Numa carta emotiva endereçada aos deputados do Parlamento Inglês, o avançado Marcus Rashford, do Manchester United, apela a um volte-face na decisão de acabar com as refeições escolares grátis para as crianças desfavorecidas durante as férias de Verão, lembrando que também beneficiou deste tipo de ajudas.
O Governo já confirmou que vai fazer ouvidos moucos do apelo do avançado da Selecção Inglesa, mas Marcus Rashford não se dá ainda por vencido.
“Estou focado num troféu que defende algo muito maior do que o futebol“, alega o jogador do Manchester United num texto no jornal The Times, onde frisa que sabe “o que é ter fome” e que tem consciência de que os amigos o convidavam para “assegurarem aos seus pais que comia”. “Essa foi a minha comunidade”, realça.
Rashford destaca que vai continuar a fazer campanha para que o Estado retome o programa de refeições grátis para as crianças desfavorecidas que frequentam a escola, implementado durante o confinamento devido à pandemia de covid-19 e que será interrompido durante as férias escolares.
O assunto ainda vai ser debatido no Parlamento, mas o Departamento de Educação já disse que não pretende reverter a decisão.
“Ainda não estamos vencidos, fiquem fortes pelas 200 mil crianças que não tiveram uma refeição hoje e continuem a partilhar”, escreve o avançado na sua conta do Twitter depois de ter partilhado no perfil do Instagram a carta que enviou ao Parlamento.
https://twitter.com/MarcusRashford/status/1272564756000452610
Vários jornais britânicos publicaram a carta de Rashford, nomeadamente o The Guardian. Na missiva, o jogador lembra que também ele beneficiou deste tipo de programas quando era criança.
Filho de uma mãe solteira com 5 crianças para alimentar em casa, o craque do United destaca que por muito que a sua progenitora trabalhasse, não era suficiente para pôr comida na mesa.
“O sistema não está construído para famílias como a minha terem sucesso”, nota o avançado na carta aos deputados, frisando que o Manchester United lhe permitiu entrar no seu programa de formação mais cedo porque a mãe tinha dificuldades para o alimentar.
“Isto não é sobre política; é sobre humanidade. Olharmo-nos ao espelho e sentirmos que fizemos tudo o que podíamos para proteger aqueles que, por qualquer razão ou circunstância, não podem proteger-se. Afiliações políticas à parte, não podemos todos concordar que nenhuma criança deveria ir para a cama com fome?”, questiona o avançado na sua carta.
Rashford recorda o dia em que se tornou no mais jovem jogador de sempre a marcar na estreia pela Selecção Inglesa, lembrando o Estádio de Wembley cheio. Um estádio que podia encher-se “duas vezes com crianças que tiveram de saltar refeições durante o confinamento por as suas famílias não terem acesso a comida”, destaca.
“A fome em Inglaterra é uma pandemia que pode arrastar-se durante gerações”, defende ainda o avançado, notando que “1,3 milhões de crianças” fazem parte do programa de refeições escolares gratuitas, mas que “um quarto dessas crianças não receberam qualquer apoio desde que as escolas fecharam” por causa da covid-19.
Durante a quarentena, o jogador juntou-se à organização de solidariedade FareShare para distribuir alimentação por famílias carenciadas, mas nota que as “três milhões de refeições” distribuídas todas as semanas não são suficientes.
“Em Inglaterra, actualmente, 45% das crianças provenientes de grupos étnicos minoritários vivem em pobreza”, aponta, frisando que é preciso ouvir “as histórias dos pais” que, muitas vezes, lhe chegam pelas redes sociais.
“Enquanto homem negro de uma família com baixos rendimentos, podia ser apenas mais uma estatística”, nota ainda Rashford, frisando que, em vez disso, está associado a “objectivos, números de jogos e internacionalizações”, graças aos esforços da mãe e às ajudas que recebeu, nomeadamente com programas de refeições grátis e recurso a Bancos Alimentares.
“Por favor, enquanto os olhos da nação estão sobre vocês, deem meia volta e façam da protecção das vidas dos mais vulneráveis uma prioridade de topo”, apela o avançado na carta enviada aos deputados.
O Presidente da Câmara de Londres, Sadiq Khan, já veio apoiar a campanha de Rushford.
“Como criança, beneficiei de refeições escolares gratuitas. A vida teria sido muito mais difícil para a minha família se não as tivéssemos”, aponta o autarca, salientando que pode “ser londrino e fã do Liverpool”, mas que apoia “totalmente” o jogador.
Também o líder do Partido Trabalhista, Keir Starmer, já veio sublinhar que vai apelar ao Governo para “garantir que nenhuma criança fique com fome neste Verão financiando refeições escolares gratuitas”.
“A longo termo, temos que enfrentar as causas da pobreza infantil. Neste momento, precisamos que o Governo apareça e que garanta que 1,3 milhões de crianças não passem fome neste Verão”, sustenta ainda o Partido Trabalhista num comunicado.
O principal Sindicato dos professores do Reino Unido anunciou também que “apoia totalmente” o apelo de Rashford.
Mas um porta-voz de Boris Johnson já veio frisar que o programa das refeições escolares grátis vai mesmo ser interrompido com o fim do período lectivo.
“O primeiro-ministro entende os problemas que as famílias pelo Reino Unido atravessam e é por isso que, na semana passada, o Governo anunciou 63 milhões de libras adicionais para as autoridades locais beneficiarem as famílias que se estão a debater para comprar comida e outros bens essenciais”, salienta fonte do gabinete de Boris Johnson citada pelo The Guardian.
“O primeiro-ministro vai responder à carta de Marcus Rashford logo que possa”, aponta ainda a mesma fonte, elogiando o jogador por estar a usar a sua imagem nas redes sociais “de uma forma positiva para destacar alguns assuntos muito importantes”.
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