As engrenagens da famosa Máquina de Anticítera, considerada o “computador mais antigo do mundo”, não eram precisas. Os erros de fabrico terão levado a que o dispositivo não funcionasse corretamente.
Um estudo recente realizado por investigadores da Universidade Nacional de Mar del Plata, na Argentina, revelou novos pormenores sobre a famosa Máquina de Anticítera, considerado o computador mais antigo do mundo.
O dispositivo, descoberto num naufrágio grego do século I a.C., teria sido utilizado para prever fenómenos astronómicos como eclipses e movimentos planetários.
No entanto, o novo estudo, pré-publicado no arXiv, sugere que a forma triangular das suas engrenagens e os erros de fabrico podem ter comprometido a sua exatidão e até provocado a sua falha.
Assim, nota o Live Science, a máquina pode não ter sido um enigmático dispositivo de medição celestial, mas apenas um brinquedo, propenso a encravar constantemente.
O Máquina de Anticítera é um sistema complexo de engrenagens de bronze cuja função permaneceu um enigma durante mais de 100 anos. Segundo algumas teorias, seria usado para prever o futuro ou como relógio astronómico.
Infelizmente, o dispositivo passou mais de 2000 anos enterrado no fundo do mar, e um período de tempo desconhecido a funcionar antes disso; as suas engrenagens estão muito corroídas e faltam muitas peças.
Embora apenas restem fragmentos, estudos anteriores permitiram reconstruir a sua estrutura e as suas principais funções, como a indicação das posições do Sol e da Lua, as datas dos eclipses e os ciclos calendários. No entanto, a sua exatidão foi sempre objeto de debate entre os especialistas.
Tony Freeth

Ilustração de como a Máquina de Anticítera poderia ter funcionado.
A equipa de investigadores, liderada por Esteban Guillermo Szigety e Gustavo Arenas, centrou-se em dois fatores-chave: a forma triangular dos dentes da engrenagem e os erros de fabrico.
Ao contrário das engrenagens modernas, que têm perfis curvos para um movimento suave, as do Máquina de Anticítera tinham dentes em forma de V, o que causava pequenas acelerações e desacelerações no movimento, introduzindo ligeiras imprecisões.
Utilizando simulações em computador, a equipa confirmou que, em condições ideais (sem erros de fabrico), estes dentes triangulares geravam desvios mínimos nos ponteiros do mecanismo. Por exemplo, o ponteiro lunar apresentava um desvio máximo de apenas 2,5 graus, uma margem aceitável para a época.
No entanto, o verdadeiro problema surgiu quando estes dentes foram combinados com imperfeições no seu fabrico, conta o LBV.
Num estudo anterior, o astrofísico britânico Mike Edmunds, que analisou tomografias computorizadas das engrenagens do dispositivo, identificou dois tipos de falhas: erros aleatórios, pequenos desvios na posição dos dentes; e erros sistemáticos, deslocamentos sinusoidais causados por eixos descentrados ou marcações incorrectas durante o fabrico das engrenagens.
Quando, no novo estudo, estes erros foram simulados no modelo informático, os investigadores verificaram que, embora os desvios nos ponteiros fossem controláveis (semelhantes aos calculados por Edmunds), o mecanismo enfrentava um problema maior: o bloqueio ou o desengate das engrenagens.
O estudo permite concluir que, com os erros de fabrico observados, o mecanismo teria deixado de funcionar após apenas 120 dias de utilização — 1/3 do seu ciclo anual).
Em alguns casos, as engrenagens encravariam completamente, parando todo o sistema. Noutros, as engrenagens desengatavam-se, fazendo com que alguns ponteiros perdessem a sincronização.
Se os erros fossem tão grandes como os medidos por Edmunds, o mecanismo não teria sido funcional, explicam os investigadores. Ou nunca funcionou, ou os erros originais eram menores e pioraram após 2.000 anos no fundo do mar.
Esta investigação apoia uma teoria anterior de Edmunds: o mecanismo pode ter sido mais um instrumento pedagógico do que uma ferramenta para cálculos astronómicos precisos. Embora as suas previsões não fossem perfeitas, teriam sido suficientes para ensinar conceitos celestes.