2014, quando o anterior Governo do ex-Presidente Viktor Yanukovych anunciou em novembro de 2013 que não assinaria o Acordo de Associação com a União Europeia, pretexto para o início dos protestos.
Após ter evitado o colapso do país em 2014-2015, com a perda da Crimeia e a guerra no leste, com um balanço de 13.000 mortos e milhares e feridos e refugiados, Poroshenko falhou em áreas decisivas como a reforma do Estado e o combate à corrupção.
ZAP // Lusa
Submissão à Rússia é o futuro da Ucrânia. Da Chechénia ninguém mais falou ou interessou.