O ministro do Planeamento, Nelson Souza, garantiu na segunda-feira, em Lisboa, que a verba de fundos europeus que estava destinada à linha circular do metro de Lisboa não ficará por utilizar. No entanto, o Ministério vem agora vincar que, com os termos do acordo estabelecidos, “esse eventual projeto alternativo já não será exequível”.
“No nosso entender, a decisão ainda vai ser contestada, mas em caso de não possibilidade de utilização no POSEUR [Programa Operacional Sustentabilidade e Eficiência no Uso de Recursos] hão de haver soluções para a alocação da verba em qualquer outro projeto ou programa do Portugal 2020”, avançou Nelson de Souza aos jornalistas, durante a cerimónia de apresentação da Bolsa de Recuperação.
Assim, “esses dinheiros não ficarão por utilizar até 2023”, garantiu o ministro, acrescentando que os quatro anos que faltam para a execução do orçamento dos programas operacionais permitirão que situações deste tipo não prejudiquem o objetivo do Governo de utilizar as verbas a 100%.
Conforme estipulado pela Comissão Europeia, o Portugal 2020 está sujeito à regra n+3, o que significa que, apesar de o prazo de vigência dos programas ser apenas até ao final de 2020, o orçamento pode ser executado até três anos depois. Esta regra, conhecida como “guilhotina financeira”, estabelece ainda níveis que, a não serem cumpridos no final de cada ano, representam a perda de fundos.
De acordo com o Observador, as declarações do ministro do Planeamento contradizem Matos Fernandes, ministro do Ambiente, que tinha dramatizado a questão. “Não estamos a falar do adiamento da obra por um ano, mas sim por três anos — isto significa perder 83 milhões de euros em fundos comunitários, que dificilmente poderão ser realocados”, afirmou Matos Fernandes.
No entanto, esta terça-feira, o ministro do Planeamento esclareceu, num comunicado enviado à TSF, que o Metropolitano de Lisboa não poderá contar com apoios dos fundos europeus do Portugal 2020, uma vez que se trata de um quadro financeiro que está em vigor e cuja execução se pode estender até 2023.
Nelson de Souza clarifica que essas verbas não podem ser canalizadas para outro projeto “no PT 2020 por qualquer outro relacionado com a rede de metropolitano da cidade ou de natureza equivalente”.
Nelson de Souza alega ainda que há uma “dificuldade adicional” para o país em relação à negociação de fundos comunitários. O Ministério refere que, se as propostas de alteração ao OE2020 que suspendem as obras para a extensão da rede do Metropolitano de Lisboa forem aprovadas, fica em causa o objetivo de “apoiar a transição para uma economia com baixas emissões de carbono”, prevista no quadro de fundos comunitários. Caso o pedido de suscitar inconstitucionalidade por parte do PS não resultar, estas verbas poderão mesmo perder o efeito a que foram alocadas.
Em 4 de fevereiro, foi suspenso o projeto de construção da linha circular do Metro de Lisboa, segundo uma proposta de alteração do PAN aprovada no parlamento durante a votação do Orçamento do Estado para 2020 (OE2020). A iniciativa do PAN obteve os votos favoráveis do PSD, BE, PCP e Chega, os votos contra do PS e da Iniciativa Liberal e a abstenção do CDS.
Na mesma altura, a proposta do PCP que defende que seja dada prioridade à estação da rede metropolitana até Loures, bem como para Alcântara e zona ocidental de Lisboa, foi aprovada com votos a favor do PSD, BE, PCP, CDS, PAN e Chega, a abstenção da Iniciativa Liberal e o voto contra do PS.
Com uma dotação global de cerca de 26 mil milhões de euros, o programa Portugal 2020 consiste num acordo de parceria entre Portugal e a Comissão Europeia, “no qual se estabelecem os princípios e as prioridades de programação para a política de desenvolvimento económico, social e territorial de Portugal, entre 2014 e 2020”. Os primeiros concursos do programa PT 2020 foram abertos em 2015.
Engenheiros avisaram que obra era um erro
Em declarações à TSF, a Ordem dos Engenheiros lamentou que tenha sido preciso passar tanto tempo até se perceber que o projeto da linha circular do Metro de Lisboa é um erro.
A Ordem dos Engenheiros, através da comissão especializada em transportes, foi uma das entidades que em 2018, na consulta pública do estudo de impacto ambiental da obra, avisou que não fazia sentido abandonar a extensão a Alcântara, “caminho” que agora a maioria dos deputados na Assembleia da República exige que seja estudado para se perceber se será melhor que a linha circular.
O bastonário, Carlos Mineiro Aires, que também já foi presidente do Metropolitano de Lisboa, disse à TSF que todos os argumentos se mantêm atuais, nomeadamente aquele que dizia que a linha circular definida pelo Governo “nunca” tinha sido analisada.
A posição da Ordem afirma que “desprezou-se o que antes tinha sido apresentado como a estratégia de desenvolvimento da rede”. “Eu próprio fui presidente do Metropolitano de Lisboa e foi uma surpresa esta opção de não estender a rede para o lado Ocidental da cidade. De todos os estudos nunca esta opção da linha circular esteve em cima da mesa”, refere Carlos Mineiro Aires.
O bastonário dos engenheiros lamentou que nunca tenha estado em discussão pública o plano estratégico de desenvolvimento do metro. Agora, “como diz o povo, temos aqui um molho de brócolos” com a decisão dos deputados, referiu.
ZAP // Lusa