A vitória histórica dos nacionalistas do Sinn Féin é o sinal de uma reviravolta na política da Irlanda do Norte — e já se fala num possível referendo à reunificação com a República da Irlanda.
Pela primeira vez em 101 anos, o Sinn Féin pôde celebrar a vitória nas eleições na Irlanda do Norte. O partido nacionalista que era o braço político do IRA vai assim ter a maioria do parlamento e poderá apontar a vice-presidente partidária, Michelle O’Neill, ao cargo de primeira-ministra.
O partido conseguiu 27 dos 90 lugares do parlamento. O Partido Unionista Democrático (DUP), que historicamente governa esta nação que integra o Reino Unido ficou em segundo lugar, com 24 deputados.
Outra das surpresas da noite vai para o Partido da Aliança, centrista e com tendência liberal. O partido não se assume nem nacionalista nem unionista e duplicou a sua representação parlamentar, elegendo 17 deputados.
“Hoje é o início de uma nova era. Independentemente das origens religiosas, políticas ou sociais, o meu compromisso é fazer a política funcionar”, prometeu a líder do Sinn Féin, que pode vir a ser a primeira católica ao leme da Irlanda do Norte.
A vitória do Sinn Féin é particularmente importante dado o contexto histórico. Fundada em 1921, a Irlanda do Norte foi palco de uma violenta guerra civil conhecida como The Troubles entre os republicanos do IRA, que queriam a reunificação com a República da Irlanda, e os unionistas, que defendiam a permanência no Reino Unido.
A religião foi também um grande ponto de contenção no conflito que matou mais de 3000 pessoas, com os republicanos a serem maioritariamente católicos enquanto que os unionistas eram protestantes.
O conflito chegou ao fim com o Acordo de Sexta-Feira Santa (1998), acordo esse que foi também uma das grandes dores de cabeça nas negociações do Brexit, devido ao receio de que o regresso de uma fronteira dura entre a Irlanda do Norte e a República da Irlanda reacendesse o conflito.
Referendo à reunificação à vista?
Dado que a unificação da Irlanda do Norte com a República da Irlanda é a maior bandeira política do Sinn Féin, esta vitória despoletou especulações sobre um possível referendo.
Mas o primeiro-ministro da República da Irlanda, Leo Varadkar, não acredita que uma reunificação esteja à vista e acha que a vitória do Sinn Féin “não aproxima necessariamente” o país de um referendo sobre esta questão, especialmente tendo em conta que o partido terá de negociar com o DUP para governar.
Para além disto, a nomeação de O’Neill ainda não é certa, já que o DUP tem de concordar com a escolha e apontar um vice-ministro-chefe — no sistema da Irlanda do Norte, estes cargos têm de ser partilhados entre os partidos mais votados e o poder dos dois é equivalente.
A Lei da Irlanda do Norte de 1998, que foi criada depois da assinatura do Acordo de Sexta-feira Santa, também estabeleceu que a Irlanda do Norte ficaria no Reino Unido e que não sairá “sem a aprovação da maioria do povo da Irlanda do Norte“.
A legislação determina ainda que o Secretariado da Irlanda do Norte em Londres tem de concordar com a convocação de um referendo se a opinião pública parecer favorável à reunificação das Irlandas, relata a BBC.
Este factor é um trunfo para os nacionalistas, que podem argumentar que a vitória do Sinn Féin reflecte uma tendência crescente na população para o apoio à reunificação. Apesar disto, as sondagens mostram ainda que a maioria dos irlandeses do norte quer continuar no Reino Unido.
Por causa destes obstáculos, é provável que, por enquanto, a vitória do Sinn Féin seja simbólica e que um referendo ainda não esteja para vir.