Um Costa na Europa, roubo de malas e moção de desconfiança. Há 100 anos a história era parecida (e acabou em ditadura)

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Joshua Benoliel / Wikimedia Commons

O terceiro governo da Primeira República, chefiado por Afonso Costa (ao centro, de bigode e pêra)

Há 100 anos, a instabilidade económica dividia esquerda e direita na Assembleia da República. À falta de entendimento, que se arrastava desde a saída de cena de um importante político português, o Exército escolheu outra solução: a ditadura militar. Mas há bizarras semelhanças com a atualidade.

Costuma dizer-se que “a história repete-se”. Para Mark Twain, “a História não se repete, mas rima”. Em Portugal, as rimas são muitas — e só temos de recuar um século.

Nos tempos da Primeira República, há exatamente 100 anos, em 1925, Portugal vivia um “vazio político”. As palavras são do político e historiador Rui Tavares, no podcast de história “Tempo ao Tempo” do jornal Expresso.

No episódio, Rui Tavares narra a história da crise política do país, com surreais semelhanças à que atualmente enfrentamos — inclusive o roubo de malas. O que se passou em 1925, e qual foi o desfecho?

Depois da partida de um influente político que desempenhara o papel de chefe do executivo, Afonso Costa, os portugueses enfrentavam uma grave crise política.

De facto, em 1919, Afonso Costa, uma das grandes figuras que tornaram possível a Primeira República, abandonou o governo após ter sido nomeado chefe da delegação portuguesa à Conferência de Paz e à Sociedade das Nações, sediada na Suíça e criada após a Primeira Guerra Mundial.

Por este século, também tivemos uma demissão do primeiro-ministro António Costa (sim, são dois Costas a partir daqui para fora), a que se seguiu a sua presidência de um órgão da, agora, União Europeia: o Conselho Europeu. Como comenta Rui Tavares, “qualquer coincidência é pura realidade”.

O país foi deixado a um governo liderado por José Domingues dos Santos, um político de esquerda que defendia o apoio aos sindicatos, o que lhe valeu uma grande dissidência com a Associação Comercial de Lisboa, que o chefe do “governo canhoto”, como se chamava na altura à coligação de esquerda, acabou mesmo por dissolver.

Foi aí que tudo se deteriorou: o partido nacionalista de direita apresentou no Parlamento uma moção de desconfiança (o que agora equivale a uma moção de censura). Foi aprovada, e o governo caiu em fevereiro de 1925. Agora, temos uma moção de confiança rejeitada, que mergulhou o país em clima eleitoral — de novo.

Para ajudar aos caos, os temas mais “quentes” na época eram também muito semelhantes aos atuais. Uma das preocupações dos portugueses era a escalada do preço das casas, devido à grande inflação que se sentia.

Outra questão curiosa era a polémica do misterioso furto de malas nos correios, que intrigou os portugueses ao longo desse ano. A história é tão caricata que podia ter inspirado Miguel Arruda, deputado suspeito de roubar malas em aeroportos.

E como se saiu deste impasse político? Depois de um período de conturbada transição política, com controvérsias entre a direita, apoiada em grande parte pela burguesia e pelo setor económico português, e a esquerda, mais voltada para os operários e sindicatos, uma importante fatia da sociedade começava a interessar-se por outras fações políticas europeias: o Exército.

As instituições republicanas falhavam, não conseguiam resolver a crise política, e a população estava descontente tanto com os políticos de esquerda como com os de direita. Não havia ordem, não havia produtos quotidianos (como o tabaco, por exemplo), não havia rendas acessíveis.

As forças armadas portuguesas começam, então, a olhar para fora: a Itália era já governada pelo fascista Benito Mussolini, que prometia uma forte revolta contra a esquerda.

Mussolini nunca escondeu a sua sede de autoritarismo, mas foi apoiado, em especial, pela classe média. Segundo explica a Enciclopédia Britannica, os italianos “estavam cansados de greves e tumultos, recetivos às técnicas extravagantes e aos adereços medievais do fascismo e prontos a submeterem-se à ditadura, desde que a economia nacional fosse estabilizada e o país recuperasse a sua dignidade”. Por cá, o clima entre a classe média não era muito diferente.

No dia 18 de abril de 1925, o comandante Filomeno da Câmara, o general Sinel de Cordes e o tenente-coronel Raul Esteves encetam uma revolta com o objetivo de derrubar a República (e, possivelmente, instaurar um regime fascista), episódio relatado com o auxílio de imagens num vídeo da RTP.

O golpe falhou, e os militares foram submetidos a julgamento, mas acabaram absolvidos. Era o primeiro passo para a instauração de uma ditadura militar, que só se concretizou no ano seguinte.

O resto da história é mais sabido: no dia 28 de maio de 1926, o Exército une-se contra a República, e leva a cabo o golpe que acabou com o projeto de Afonso Costa: instaurava-se no país uma ditadura militar, da qual nasceu a inconfundível figura de um político de quem, até à data, pouco se sabia. Falamos, claro está, de António de Oliveira Salazar. E o resto é história.

Carolina Bastos Pereira, ZAP //

5 Comments

  1. É mentira que o Exército se tenha «…unido contra a República…», a Revolução Nacional do 28 de Maio de 1926 foi um levantamento militar Patriota-Republicano com o objectivo de salvar a República que estava a ser destruída pelos liberais/maçonaria; o 28 de Maio de 1926 e o Estado Novo foram a continuação da República.

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  2. A maioria dos portugueses, tem uma tendencia congéita para bajular e confiar nos vendedores de feira, nos ladrões de malas (este coitado, comparado com outros, contentou-se com pouco), nos violadores de menores, nos mentirosos, nos vaidosos que usam a politica para engraxar o próprio ego, nos perdidos na vida que não se safam noutro lado, ….etc,
    Curiosamente, votam nos mesmos a cada eleição.
    Continuem a votar meus filhos e durmam descansados, porque, só assim terão “garantida” a nossa democracia.

  3. “Mintam, mintam sempre, que da mentira muuuita coisa há-de ficar!” já aconselhava o camarada socialista Lenine aos seus apoiantes.
    Afonso Costa foi um ditador na verdadeira acepção da palavra, usando da violência arbitrária para roubar a Igreja, prender, torturar, violar e assassinar religiosos e todos aqueles que se lhe opusessem! A república do reviralho era a imagem do que há de pior nos portugueses, pois aumentou a pobreza e a fome, o analfabetismo e vivia do medo e do assassinato de opositores, como aconteceu com António Granjo em 1921. O extremista socialista, tal como Mao ou Estaline, de seu nome Rui Tavares, não é indicado para falar nos seus antepassados políticos. Todos iguais, todos violentos e mascarados de democratas!

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