A Relação do Porto rejeitou um recurso apresentado pelo Ministério Público e manteve a condenação do Estado português em pagar 15.000 euros a um homem que esteve preso um mês, por abuso sexual, devido a erro das autoridades.
“O Tribunal da Relação do Porto negou provimento ao recurso interposto pelo Ministério Público e confirmou a decisão do Tribunal Judicial de Vila Nova de Gaia, que condenou o Estado português ao pagamento de indemnização ao cidadão Bacar Baldé por erro grosseiro e pelo facto de o mesmo ter estado preso, ilegalmente, durante um mês no Estabelecimento Prisional de Lisboa”, avançou hoje à agência Lusa Ricardo Vieira, advogado do lesado.
No recurso, interposto em Dezembro último, a que a Lusa teve acesso, o Estado reclamava absolvição ou, pelo menos, “ser condenado no pagamento de uma indemnização em montante substancialmente reduzido”, considerando os 15.000 euros manifestamente exagerados, comparativamente com decisões do Supremo Tribunal de Justiça em casos idênticos de perda da liberdade.
O acórdão do Tribunal Judicial de Vila Nova de Gaia, proferido dois meses antes, sustenta que em 2008, o verdadeiro autor do crime, depois de detido, identificou-se “falsamente” na Polícia Judiciária do Porto e foi presente a primeiro interrogatório judicial como sendo Bacar Baldé, sem que os inspectores confirmassem a veracidade da identidade apresentada pelo suspeito, que ficou sujeito à medida de coação de termo de identidade e residência.
Em Outubro de 2009, Bacar Baldé foi acusado de um crime de abuso sexual de pessoa incapaz de resistência e, após várias tentativas falhadas de notificação, em Maio de 2010, o “identificado” como Bacar Baldé foi julgado e condenado, na sua ausência, a três anos e meio de prisão efectiva.
O acórdão do tribunal de Gaia frisa ainda que autoridades detectaram o “erro na detenção do verdadeiro autor” do crime, depois da realização de testes de ADN, os quais comprovaram que o homem, na casa dos 30 anos, que estava a cumprir pena no Estabelecimento Prisional de Lisboa “nada tinha a ver com os factos denunciados”.
Quando foram emitidos os mandados de libertação, já Bacar Baldé tinha cumprido um mês da pena, entre 16 de Outubro e 15 de Novembro de 2010, dia em que foi solto.
O acórdão de primeira instância atribuiu as responsabilidades à actuação da investigação e explica que “em nenhum momento” o tribunal poderia “antecipar” que estava a julgar a pessoa errada.
O tribunal critica ainda o comportamento de Bacar Baldé por “nada requerer no processo” que permitisse evitar a sua prisão, uma vez que, “tendo antecedentes criminais” por outro tipo de crimes, sabia o funcionamento da justiça quando foi notificado da sentença condenatória.
Este era outro dos fundamentos do Ministério Público apresentado no recurso, apesar de o acórdão de primeira instância acrescentar que a actuação omissiva de Bacar Baldé “não exclui a responsabilidade” da administração, mas contribuiu de atenuante na indemnização a pagar pelo Estado.
/Lusa