Números que enganam, Livre, ADN e Paços de Ferreira: 16 destaques e números das eleições

Manuel Almeida / EPA

A maioria dos maiores partidos quase manteve o número de votos mas há vários aspectos a salientar. AD ganhou, mas afinal…

Daqui a uns anos, quando os autores dos livros de História quiserem escrever sobre as eleições legislativas de 10 de Março de 2024, vão ter dificuldades em escolher por onde começar.

O dia virou o panorama político em Portugal, com viragem à direita. Margem escassa para a vencedora AD, mas maioria clara à direita, já que o Chega passou a ter quase 50 deputados; com uma bronca já esperada pelo meio.

Escolhemos alguns destaques ou números deste dia histórico.

Abstenção
33,77%. Esta foi provavelmente a primeira surpresa do dia. Num domingo repleto de chuva e vento, por vezes fortes, 66,23% dos eleitores votaram e a abstenção foi muito mais baixa do que muitos pensariam. Aliás, foi a taxa de abstenção mais baixa do século XXI. Desde 1995 que não se verificava um número tão alto de votantes: em cada três portugueses, dois votaram. Não é normal por cá.

Palmas para Braga e Porto
Foi a Norte que se registou a maior adesão às urnas: 71,31% foram votar em Braga, 70,05% no Porto. A única abstenção maior do que 50% foi nos Açores, onde apenas votaram 46,19% dos eleitores.

Equilíbrio nunca visto
AD com 29,52% e 79 deputados eleitos, PS com 28,66 % e 77 deputados. Só 50 mil votos de diferença, no meio de 6 milhões. Nunca a margem foi tão curta em legislativas em Portugal. É ainda mais escassa do que a diferença de 2,4 pontos percentuais em 2002, quando o PSD de Durão Barroso (40,21%) venceu o PS de Ferro Rodrigues (37,79%) com mais 130 mil votos.

11-8
11 círculos eleitorais para AD, 8 para PS. O Chega ganhou pela primeira vez num distrito: foi em Faro. Aliás, desde 1995, PS ou PSD venciam em todos os círculos eleitorais; a última excepção foi a CDU, em Beja, em 1991.

PS à frente nos resultados oficiais?
Quem espreita os resultados oficiais, pode ficar confuso. Os números publicados pelo Ministério da Administração Interna colocam o PS no primeiro lugar, com mais um deputado e com mais 2 mil votos do que a AD. Mas, mais abaixo, está a coligação de direita na Madeira, que só tinha PSD e CDS, deixando de fora o PPM – por isso tinha de ficar numa linha diferente. O resultado na Madeira coloca a coligação de direita na frente, a nível nacional.

AD ganha mas afinal…
…não teve muitos mais votos do que em 2022. Há dois anos, PSD, CDS e PPM juntos tiveram menos 146 mil votos do que na noite passada. Tinham sido 76 deputados e agora vai em 79 – em território nacional, reforçamos.

CDS
Esta coligação, devido ao método d’Hondt, serviu essencialmente para recuperar o CDS-PP, que estará de volta à Assembleia da República. Em números absolutos, em consequências práticas, melhorou muito pouco o panorama do PSD.

Queda do PS
Depois da maioria absoluta, uma queda absoluta. O PS perdeu para já quase 500 mil votos e deixou de ser a força política mais votada. De 117 deputados passa para 77, talvez 79 no máximo.

Na Madeira, quem caiu foi o PS
As últimas semanas foram complicadas para o PSD na Madeira, com a demissão de Miguel Albuquerque por ser suspeito de crimes. Mas a coligação PSD/CDS teve mais 2 mil votos do que em 2022 e manteve 3 deputados, enquanto quem caiu (muito) foi o PS, com menos 10 mil votos e com a perda de um deputado para o Chega.

Reviravolta nos Açores
A maior reviravolta entre os dois maiores partidos terá sido mesmo nos Açores. Poucas semanas depois de derrota histórica nas regionais, novo tombo para o PS: de 43% para 29%, perda de um deputado para o Chega e viu a AD ganhar – passou de 34% para quase 40%, mantendo os 2 deputados (o mesmo número absoluto do PS).

Subida do Chega
Quadriplicou o número de deputados. Não no número de votos – aí não chegou ao triplo – mas passa de 12 para 48 deputados. Ultrapassou 1 milhão de votos; a última vez que um terceiro partido tinha feito isso foi em 1985, na altura o PRD.

CDU só perde 30 mil votos mas…
…novamente por causa do método d’Hondt, passa de 6 para 4 deputados. Por causa dos círculos eleitorais onde perdeu deputados – em Beja, onde já foi “rei”, pela primeira vez não conseguiu qualquer eleição. Os comunistas estão num fundo histórico.

Livre = Chega
4 deputados, grupo parlamentar do Livre pela primeira vez. Terá superado as expectativas do próprio Rui Tavares: de 69 mil para 200 mil votos. Em termos de escala, foi praticamente o mesmo do Chega: quadriplicar deputados, triplicar número de votos. Mas num patamar inferior.

Manutenção geral
De resto, os principais partidos não alteraram quase nada o que tinham: IL continua com 8 deputados, BE com 5, PAN com 1 e mesmo a CDU teve quase o mesmo número de votos. O JPP quase duplicou o número de votos (a maioria na Madeira) mas não chegou para eleger um deputado.

ADN
Não foi surpresa aqui no ZAP: o ADN aproveitou o facto de ter uma sigla muito semelhante à AD e passou de 11 mil para 100 mil votos. Quase 10 vezes mais do que em 2022. O Paços de Ferreira brincou com isso (alegou que FCPF é quase igual a FCP e que muitos adeptos do FC Porto queriam, na verdade, ser adeptos do Paços de Ferreira). Mas a AD não achou muita piada ao que se passou nas eleições, já que terá perdido dois deputados (Viseu e Lisboa) e dezenas de milhares de votos por causa desta confusão generalizada.

Comentadores quase repetiam erro
Ao longo da semana passada era frequente o discurso: “a AD vai ganhar confortavelmente”, “veremos como será o Governo de direita”, “só falta saber por quantos o PS vai perder” – e quase se repetia a lição de 2022, quando ninguém previa a maioria absoluta do PS, entre sondagens e comentários, mas aconteceu mesmo. Desta vez o PS esteve muito perto de dar (ainda mais) a volta aos prognósticos e vencer.

Nuno Teixeira da Silva, ZAP //

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