Cura para o lúpus? Pacientes revertem a doença após tratamento experimental

Um grupo de investigadores alemães revelou ter aproveitado as células dos próprios doentes com lúpus para tratar a doença. Embora o tamanho da amostra seja pequeno, os resultados são notáveis: cinco pessoas entraram em remissão após terem recebido o tratamento experimental.

O lúpus é uma doença autoimune que faz com que as células de defesa ataquem as células saudáveis do corpo, provocando inflamação em tecidos e órgãos – articulações, pele, olhos, rins, cérebro, coração e pulmões.

“Isto é o mais próximo de uma cura que podemos estar”, disse Hoang Nguyen, diretor do Lupus Research Alliance. Os investigadores “corrigiram as células que produzem anticorpos contra os próprios tecidos do corpo”, acrescentou o especialista, que não participou no estudo.

A abordagem é conhecida como terapia CAR-T e tem sido utilizada para tratar alguns tipos agressivos de cancro. O tratamento envolve a modificação das células T, fundamentais no sistema imunitário, transformando-as “em assassinos” que combatem “eficazmente um alvo específico no corpo”, relatou o Wired. Neste caso, o alvo são as células B, que produzem anticorpos.

No ano passado, através do mesmo tratamento, uma paciente com lúpus entrou em remissão. Nesta nova investigação, publicada recentemente na Nature Medicine, foram acompanhadas mais quatro pessoas, às quais aconteceu o mesmo.

O procedimento passa pela remoção de células T dos pacientes e a sua transformação genética, tornando-as aptas para reconhecer uma proteína denominada CD19. Esta aparece na superfície das células B, produtoras de anticorpos. As células T modificadas são depois introduzidas nos doentes.

Após cerca de 100 dias, os doentes submetidas a essa terapia começaram a criar novas células B – mas que não produziam anticorpos nocivos. Na realidade, esses anticorpos nocivos tinham desaparecido por completo.

Um dos indivíduos tratados está livre de sintomas há 17 meses – o período mais longo registado. Os outros estão em remissão entre cinco a 12 meses. Todos os deixaram de tomar os medicamentos para a doença, incluindo imunossupressores.

De acordo com a Lupus Foundation of America, a doença afeta cerca de 1,5 milhões de pessoas nos Estados Unidos e 5 milhões em todo o mundo, principalmente mulheres jovens.

A maioria dos pacientes são tratados com esteróides e imunossupressores, mas estes tornam o corpo mais vulnerável à infeção e têm frequentemente efeitos secundários. Novos medicamentos, que visem proteger o corpo de se atacar a si próprio, podem ajudar alguns pacientes, mas não todos.

“Este impressionante estudo associa-se a um conjunto crescente de provas”, que identificam a terapia CAR-T como “uma opção terapêutica para doenças” além do cancro, incluindo as autoimunes como o lúpus, referiu Jonathan Epstein, diretor científico da Escola de Medicina Perelman da Universidade da Pensilvânia.

Em pacientes com cancro tratados com terapia CAR-T, as taxas de remissão completa chegam a atingir entre 68 a 93%, mas as recaídas ocorrem em 40 a 50% dos casos. Esses podem também desenvolver uma reação inflamatória designada síndrome de libertação de citocinas. No caso do lúpus, os doentes tratados sofreram efeitos secundários ligeiros, incluindo febre.

Quando o tratamento CAR-T é usado em casos de cancro, as células T modificadas têm que combater uma quantidade elevada de células tumorais ao mesmo tempo, o que pode sobrecarregar o sistema imunitário e libertar uma tempestade de citocinas. Já nas doenças autoimunes, o número de células B “é muito mais baixo”, explicou Georg Schett, vice-presidente de investigação da Universidade de Erlangen-Nuremberg na Alemanha, que fez parte da equipa responsável estudo.

A equipa alemã planeia agora avançar com um estudo mais amplo, no qual pretendem tratar com a terapia CAR-T pacientes com diferentes tipos de doenças autoimunes, como artrite reumatóide e esclerodermia.

Embora estes resultados iniciais sejam promissores, a complexidade e o custo da terapia CAR-T limitam a sua utilização num futuro próximo, referiu o Wired.

Atualmente, as terapias CAR-T para o cancro custam cerca de 400 mil dólares – valor de uma única infusão. Hoang Nguyen acredita que, inicialmente e por causa de todas as condicionantes, o tratamento poderá ser utilizado como um último recurso em pacientes com lúpus grave que não respondem a medicamentos.

Taísa Pagno //

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