Uma ‘app‘ designada NaMo – as iniciais do primeiro-ministro da Índia Narendra Modi -, já descarregada 10 milhões de vezes naquele país, tem espalhado “ódio sobre adversários políticos”, difundido imagens manipuladas e informação falsa, como propaganda.
Segundo informou o Diário de Notícias (DN) na segunda-feira, uma investigação jornalística desenvolvida por Samarth Bansal e divulgada no domingo, no Medium, mostra que a app para telemóveis é responsável pela difusão de notícias falsas nas redes sociais na Índia.
Um dos exemplos das ‘fake news‘ disseminadas refere que, “do total de 40 mil casos de violação na Índia, nos últimos dez anos, 39 mil tiveram um agressor muçulmano. Ainda assim, o [partido do] Congresso e Rahul Gandhi dizem que os hindus são violadores e terroristas. Que vergonha para o Congresso e para a família Gandhi!”.
De acordo com o DN, nestas duas frases da notícia “não deve haver uma única premissa verdadeira”, visto que “nem as violações são um caso religioso – e muito menos são registadas dessa forma pelas autoridades – nem Rahul Gandhi chamou violadores aos hindus”.
A mesma foi divulgada em agosto de 2018 por Sanjay Gupta, apoiante do primeiro-ministro, num grupo do Google Plus chamado “Narendra Damodar Das Modi”, que conta com mais de dois milhões de seguidores e no qual é moderador.
Outro exemplo de uma notícia falsa, avançada pelo DN, dizia que “92% dos muçulmanos votaram nas eleições de Karnataka [estado da Índia], 86% dos cristãos votaram, mas apenas 58% dos hindus votaram. 42% dos hindus nem sequer votaram.
Com estas estatísticas falsas, Sanjay Gupta tentou explicar a derrota do seu partido nas eleições regionais, “com uma indução errada, baseada em puro sectarismo”.
“A Comissão Eleitoral da Índia não tem qualquer forma de saber quem são os votantes, por religião. Mas a religião faz parte da propaganda política e do discurso de ódio que circula ‘online‘”, lê-se no artigo.
Depois de vários relatórios atribuírem à desinformação um papel no aumento da violência política – dezenas de linchamentos, organizados no WhatsApp, por exemplo -, agora é a própria aplicação oficial do primeiro-ministro a estar no centro de um “problema sério para a democracia na Índia”.
A NaMo já tinha sido acusada de recolher dados privados, sem o consentimento dos seus utilizadores. A BBC concluiu, num trabalho recente, que os apoiantes do partido do Governo – o Bharatiya Janata (BJP) – partilhavam muito mais desinformação do que os militantes da oposição, nas redes sociais.
“Este é um tema muito relevante na Índia, que vai a votos em Maio. Sobretudo quando o BJP tem uma campanha sistemática de mentiras lançadas sobre os seus adversários. Uma delas é um caso óbvio de manipulação”, acrescenta o DN.
Esse caso relacionava-se com Rahul Gandhi, neto de Indira Gandhi. Numa fotografia sua, nas instalações do Partido do Congresso, em Deli, foi alterada a imagem de Mahatma Gandhi do quadro pendurado na parede por uma imagem do imperador mongol Aurangzeb, que invadiu a Índia e perseguiu os hindus, no final do século XVII.
Outra das manipulações indicava que uma alegada investigação da BBC havia provado como o Partido do Congresso era o quarto mais corrupto do mundo. A questão é que “nunca foi feita nenhuma notícia do género” pelo referido órgão de comunicação.
Em ambos os casos, o partido no Governo indicou ao Quartz que não havia nenhuma premeditação neste uso de ‘fake news‘, devendo-se tudo ao caráter aberto da aplicação, que possibilita aos utilizadores partilhar informação uns com os outros.