Belicistas vs. o “excêntrico” Tucker Carlson. Resposta de Trump ao Irão divide os Republicanos

Jim Lo Scalzo / EPA

A escalada de tensão com o Irão está a fazer mossa dentro dos Republicanos: de um lado estão os mais tradicionais, que apoiam uma resposta dura, e do outro estão rostos conhecidos do movimento MAGA, que defendem o fim das “guerras eternas”.

Partir ou não para a guerra com o Irão — é esta a questão que está a dividir os Republicanos por estes dias. Se em tempos passados o partido se unia a uma só voz no apoio a ataques militares contra os inimigos dos Estados Unidos, o crescimento do movimento America First e o surgimento de novos rostos no Congresso à boleia da retórica de Trump está a mudar o tom da política externa Republicana.

O protecionismo de Donald Trump não se limita à imposição de tarifas económicas e ao controlo na fronteira e extende-se também ao intervencionismo militar norte-americano noutros países.

As críticas às “guerras eternas” foram até uma das bandeiras da sua primeira campanha, com Trump a massacrar repetidamente Hillary Clinton e George W. Bush pelo seu apoio à guerra no Iraque, críticas que foram particularmente notórias na altura por não serem frequentemente ouvidas vindas dos Republicanos “Gastámos 6 biliões de dólares no Médio Oriente e o que temos? Nada. Absolutamente nada”, atirou, num dos debates presidenciais com Clinton em 2016.

Desde então, esta mensagem foi ecooada várias vezes, com Trump a ordenar a retirada das tropas norte-americanas da Síria em 2019 e a afirmar em 2020 que não cabe aos Estados Unidos ser os “polícias do mundo”.

Esta posição de Trump bateu de frente com a narrativa dominante dos “war hawks” — termo referente a políticos que defendem o poderio militar dos Estados Unidos e apoiam sempre respostas agressivas em situações de tensão com outros países — que controlavam os Republicanos e até a ala conservadora dos Democratas.

Com a vitória em 2016, aos poucos foram surgindo novos congressistas da linha Trumpista e o partido foi alinhando com a retórica mais isolacionista do Presidente.  Mas a recente escalada de tensão com o Irão na sequência dos ataques de Israel está a reacender estas velhas divisões no partido.

Se Trump sempre afirmou ser um Presidente anti-guerra, a verdade é que muitas das suas decisões apontam para o contrário, especialmente nas relações com o Irão. Em 2018, os EUA rasgaram unilateralmente o acordo nuclear e voltaram a impor sanções ao Irão, tendo até pressionado outros países, como a China ou a Índia, a não comprar petróleo iraniano.

Em Janeiro de 2020, Trump também ordenou um ataque com um drone que matou Qasem Soleimani, o principal general iraniano, acendendo receios de que estava iminente uma 3.ª Guerra Mundial. Trump também já acusou várias vezes o Irão de ser o “principal Estado patrocinador do terrorismo” no mundo e ameaçou “obliterar” o país caso este ataque os Estados Unidos.

“Hawks” saiem em apoio de Israel

Há agora vários Republicanos da “velha guarda” a defender que o chefe de Estado norte-americano siga novamente esta linha mais agressiva contra os iranianos, incluindo altos funcionários do Pentágono, como o general do Comando Central dos EUA (Centcom), Michael Erik Kurilla.

Questionado na semana passada se o Centcom estava preparado para “responder com força esmagadora para impedir o Irão de ter armas nucleares“, Kurilla respondeu: “Sim. Dei ao Secretário da Defesa e ao Presidente uma ampla gama de opções”.

Vários Senadores Republicanos, como Tom Cotton e o próprio líder da maioria John Thune, também saíram imediatamente em defesa de Israel logo após o seu ataque inicial ao Irão. “Tiro o meu chapéu a Israel por um dos ataques militares e operaçõs secretas mais impressionantes da história israelita”, afirmou ainda o Senador Lindsey Graham, um dos principais “hawks” nos Republicanos.

“Israel TEM razão e tem um direito de se defender”, defendeu ainda o líder da maioria Republicana na Câmara dos Representantes, Mike Johnson.

O apoio incondicional a Israel também tem vindo das chefias Democratas. Chuck Schumer, líder da minoria Democrata no Senado, frisou que “Israel tem o direito a defender-se e que o Irão não pode ter uma arma nuclear” — isto depois de, nas últimas semanas, já ter criticado Trump precisamente por não ser duro o suficiente com o Irão, usando até o slogan TACO (Trump Always Chickens Out, ou Trump é sempre um cobarde).

