Um novo documento que atualiza o de 2013 aponta as principais debilidades do país, desde as telecomunicações aos heliportos e armazenamento de energia.
O novo Plano Nacional de Emergência de Protecção Civil (PNEPC), em consulta pública até 10 de Fevereiro, revela que em Portugal ainda há locais, nomeadamente estradas, onde o serviço de voz falha e a transmissão de dados está indisponível.
Segundo o Público, para os profissionais que prestam socorro, como é o caso dos Técnicos de Emergência Pré-Hospitalar (TEPH) do INEM, por exemplo, esta falha pode colocar em causa a assistência a eventuais vítimas.
O PNEPC, cuja última versão foi revista em 2013, é um instrumento importante para a segurança coletiva, como suporte indispensável para as operações de proteção civil, caso ocorra um acidente grave ou catástrofe.
Além de definir as responsabilidades de cada entidade no âmbito da emergência de proteção civil e a forma como cada uma se deve articular, o documento faz um levantamento exaustivo das infraestruturas de relevância operacional e das suas vulnerabilidades, nomeadamente da rede rodoviária, ferroviária, de transportes aéreos e marítimos, assim como da rede de telecomunicações.
Uma das principais fragilidades das infraestruturas do território português continental diz respeito às redes móveis de telecomunicações.
“Nos eixos rodoviários a cobertura é inferior, mas com poucas falhas para serviços de voz, cenário que se altera relativamente à transmissão de dados, ocorrendo vários troços onde o serviço se encontra indisponível”, lê-se no documento que admite ainda “uma ampla cobertura na maioria das localidades”.
As comunicações de emergência a nível nacional podem utilizar ainda a Rede Estratégica de Proteção Civil (REPC), a Rede Operacional dos Bombeiros (ROB), o Sistema Integrado de Redes de Emergência e Segurança de Portugal (SIRESP) e a Rede Estratégica da Autoridade Marítima (REAM).
Relativamente ao SIRESP, este sistema revelou várias falhas nos graves incêndios de 2017, como foi o exemplo de Pedrógão Grande, com mais de 60 pessoas mortas.
O novo PNEPC sublinha que “embora o SIRESP constitua uma importante infraestrutura de comunicações a ser utilizada em caso de acidente grave ou catástrofe, o facto é que a resiliência do sistema de comunicações deverá compreender a possibilidade de recorrer a outros meios disponíveis caso tal se verifique ser útil”.
Rui Lázaro, presidente do Sindicato dos Técnicos de Emergência Pré-Hospitalar (STEPH), lamenta que ainda existam estas falhas ao nível da comunicação, mas explica que, infelizmente “a existência de zonas cinzentas, onde não há nem cobertura de rede móvel, nem de voz, é uma realidade”.
“Em situações graves com mais do que uma vítima, nomeadamente em estradas, a indisponibilidade de dados pode ser um problema”, sublinha, acrescentando que, “o SIRESP permite comunicar informação de status, ou seja, se já estamos junto à vítima e se, por exemplo, já vamos a caminho do hospital”.
O dirigente acrescenta que “se chegamos a um local e o acidente é mais grave do que o previsto inicialmente, sem dados não conseguimos chamar mais apoio“.
“Podemos usar as comunicações móveis, mas a nossa rede é fornecida por uma operadora em específico. As operadoras de telecomunicações nem sempre cobrem todas as áreas. Se essa operadora não tiver cobertura naquela zona não conseguimos”, realça.
Além da falha na rede de comunicações, o novo PNEPC também destaca outra fragilidade, ao nível da rede transporte aéreo.
Segundo o novo documento, a rede aérea nacional integra quatro aeroportos, Humberto Delgado, Francisco Sá Carneiro, Faro e Beja, 27 aeródromos, 48 heliportos, 24 pistas ultraligeiras e 42 centros de meios aéreos.
O problema está nos heliportos que constituem um risco. O documento explica que “alguns heliportos localizados em cidades encontram-se rodeados por vários obstáculos que dificultam as manobras de aproximação e descolagem e, além disso, existem equipamentos desadequados ao nível da comunicação, navegação, vigilância e segurança”.
Outra fragilidade que o PNEPC sublinha está ao nível dos sistemas de produção, armazenamento e distribuição de energia elétrica e combustíveis.
“Portugal caracteriza-se por ainda possuir escassos recursos energéticos próprios, nomeadamente, aqueles que asseguram a generalidade das necessidades energéticas da maioria dos países desenvolvidos (petróleo e gás)”, lê-se.
Segundo o novo PNEPC, “desta escassez resulta uma elevada dependência energética do exterior, encontrando-se totalmente dependente das importações de fontes primárias de origem fóssil, quer para consumo directo, quer para produção de energia elétrica consumida no país”.
Acrescenta ainda que “a produção de energia elétrica proveniente de fontes renováveis (hídricos, vento e solar) tem vindo a crescer de forma muito expressiva ao longo dos últimos anos, mas que também está fortemente dependente das condições meteorológicas”.
Uma fonte do gabinete de comunicação da Autoridade Nacional de Emergência e Protecção Civil (ANEPC) explicou ao Público que o PNEPC “é o documento formal no qual se exprime a intenção relativamente ao modo como se pretende que atuem os vários organismos, serviços e estruturas empenhados numa operação de proteção civil, face aos riscos existentes em Portugal continental”,
O documento, segundo a mesma fonte, já carecia de atualização, uma vez que o que está em vigor “foi aprovado em 2013”.
A fonte realça ainda que “a experiência colhida nos últimos anos, quer em exercícios operacionais (caso do Cascade’19), quer quanto às lições identificadas na gestão da situação pandémica causada pela covid-19 também permitiu identificar hipóteses de melhoria no documento, por forma a garantir o estabelecimento de condições para uma melhoria da eficiência e eficácia dos serviços e agentes de proteção civil”.
A fonte da ANEPC destacou, entre as várias alterações do PNEC, o facto de terem sido agora integradas entidades que, até à data do plano atualmente vigente, ainda não existiam ou não foram identificadas na altura como pertinentes.
“É o caso, por exemplo, da Agência para a Gestão Integrada de Fogos Rurais (que veio a ser criada após os incêndios de 2017) ou a Entidade Nacional para o Setor Energético (cujo contributo aquando das crises de combustíveis em 2019 permitiu identificar a pertinência da sua consideração no PNEPC)”, refere.
Para além disso, também se atualizaram as responsabilidades das diferentes entidades. As alterações ao quadro de responsabilidades resultam “de alterações dos respetivos enquadramentos legais”.
Um exemplo é o caso de várias entidades da Administração Central do Estado que, desde 2013, sofreram mudanças nas suas leis orgânicas.
As atualizações deram-se tendo também em conta a “experiência entretanto adquirida em exercícios e emergências concretas.
Por exemplo, no Instituto Português do Mar e da Atmosfera, passou a ficar plasmada no PNEPC a competência de “emitir alertas precoces de tsunamis”.