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Em gravações de 2017, Epstein afirma que foi um grande amigo de Trump durante anos e faz várias revelações sobre a sua vida sexual. O Presidente dos EUA tem repetidamente negado ter sido próximo do pedófilo.
O recente corte de relações entre Donald Trump e Elon Musk trouxe à baila um assunto que o Presidente dos Estados Unidos quer enterrar — a sua relação com Jeffrey Epstein, o bilionário que estava no centro de uma rede de tráfico sexual de menores e que tinha ligações com vários nomes influentes do mundo político e do entretenimento.
O mote foi lançado por Musk depois do seu desentendimento com Trump devido às propostas incluídas no mega-pacote económico que o Presidente apelidou de “grande e bela lei”. “É hora de largar a grande bomba: Trump está nos ficheiros Epstein. É essa a verdadeira razão pela qual não foram tornados públicos. Tenha um bom dia, DJT!”, escreveu Musk numa publicação do X.
Apesar de o tweet de Musk ter reacendido as conspirações, as ligações de Trump a Epstein já datam de há várias décadas. Nos anos 90, Trump e Epstein conviviam nos mesmos círculos sociais em Palm Beach e Nova Iorque, com várias fotos a mostrar os dois em festas.
Em 2002, num perfil de Epstein na revista New York Magazine, Trump teceu elogios ao magnata. “Conheço o Jeff há 15 anos. É um tipo maravilhoso. É muito divertido estar com ele. Até se diz que ele gosta de mulheres bonitas tanto como eu e muitas delas são jovens”, afirmou.
Quando Epstein foi condenado por solicitar a prostituição de menores em 2008, Trump anunciou que o tinha banido de ir à sua mansão em Mar-a-Lago após um incidente com uma funcionária. “Não sou fã de Jeffrey Epstein“, disse na altura.
Em 2018, quando rebentou o escândalo sexual, Trump negou ter conhecimento dos crimes: “Não fazia ideia. Não falo com ele há muitos anos“. “Eu conhecia-o como toda a gente em Palm Beach o conhecia. Ele era uma figura conhecida em Palm Beach. Eu tive um desentendimento com ele há muito tempo. Acho que não falo com ele há 15 anos. Eu não era fã dele”, disse ainda em 2019.
“Fui o amigo mais próximo do Donald”
Trump nega ter sido próximo de Epstein, mas o jornalista Michael Wolff — que já escreveu três livros sobre o seu primeiro mandato — afirma ter provas do contrário.
Em 2024, no seu podcast Fire and Fury, Wolff divulgou gravações de uma entrevista que fez a Epstein em 2017, quando estava a recolher informações para um dos seus livros sobre a entrada de Trump na política.
No áudio, pode ouvir-se o falecido magnata a dizer que foi o “amigo mais próximo do Donald durante 10 anos”. Para enfatizar a proximidade entre os dois, Epstein afirma ainda que a primeira vez que Trump e a sua mulher Melania fizeram sexo foi no seu jato privado, apelidado de Lolita Express, numa referência ao livro de Nabokov que detalha a obsessão sexual de um homem adulto com uma menina de 12 anos.
O pedófilo condenado revela também que Trump é um traidor em série nos seus casamentos e que tinha um esquema elaborado para tentar envolver-se com as esposas dos seus amigos. Segundo Epstein, Trump convidava os seus amigos a irem ao seu escritório na Trump Tower para lhes perguntar sobre as suas vidas sexuais e oferecer-lhes a oportunidade de fazerem sexo com participantes de concursos de beleza. Enquanto isto, as esposas estavam a ouvir tudo numa chamada em viva-voz, e Trump usava estas traições dos maridos para as seduzir.
Numa certa ocasião, Trump levou uma mulher ao que ele chamou de “Sala Egípcia” num casino de Atlantic City. “Ele saiu depois e disse: ‘Foi ótimo, foi ótimo. A única coisa que eu realmente gosto de fazer é f*der as esposas dos meus melhores amigos. Isso é simplesmente o máximo'”, alega Epstein.