A posição de Schumer e de outros Democratas mais conservadores, como Hakeem Jeffries ou Jackie Rosen, está também no centro das divisões internas dos Democratas, com a ala mais progressista a ser muito crítica de Israel em Gaza e a arrasar a oposição frouxa que a liderança do partido tem feito outras políticas impostas pela administração Trump, como as deportações em massa, as violações de ordens dos tribunais ou os cortes do DOGE aos serviços públicos.

O eixo “JD-Tucker-Donald Jr.”

Se está a ser pressionado para ser mais duro com o Irão por um lado, por outro, Trump está a ser aconselhado a não escalar as tensões.

“Qualquer pessoa que está a bajular o envolvimento total dos EUA na guerra entre Israel e o Irão não é America First/MAGA. Desejar o assassinato de pessoas inocentes é repugnante. Estamos fartos de guerras estrangeiras. De todas elas”, apontou a congressista Marjorie Taylor Greene, da Geórgia, uma das principais aliadas de Trump na Câmara dos Representantes.

A liderar esta onda está ainda um trio composto pelo comentador Tucker Carlson, o vice-presidente JD Vance e Donald Trump Jr, filho do Presidente.

Há já vários meses que Carlson apela a que Trump não se envolve nos conflitos armados no Médio Oriente. “A maior vitória seria evitar o que seria o verdadeiro desastre de uma guerra com o Irão, que não ficaria no Irão, é claro”, afirmou numa entrevista este mês, descrevendo o envolvimento dos EUA como “suicida”.

Carlson também descreveu os seus opositores como “belicistas” e disse que essa descrição “incluiria qualquer um que estivesse a ligar a Donald Trump hoje para exigir ataques aéreos e outro envolvimento militar direto dos EUA”.

Matthew Bartlett, um estratega Republicano que trabalhou no Departamento de Estado durante o primeiro mandato de Trump, recorda que “Donald Trump mudou a direção do Partido Republicano” no que diz respeito à política externa.

“Isso deu-lhe uma nova base e um novo poder político. Esta nova guerra no Médio Oriente certamente ameaça essa base. Embora ainda não estejamos envolvidos numa guerra, os riscos de escalada aumentam drasticamente e isso certamente tem ramificações com a base MAGA”, alertou Bartlett.

Os defensores do movimento America First também pediram uma reformulação da abordagem dos EUA mais ampla, incluindo questionar o envolvimento na NATO, o apoio à Ucrânia.

O cisma entre os apoiantes de Trump também permeia o Pentágono. Elbridge Colby, subsecretário da Defesa para Políticas, está entre os mais proeminentes de um grupo de “priorizadores” que esperavam redirecionar os recursos americanos da Europa e do Médio Oriente em prol da crescente ameaça da China. Apesar disto, o Pentágono nega que haja divergências sobre as políticas dentro do departamento.

O que vai Trump fazer?

Até agora, a resposta de Trump parece ser mista. O Presidente norte-americano tem repetidamente apelado a negociações, mas tem reforçado que apoia Israel e já ameaçou o Irão com “toda a força e o poder das Forças Armadas dos EUA” em caso de um ataque.

Horas antes dos ataques iniciais israelistas, Trump também afirmou que preferia manter Israel fora das negociações com o Irão sobre um novo acordo nuclear. “Não quero que eles entrem, porque acho que isso prejudicaria tudo“, defendeu.

O chefe de Estado dos EUA também terá vetado o plano israelita para assassinar o líder supremo do Irão, Ayatollah Ali Khamenei. Na sua declaração inicial após os ataques israelitas, o Secretário de Estado Marco Rubio deixou ainda claro que os EUA não ajudaram Israel e omitiu qualquer menção de apoio à escalada.

No entanto, nem tudo é um mar de rosas para os rostos do movimento America First. Em resposta aos comentários de Tucker Carlson, Trump deixou claro que não descarta uma resposta mais dura contra o Teerão. “Alguém por favor explique ao excêntrico do Tucker Carlson que o IRÃO NÃO PODE TER NUNCA UMA ARMA NUCLEAR”, escreveu nas redes sociais.

Em declarações à ABC News no domingo, Trump também disser ser “possível que nos envolvamos” no conflito, o que alimentou mais receios no seio MAGA.

Resta-nos esperar para saber qual das fações Republicanas vai ganhar este braço de ferro.

Adriana Peixoto, ZAP //

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