O antigo presidente do Banco Espírito Santos (BES) Ricardo Salgado vai esta segunda-feira ao início da tarde ser ouvido no âmbito da Operação Marquês pelo juiz de instrução criminal Ivo Rosa.
Um dos temas centrais da audição, tal como observa o semanário Expresso, será a transferência de 25,2 milhões de euros do Grupo Espírito Santo (GES) para o então presidente da Portugal Telecom (PT) Zeinal Bava.
As transferências em causa, que decorram entre 2007 e 2011, foram realizadas em três tranches para contas sediadas em Singapura e na Suíça. O Ministério Público (MP) quer saber o que motivou estes fluxos financeiros.
A acusação do MP sustenta que o valor em causa foi um pagamento feito a Zeinal Bava por este ter beneficiado o GES, durante anos, usando a PT, como uma espécie de caixa forte, bem como por ter ajudado a derrubar a OPA da Sonae sobre a PT.
Meses antes do colapso do GES, recorda o jornal, a PT investiu cerca de 900 milhões de euros numa das empresas do grupo da família Espírito Santo. Ao todo, a acusação defende que o universo Espírito Santo terá sido beneficiado pela PT em mais de 8,4 mil milhões.
Bava, que foi ouvido no âmbito do mesmo processo há uma semana, nega a tese de favorecimento da família Espírito Santo, tendo alegado que o valor lhe foi transferido para que pudessem comprar ações da PT para que se tornasse um acionista de relevo.
O antigo presidente da PT disse não ser “visita de casa” de Ricardo Salgado, assegurando que todo o dinheiro utilizado serviu para comprar ações da empresa”.
Os 25,2 milhões de euros acabaram por ser devolvidos quase na totalidade, mas só cinco anos depois. Segundo o jornal Público, Bava afirmou durante o interrogatório que queria ser um acionista de referência da PT, pretensão que transmitiu a Ricardo Salgado, que se disponibilizou, segundo contou, para lhe emprestar o dinheiro.
O gestor de 53 anos confirmou, por isso, os 6,7 milhões de euros recebidos em dezembro de 2007 na conta em Singapura. Disse ainda que, só três anos depois, quando recebeu mais 8,5 milhões de euros, desta vez numa conta na Suíça, é que sentiu necessidade de passar o contrato verbal a escrito, conta ainda o matutino.
O MP considera que este contrato, datado de 20 de dezembro de 2011, é fictício. Zeinal Bava não conseguiu esclarecer bem porque é que no contrato de 2010 não ficou escrito que já tinha havido uma transferência inicial de 6,7 milhões. Nem porque é que recebeu uma segunda tranche (8,5 milhões), quando não tinha sequer aplicado a verba inicial. O mesmo aconteceu com a terceira transferência, de dez milhões de euros.
O ex-presidente da PT admitiu ainda nunca ter chegado a comprar as ações da empresa e, por esse mesmo motivo, é que em 2016 devolveu à massa falida da Espírito Santo Internacional 18,5 milhões de euros. Tal como observa o diário, Bava não entregou, contudo, a primeira transferência de 6,7 milhões, que acabou por ser arrestada pelo MP no âmbito da Operação Marquês.
As outras perguntas
Ivo Rosa, que vai decidir depois da instrução se o processo segue ou não para julgamento, deverá questionar Ricardo Salgado sobre outros temas, uma vez que o arguido é acusado pelo MP de ser um dos principais corruptores do ex-primeiro-ministro José Sócrates, e de lhe ter pago alegadamente 29 milhões de euros.
De acordo com o jornal Observador, José Sócrates, o principal arguido do processo, vai ser o tema de várias questões dirigidas a Salgado. A relação que tinha com o antigo primeiro-ministro e se conhecida Carlos Santos Silva, o alegado testa-de-ferro de José Sócrates, serão algumas das perguntas da audição desta segunda-feira.
Outra das questão estará relacionada com transferências de 6,7 milhões de euros que Ricardo Salgado terá feito para si mesmo. Tal como explica o Observador, o antigo banqueiro é suspeito de ter desviado fundos do GES para proveito próprio.
Em causa estão duas transferências em 2010 que totalizarão 2 milhões e 750 mil euros para a conta no Credit Suisse aberta em nome da sociedade offshore Savoices (que tem Ricardo Salgado como beneficiário) e uma outra transferência de 4 milhões de euros em 2011 igualmente para a mesma conta Savoices na UBS, na Suíça.
José Sócrates está acusado de 31 crimes de corrupção passiva, falsificação de documentos, fraude fiscal qualificada e branqueamento de capitais no âmbito da Operação Marquês. O ex-presidente do BES é acusado da prática de 21 crimes – um crime de corrupção ativa de titular de cargo público, dois por corrupção ativa, nove por branqueamento de capitais, três por abuso de confiança, três por falsificação de documentos e mais três por fraude fiscal qualificada.
O inquérito, que começou há mais de cinco anos, culminou na acusação a 28 arguidos – 19 pessoas e nove empresas – e está relacionado com a prática de quase duas centenas de crimes económico-financeiros. Os arguidos Henrique Granadeiro, Zeinal Bava, Bárbara Vara, Joaquim Barroca, Helder Bataglia, Rui Mão de Ferro e Gonçalo Ferreira, empresas do grupo Lena (Lena SGPS, LEC SGPS e LEC SA) e a sociedade Vale do Lobo Resort Turísticos de Luxo pediram a abertura de instrução.