Epstein pinta ainda um retrato de um Trump mulherengo, que insulta os seus funcionários e praticamente não tem amigos, contando apenas com lealdade da sua filha Ivanka, a sua secretária Rhona Graff e o seu guarda-costas.
“Ele é um ser humano horrível. Faz coisas horríveis com os melhores amigos, com as esposas dos melhores amigos. Ele tenta ganhar a confiança das pessoas e usa isso para lhes fazer coisas más”, acusou.
Trump é também quase “funcionalmente analfabeto“, segundo Epstein, sendo um fã ávido da coluna de fofocas do New York Post. Qualquer “ato de gentileza” da sua parte é acidental e ele age como “uma criança de 9 anos com problemas emocionais”.
“Até certo ponto, é uma tragédia típica, porque ele acredita nas próprias tretas. Ele tem delírios de grandiosidade. Ele tem consciência daquela pessoa, Donald Trump. Ele fala sobre o Trump, o Trumpster“, refere.
Michael Wolff garante ainda que Epstein lhe mostrou fotos do seu cofre onde se vê Trump com jovens numa das suas festas: “E em algumas das fotos, elas estão sentadas no colo dele. Há uma de que eu lembro especialmente, com uma mancha reveladora na frente das calças de Trump, e as meninas a apontar para ele e a rir.”
Em respostas às acusações de Wolff, que foram feitas pouco antes das presidenciais de 2024, um porta-voz da campanha de Trump acusou o jornalista de tentar interferir nas eleições. “Ele esperou até dias antes da eleição para fazer difamações absurdas e falsas, tudo num esforço para interferir descaradamente nas eleições em nome de Kamala Harris. Ele é um jornalista fracassado que está a recorrer à mentira para chamar à atenção”, respondeu.
Este mês, Wolff revelou ao Daily Beast que Trump considerou dar um perdão presidencial a Ghislaine Maxwell, que foi namorada de longa data de Epstein e a sua principal cúmplice no recrutamento de vítimas. Quando Maxwell foi presa pelo FBI em julho de 2020, Trump terá ficado “muito cauteloso” e começou a perguntar “o que é que ela pode dizer?”, acusa o escritor.
“Todos ao redor dele estavam tipo, ‘Meu Deus, esperamos que ela não diga nada, mas realmente esperamos que ele não a perdoe’”, afirma Wolff.
Trump, então no seu primeiro mandato, acabou por não avançar com o perdão. Mas, quando questionado sobre o julgamento iminente de Maxwell, disse desejar-lhe “tudo de bom”: “Já a encontrei inúmeras vezes ao longo dos anos, especialmente desde que morei em Palm Beach, e acho que eles moravam em Palm Beach. Desejo-lhe tudo de bom, seja lá o que for”.
Recentemente, o advogado de Ghislaine Maxwell também pediu a intervenção de Donald Trump no seu recurso ao Supremo Tribunal contra a sua sentença de 20 anos de prisão por tráfico sexual.
Já esta quinta-feira, o Wall Street Journal avançou que Trump enviou uma carta com um esboço de uma mulher nua a Epstein para assinalar o seu 50.º aniversário em 2003. O desenho incluía os seios de uma mulher e a assinatura “Donald” no lugar dos pêlos púbicos. Dentro do contorno da mulher nua havia ainda um bilhete datilografado, estilizado como uma conversa imaginária entre Trump e Epstein escrita na terceira pessoa, que termina com a mensagem: “Feliz aniversário — e que cada dia seja mais um segredo maravilhoso”.
Em declarações ao jornal, Trump negou ser o autor da carta e avançou que vai processar o WSJ: “Isto é uma coisa falsa. É uma história falsa do Wall Street Journal. Nunca fiz um desenho na minha vida. Não faço desenhos de mulheres”.
MAGA revolta-se contra Trump
O ressurgimento das ligações de Trump a Epstein tem revoltado a base MAGA contra o seu líder. Em 2016, a teoria do “pizzagate” plantou as sementes das conspirações sobre uma rede de pedófilos poderosos, alegando que o Departamento de Polícia da Cidade de Nova Iorque tinha descoberto uma rede de tráfico sexual ligada aos Democratas quando acedeu aos emails de Anthony Weiner, um ex-congressista condenado por enviar mensagens de teor sexual a uma jovem de 15 anos.
