O Japão começou uma batalha para salvar crianças do turismo sexual

A embaixada do Japão no Laos e o seu Ministério dos Negócios Estrangeiros emitiram um aviso invulgarmente direto, alertando os homens japoneses contra a “compra de sexo a crianças”. Foi uma mudança de rumo no reconhecimento público do envolvimento de homens japoneses no turismo sexual infantil.

A mudança de rumo foi desencadeada por Ayako Iwatake, proprietária de um restaurante em Vientiane, que alegadamente viu publicações nas redes sociais de homens japoneses a gabarem-se da prostituição infantil. Em resposta, lançou uma petição apelando à ação do governo.

O boletim em língua japonesa esclarece que este tipo de conduta é passível de ação judicial, tanto ao abrigo da legislação do Laos como da lei japonesa sobre prostituição e pornografia infantil, que se aplica extraterritorialmente.

Esta declaração diplomática não foi apenas um aviso legal. Foi um raro reconhecimento público do alegado envolvimento de homens japoneses no turismo sexual transnacional de crianças, particularmente no Sudeste Asiático.

É também um momento que exige que se olhe para além dos atos criminosos individuais ou de qualquer nação e que se considerem as desigualdades históricas, raciais e estruturais que tornam possível essa mobilidade e exploração.

Um mapa de exploração em mutação

Vender e comprar sexo na Ásia não é novidade. Os contornos foram-se alterando ao longo do tempo, mas o sentimento subjacente manteve-se constante: algumas vidas são baratas e mercantilizadas e algumas carteiras são profundas e compram-nas.

Como relata um artigo do The Conversation, o envolvimento do Japão na prostituição no estrangeiro remonta ao período Meiji (1868-1912).

As jovens das regiões rurais empobrecidas (conhecidas como karayuki-san) emigravam para o estrangeiro – frequentemente para o Sudeste Asiático – para trabalhar na indústria do sexo, desde as cidades portuárias da Malásia até aos bordéis da China e das ilhas do Pacífico.

Se outrora a pobreza empurrava as mulheres japonesas para o estrangeiro para venderem os seus corpos, na segunda metade do século XX – alimentada pelo boom económico do Japão do pós-guerra – foram os homens japoneses ricos que começaram a viajar para o estrangeiro para comprar sexo.

Por volta da década de 2000, a dinâmica inverteu-se novamente. Na Coreia do Sul, atualmente uma economia desenvolvida, os homens viajaram para o Sudeste Asiático – e mais tarde para países como a Rússia e o Uzbequistão – seguindo rotas outrora percorridas por homens japoneses.

Mais tarde, no mesmo período, o fluxo tomou um rumo ainda mais sombrio.

Os homens japoneses e sul-coreanos começaram a emergir como os principais compradores de sexo infantil no estrangeiro, nomeadamente no Sudeste Asiático, nas ilhas do Pacífico e até na Mongólia.

De acordo com o Departamento de Estado dos EUA, os homens japoneses continuaram a ser “uma fonte significativa de procura de turismo sexual”, enquanto os homens sul-coreanos continuaram a ser “uma fonte de procura de turismo sexual infantil”.

O Gabinete das Nações Unidas contra a Droga e o Crime e outras organizações também assinalaram os dois países como principais contribuintes para a exploração sexual de crianças na região.

O papel do Japão no comércio sexual

Uma mudança mais recente e preocupante parece estar a desenrolar-se no Japão.

Num contexto de estagnação económica e de desvalorização do iene, Tóquio tornou-se um destino para o turismo sexual. As organizações de proteção dos jovens observaram um aumento notável de clientes estrangeiros do sexo masculino, sobretudo chineses, que frequentam áreas onde as adolescentes e as jovens praticam sexo de sobrevivência.

O que une estes movimentos não são apenas crenças culturalmente específicas, como a fetichização da virgindade ou a superstição de que o sexo com raparigas jovens traz boa sorte nos negócios, mas sim o poder.

A batalha para proteger as crianças

A campanha global para acabar com o turismo sexual infantil começou a sério com a fundação da ECPAT (uma rede global de organizações que procura acabar com a exploração sexual de crianças) em 1990, para fazer face à crescente exploração de crianças no Sudeste Asiático.

Os compradores, especialmente os estrangeiros, conseguem muitas vezes escapar às consequências.

No entanto, no início de 2025, a Agência Nacional de Polícia do Japão prendeu 111 pessoas – incluindo professores do ensino secundário e tutores – numa ação de repressão a nível nacional contra a exploração sexual de crianças em linha, conduzida em coordenação com parceiros internacionais.

A importância da nova batalha

O choque em torno das revelações sobre o Laos e a resposta invulgarmente direta das autoridades japonesas oferecem uma rara oportunidade para confrontar os sistemas mais profundos em funcionamento.

O turismo sexual não acontece num vácuo. É possibilitado pelo desenvolvimento desigual, pela mobilidade transnacional, pela fraca regulamentação e pelo silêncio social. Mas este momento também mostra que o ativismo popular pode forçar a ação institucional.

O aviso oficial do Japão não foi despoletado por uma auditoria governamental ou por um escândalo diplomático.

Surgiu porque Ayako Iwatake viu nas redes sociais publicações de homens japoneses que se gabavam de comprar sexo a crianças e recusou-se a desviar o olhar.

Quando entregou a petição à embaixada, esta respondeu rapidamente. Menos de dez dias depois, o Ministério dos Negócios Estrangeiros emitiu um aviso público, descrevendo claramente as consequências legais dos crimes sexuais contra crianças cometidos no estrangeiro.

A ação de Iwatake é um lembrete: não é preciso um governo para expor um sistema. É preciso alguém disposto a falar – mesmo quando é incómodo.

É louvável que o Japão tenha agido rapidamente. Mas só um aviso não é suficiente. O Japão deve reforçar e alargar a sua cooperação internacional para combater estes crimes hediondos.

Um modelo mais decisivo pode ser visto num caso recente no Vietname, onde as autoridades americanas se infiltraram pela primeira vez numa rede de abuso sexual de crianças transmitida em direto naquele país. Trabalhando sob disfarce durante meses, coordenaram com as autoridades vietnamitas a detenção de uma mãe que abusava sexualmente da sua filha a pedido de espetadores pagantes no estrangeiro.

O salvamento da vítima de nove anos mostrou o que é uma intervenção transfronteiriça séria.

Mas para cada escândalo que faz manchete, há centenas de histórias por contar.

O caso do Laos deveria ser o início de uma reflexão mais alargada sobre a forma como o sexo, o dinheiro e o poder atravessam as fronteiras – e quem paga o preço.

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