Para além dos três inspetores julgados pelo homicídio do cidadão ucraniano Ihor Homeniuk, mais arguidos ainda podem vir a ser acusados.
Os depoimentos prestados por testemunhas no julgamento que está a decorrer em tribunal podem ter feito com que eventuais crimes cometidos por outros envolvidos sejam investigados.
De acordo com o Diário de Notícias, alguém que testemunha num julgamento e que assume no seu depoimento ter cometido ações suscetíveis de configurar crime pode ver o tribunal extrair certidão das suas declarações para que esse crime ou crimes sejam investigados.
Um procurador geral adjunto ouvido pelo jornal entende que o Ministério Público poderá ter decidido apostar em que as testemunhas se auto-incriminem de modo a poder acusá-las em resultado disso. Como arguidas, poderiam simplesmente remeter-se ao silêncio.
Por sua vez, se o tribunal entender que não há provas para condenar os três inspetores do SEF em julgamento – Luís Silva, Duarte Laja e Bruno Sousa -, mas considerar que as provas apontam para outro tipo de responsabilidade criminal, pode ainda alterar a qualificação jurídica.
Esta alteração pode ocorrer “desde que os factos sejam essencialmente os mesmos e a narrativa seja a mesma”, explica Inês Ferreira Leite, professora de Direito Penal na Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, ao DN.
Até agora só houve pedido de extração de certidões relativamente a três funcionários da empresa de segurança privada Prestibel, embora isso possa mudar.
“A qualquer momento do julgamento os juízes podem constituir arguida uma testemunha, sempre que nas suas declarações houver indícios de um crime por ela cometido. Podem ser factos ou podem ser indícios que mereçam ser investigados”, explica o procurador-geral adjunto já citado.
“Para não assustar as testemunhas, o coletivo de juízes pode, no limite, deixar passar todo o julgamento, ouvir todas as testemunhas da acusação e da defesa, e quando está a produzir o acórdão tomar essa decisão, tendo em conta tudo o que já sabe. Os juízes estão na posição ideal para o fazer e pode haver vantagem de não o fazer enquanto está ainda a decorrer o julgamento”, acrescenta.
No entanto, uma juíza de direito criminal ouvida pelo DN indigna-se com a possibilidade de “malandrice policial”.
“O MP não pode fazer isso. Quando vê o que está no processo tem de agir perante os factos. Não pode decidir quem é arguido e quem é testemunha. Não tem poder discricionário. Isso é uma espécie de justiça negociada que não existe no nosso sistema. Não vale tudo para obter prova e os juízes não devem alinhar com a estratégia da investigação”, argumenta em anonimato.