Já em 2017 surgiu a teoria da conspiração QAnon, que sugere que um grupo de pedófilos satânicos lidera uma rede global de tráfico sexual de crianças em conluio com o “deep state”. Segundo os crentes, Trump está secretamente a liderar a luta contra esta elite, que muitos acreditam ser liderada pelos Democratas.
Durante a última campanha, Trump também prometeu em diversas ocasiões divulgar os arquivos Epstein, o que incluiria a lista de contactos que está no centro de muitas conspirações.
Em Fevereiro, num evento para a imprensa na Casa Branca, a Procuradora-Geral Pam Bondi distribuiu pastas que continham ficheiros “desclassificados” de Epstein a vários comentadores de direita, que rapidamente perceberam que não havia informações novas nos documentos. Em resposta à reação negativa que se seguiu, Bondi afirmou que o FBI não tinha divulgado uma parte dos ficheiros de Epstein.
Em declarações no mês passado, Trump tentou desvalorizar o caso. “Isso é uma notícia velha. Isso tem sido discutido há anos. Até o advogado de Epstein disse que eu não tive nada a ver com isso”, disse.
Já em Julho, o Departamento de Justiça publicou “revisão sistemática” dos arquivos Epstein que “não revelou nenhuma ‘lista de clientes’ incriminadora” nem evidências de que Epstein tenha chantageado figuras poderosas. O memorando também garante que o magnata cometeu suicídio na prisão.
Na sua rede social Truth Social, Trump garante que os arquivos de Epstein eram uma farsa, porque foram escritos por “Obama, a Hillary Corrupta, Comey, Brennan e os perdedores e criminosos da administração Biden”.
Até os mais fiéis defensores de Trump acham que o Presidente está a encobrir os ficheiros. “Esta é a pior resposta que já vi do Presidente Trump“, disse o comentador Benny Johnson. O ex-general Michael Flynn, considerado um herói pelo movimento QAnon, escreveu: “@realdonaldtrump, por favor, entenda que o CASO EPSTEIN NÃO VAI ACABAR”. Já Matt Walsh chamou a declaração de Trump “extremamente obtusa” e “tretas óbvias”.
Estas críticas estão a ser vistas como uma espécie de “karma” contra Trump, que está agora a ser alvo das mesmas conspirações que usou a seu favor. “A suposição errada de Trump e de outros é que podem divulgar teorias da conspiração sem consequências,” afirma o cientista político Matt Dallek, à Associated Press. “O caso Epstein demonstra que é difícil voltar a meter o génio na lâmpada“, remata.
No entanto, há especialistas mais céticos sobre se Epstein será a última gota para a base MAGA. Joseph Uscinski, professor de ciência política especializado em teorias da conspiração dá como exemplo as críticas que Trump enfrentou em 2021 quando apelou aos seus apoiantes que se vacinassem contra a covid.
Recentemente, parte da base MAGA também se virou contra o líder devido à escalada de tensão com o Irão. No entanto, muitos acabaram por voltar atrás e até elogiaram Trump quando este atacou as instalações nucleares iranianas.
E já há sinais desta mudança. A conspiracionista Laura Loomer saiu em defesa de Trump em relação à carta “totalmente falsa” divulgada pelo WSJ. “Toda a gente que realmente CONHECE o Presidente Trump sabe que ele não escreve cartas à máquina. Ele escreve notas com uma caneta preta grande“, afirmou. O comentador Charlie Kirk concorda: “Não é assim que Trump fala. Eu não acredito nisso”.
“Os apoiantes de Trump estão descontentes e vão exprimir isso nas redes sociais. Mas não o vão abandonar porque ele é a única opção que eles têm”, remata Uscinski.
A extrema direita é toda igual.. alias, uns são piores q outros. Misoginia é um dos maiores problemas. Ou um dos mais evidentes.