O Presidente angolano, João Lourenço, quer rever pontualmente a Constituição, mas a UNITA, maior partido da oposição em Angola, reagiu com ceticismo ao anúncio.
O Presidente angolano anunciou, esta terça-feira, uma revisão pontual da Constituição com o objetivo, entre outros, de clarificar os mecanismos de fiscalização política, dar direito de voto a residentes no estrangeiro e eliminar o princípio de gradualismo nas autarquias.
João Lourenço, que falava no arranque dos trabalhos da segunda sessão ordinária do Conselho de Ministros, sublinhou que os detalhes das propostas, o seu sentido, alcance e fundamento serão apresentados publicamente.
“Com esta proposta de revisão pontual da Constituição pretende-se preservar a estabilidade dos seus princípios fundamentais, adaptar algumas das suas normas à realidade vigente, mantendo ajustada ao contexto político, social e económico, clarificar os mecanismos de fiscalização política e melhorar o relacionamento entre os órgãos de soberania, bem como corrigir algumas insuficiências”, detalhou.
A iniciativa do governante apanhou de surpresa a oposição, tendo sido considerada pela UNITA “uma evolução inédita no pensamento de João Lourenço”.
Segundo o Expresso, Adalberto da Costa Júnior, líder da UNITA, defende que a proposta falha por não incluir questões como “eleição direta do Presidente, redução dos poderes excessivos do Presidente, retomada da soberania pelo Parlamento, reorganização do poder judicial e consuetudinário e composição paritária da Comissão Nacional Eleitoral [CNE]”.
Segundo o opositor, esta revisão pode configurar um “verdadeiro golpe constitucional” destinado a manter o MPLA no poder.
Ao Público, Costa Júnior disse que só se compreendia a revisão constituciona se esta visasse “desencadear um amplo consenso nacional” em Angola “sobre questões que preocupam a sociedade em geral”. Mas “não existe nenhum diálogo constitucional que o confirme, bem pelo contrário”.
O ativista social Walter Ferreira, em declarações ao semanário, referiu que, “tendo em conta que poderá assistir-se a uma redução da margem de ganho do MPLA nas próximas eleições e a maioria que ainda possui, a maior parte das propostas da UNITA não passará no Parlamento”.
Pelo contrário, o jurista Benja Satula vê na iniciativa “uma excelente oportunidade para corrigir os erros megalómanos que no passado isolaram José Eduardo dos Santos, fizeram de Angola refém de José Eduardo dos Santos e este refém de um grupo”.
Não é comum que o Presidente angolano discurse publicamente antes das reuniões do Conselho de Ministros, e o próprio João Lourenço referiu isso mesmo na sua intervenção: “Embora não seja hábito, decidi abrir esta sessão do Conselho de Ministros com uma intervenção pública”.
Ao longo do último mês, o chefe de Estado manteve-se em silêncio perante as críticas e a tensão que se faziam sentir em Angola. Para quebrar esse silêncio, Lourenço comentou os assuntos que têm merecido mais críticas, nomeadamente o das mortes do Cafunfo, na Lunda Norte.
O Presidente angolano condenou “veementemente” os agentes “que terão praticado atos considerados desumanos, desonrando a farda que envergam” e disse estar à espera das “conclusões do inquérito em curso e a responsabilização criminal dos agentes da Polícia Nacional”.