Miguel Duarte que, juntamente com outros ativistas, estava a ser acusado pela justiça italiana de ajuda à imigração ilegal, foi “ilibado”, mas “o caso segue para tribunal com uma acusação aos restantes membros”.
A revelação foi feita pelo próprio Miguel Duarte no Facebook esta quarta-feira.
“A investigação contra nós acabou. Mas não foi feita justiça”, escereveu o jovem português que trabalhou como voluntário na ONG alemã Jugend Rettet, em missões de resgate de migrantes e refugiados no Mediterrâneo, e que, em 2018, foi constituído arguido por suspeita de auxílio à imigração ilegal por parte das autoridades italianas.
“A procuradoria de Trapani concluiu a investigação criminal sobre a tripulação do Iuventa. Eu e alguns outros fomos ilibados, mas o caso segue para tribunal com uma acusação aos restantes membros por auxílio à imigração ilegal. Um peso enorme saiu dos meus ombros. No final de contas, não vou ter de enfrentar anos de julgamento e a possibilidade de ser preso por um crime que não cometi”, revelou.
Quanto aos restantes “camaradas”, “se eles são culpados eu também sou. Tudo o que eles fizeram, eu fiz também ou teria feito no seu lugar. Quis apenas o acaso que nós 10 fôssemos constituídos arguidos, e quis apenas o acaso que os meus colegas e amigos constassem da lista negra do procurador em vez de mim e de tantos outros”.
“Mas não somos culpados”, disse, acrescentando que “culpada é esta vil Europa que mata e deixa morrer. Só no ano passado, mais de oito mil pessoas foram ilegalmente levadas de volta para a Líbia para o meio de uma guerra civil que não tem fim. Ao mesmo tempo, afogaram-se 10 pessoas por semana ao tentar atravessar o mar em busca de segurança”.
Para o jovem, os “líderes europeus” são os culpados. “Acuso-os de perverterem o discurso político para permitir que isto continue. Acuso-os de participarem na morte de cada uma dos milhares de pessoas que encontraram o seu destino final na fronteira mais mortal do mundo. A acusação está feita e será a História a julgá-los quando a próxima geração nos perguntar porque escolhemos deixar morrer 20 mil pessoas em 7 anos”.
“Isto não é propriamente uma vitória”
Em declarações ao semanário Expresso, Miguel Duarte explicou que o facto de ter sido ilibado “não é uma vitória”.
“Isto não é propriamente uma vitória. Eu fui ilibado mas quatro outras pessoas da minha tripulação foram acusadas”, disse. “Continua um mistério a razão pela qual estas pessoas foram acusadas e as outras não. Na organização quem fazia o resgate marítimo eram sempre voluntários – como eu -, que subiam a bordo e tomavam diferentes funções”.
“Não foi feita justiça. Os trabalhadores humanitários continuam a ser acusados. Os meus colegas e amigos vão ter de estar vários anos, presumivelmente, a ser julgados por um crime que não cometeram”, defendeu Miguel Duarte, em entrevista ao jornal Público.
Se forem condenados, os membros acusado podem enfrentar uma pena de 20 anos de prisão.
Miguel Duarte juntou-se à Jugen Rettet em 2016 e foi em missão para o Mediterrâneo: primeiro como tradutor, depois como a pessoa que faz o primeiro contacto com os migrantes.
Em agosto de 2017, a tripulação do Iuventa tomou conhecimento de que havia uma investigação em curso, quando o navio foi arrestado pelas autoridades italianas. Cerca de um ano depois, dez pessoas foram constituídas arguidas.
Miguel foi apoiado por uma equipa de advogados, liderada por Nicola Canestrini, que estimou que os custos legais do processo chegassem aos 500 mil euros. Foi então criada uma campanha de crowdfunding, cujo objetivo era angariar dez mil euros para ajudar o jovem, que estava a completar o doutoramento em Matemática, no Instituto Superior Técnico de Lisboa.
Poucos dias depois, a campanha ultrapassou o objetivo, atingindo os 30 mil euros. Atualmente, foram angariados quase 50 mil euros.
Na altura, o ministro dos Negócios Estrangeiros português garantiu todo o apoio a Miguel Duarte, sublinhando que é preciso ter noção de que as suas ações “são inspiradas por razões humanitárias“.
A situação não demoveu Miguel Duarte, que admite regressar em breve a Mediterrâneo. “Muito proximamente, provavelmente, até volto para o mar Mediterrâneo (…) através de outra organização certamente”.