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Investir 360 milhões para vender por 75. Oposição quer CPI ao negócio “ruinoso” da Efacec

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Paulo Cunha / Lusa

Ministro da Economia, António Costa e Silva

A reprivatização da Efacec, com a venda ao Fundo alemão Mutares, gera críticas na oposição que quer realizar uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) a um negócio que considera “ruinoso” para o Estado.

A reprivatização de 71,73% do capital da Efacec, a participação que pertencia à empresária angolana Isabel dos Santos e que foi nacionalizada em Julho de 2020, foi anunciada neste 1 de Novembro, Dia de Todos os Santos. Mas o negócio está longe de estar abençoado!

Após o investimento feito pelo Estado para salvar a empresa, da ordem dos 360 milhões de euros, a venda ao Fundo Mutares por 15 milhões de euros, mais 60 milhões em garantias a cinco anos, gera indignação pela desproporcionalidade dos valores investidos por cada uma das partes.

Os bancos também entraram com garantias de quase 100 milhões depois de terem assumido perdas de 29 milhões com a Efacec.

Por tudo isto, soam os alarmes entre a oposição ao Governo enquanto se vai sublinhando que o Mutares, Fundo constituído por 32 empresas industriais, fez um grande negócio.

CPI ao negócio Efacec nas mãos do PSD

A Iniciativa Liberal (IL) e o Chega já avançaram com requerimentos a propor uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) a todo o processo – desde a nacionalização à reprivatização com a venda ao Mutares.

PSD e Bloco de Esquerda admitem votar favoravelmente a estes pedidos. Mas, na verdade, a possibilidade de a CPI avançar está nas mãos do PSD que pode avançar com um inquérito potestativo, pedindo unilateralmente essa Comissão, para contornar um eventual voto contra da maioria do PS no Parlamento.

O líder do PSD, Luís Montenegro, assumiu já que o partido pode avançar com esta iniciativa, caso o primeiro-ministro e “todo o Governo” não apresentem “esclarecimentos cabais” sobre um negócio que define como “ruinoso”.

“António Costa e o PS andam a brincar com o dinheiro dos contribuintes”, acusou ainda Montenegro.

Para já, o PSD vai requerer a presença urgente do ministro da Economia, António Costa Silva, no Parlamento para prestar contas sobre a venda da Efacec ao Fundo alemão.

“O Governo não disse toda a verdade” sobre este processo, entende o líder do grupo parlamentar do PSD, Joaquim Miranda Sarmento, em declarações à Lusa.

O deputado nota que as condições de venda anunciadas demonstram que “a empresa tinha problemas graves” e que a justificação do Governo para a nacionalização, com os problemas de ‘compliance’ e da accionista Isabel dos Santos, não explicam encargos desta dimensão para o Estado.

Chega tenta suspender a venda

O líder da IL, Rui Rocha, desafia o PS a viabilizar a CPI solicitada pelo seu partido, em entrevista à TSF e ao Diário de Notícias. Mas caso o PS vote contra, o também deputado deixa “um desafio ao PSD” porque tem “a possibilidade de avançar com uma Comissão de Inquérito potestativa”.

Assim, Rocha envia um recado a Montenegro, frisando que o PSD não se pode “acobardar neste tema” e que deve “usar os meios que tem ao seu dispor para que os portugueses possam ser esclarecidos”.

Entretanto, o Chega vai entregar em tribunal uma providência cautelar “para suspender a venda” da Efacec “até que haja informação sobre a salvaguarda dos trabalhadores, informação financeira em torno do negócio e garantias da gestão futura da empresa”, realçou o líder do partido, André Ventura, em declarações no Parlamento.

Efacec é “antecâmara” do que vai acontecer na TAP?

Do lado do PCP, o secretário-geral Paulo Raimundo considera que a o processo de privatização da Efacec é “tão evidente” que não justifica uma CPI para “perder tempo”.

O dirigente do PCP sublinha que na última CPI à TAP, discutiu-se “tudo e um par de botas” menos o negócio de privatização em si, salientando que vai acontecer o mesmo com uma iniciativa semelhante para a Efacec.

Há outros entretenimentos que valem mais a pena“, diz ainda com ironia, referindo que o caso Efacec é um “crime económico que está em curso”, e é “tão evidente e simples” que não há “necessidades de grandes investigações”.

Paulo Raimundo diz ainda que este é um “filme que já se viu”, em que o Governo investe numa empresa – que “está limpa, tem contratos, está regularizada, capitalizada e é das mais importantes a nível mundial no seu sector” – e a “dá a um grupo alemão”.

O Governo “investe, limpa e capitaliza a empresa, e depois pega nela e entrega-a de mão beijada a um investidor alemão, que compra a empresa com o dinheiro da empresa”, destaca o líder do PCP, referindo que é o mesmo negócio que foi feito na TAP.

“É extraordinário. Se eu tivesse 60 milhões de euros, para dar como caução, eu também comprava a empresa. Assim é fácil: com o dinheiro dos outros, é fácil“, refere.

A maior preocupação de Paulo Raimundo, segundo diz, é saber se a privatização da Efacec “não é uma antecâmara do negócio que se quer fazer para a TAP“.

Contudo, o líder do PCP realça que ainda acredita que “é possível combater a privatização da TAP” e que “é possível parar este estrondoso crime económico”.

Salvar Efacec custou 513 milhões de euros

A Efacec actua nos setores da energia, engenharia e mobilidade e tem cerca de 2.000 trabalhadores.

A nacionalização da empresa ocorreu na sequência do arresto judicial de bens de Isabel dos Santos, que detinha a maioria do capital da Efacec.

A reprivatização surge numa altura em que a empresa estava à beira da falência, com o Estado a injectar, todos os meses, 10 milhões de euros para garantir a sua sobrevivência.

Mas, no total, somando todas as perdas assumidas pelo Estado, pelos credores, incluindo a banca, e pelos accionistas, salvar a Efacec custou 513 milhões de euros, segundo dados adiantados pelo ministro da Economia e pelo secretário de Estado das Finanças, João Nuno Mendes, em conferência de imprensa.

Deste valor, 309 milhões respeitam a perdas de capital dos accionistas, a José de Mello e a TMG.

Os obrigacionistas perdoaram 6 milhões de euros dos 58 milhões que teriam a receber em Julho de 2024. E a banca assumiu perdas de 29 milhões de euros com a empresa.

Já o Estado injectou na Efacec 200 milhões de euros em suprimentos, mas vai colocar ainda mais 160 milhões de euros na empresa, sendo que destes, 30 milhões são para indemnizações por atrasos e incumprimentos de contratos. O ministro da Economia sublinha que o Estado ainda espera recuperar uma fatia destes 160 milhões.

Entretanto, o Banco de Fomento (BdF) vai emprestar 35 milhões de euros à Efacec através da emissão de obrigações convertíveis em acções, a uma taxa de 6% a pagar pela empresa. Se a empresa não conseguir pagar, o BdF fica com acções.

Nos próximos três anos, a Mutares não pode vender a Efacec e, depois disso, se o fizer, terá que pagar 75% do valor da venda ao Estado português. O Estado também terá direito a receber dividendos, caso estes existam.

ZAP // Lusa

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