Arranca o julgamento do caso de Ihor Homeniuk. O Ministério Público diz que os três inspetores do SEF “tudo fizeram para omitir factos” da morte do cidadão ucraniano. A ex-diretora desta polícia e Eduardo Cabrita são desmentidos relativamente ao uso dos bastões extensíveis.
O julgamento do caso de Ihor Homeniuk, o cidadão ucraniano alegadamente morto por inspetores do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) no aeroporto de Lisboa, no dia 12 de março do ano passado, já arrancou. Os três inspetores no banco dos réus são acusados do crime de homicídio qualificado.
Os advogados de defesa querem a suspensão do julgamento, tendo pedido ao juiz Rui Coelho que, devido à pandemia, apenas se fizesse a identificação dos arguidos, formalizando assim a primeira sessão do caso.
Os três inspetores do SEF, Luís Silva, Bruno Sousa e Duarte Laja, negam os crimes que lhes são atribuídos e que podem valer uma pena máxima de 25 anos de prisão, escreve a Renascença. Estes dizem-se inocentes e apontam o dedo aos seguranças privados que vigiavam a sala.
Cada um dos três arguidos apresentou aos juízes uma versão semelhante dos factos, dizendo que, quando chegaram à sala, Homeniuk, de 40 anos, apresentava algumas marcas “na cara e nos braços”, estava sentado num colchão e que já estava “atado com fita adesiva nas pernas e nos pulsos”.
Todos disseram que encontraram o cidadão “bastante agitado”, mas que, quando foram chamados ao local, desconheciam que este já estava manietado.
Nos cerca de 20 minutos que os três funcionários dizem ter estado na sala, Homeniuk tentou pontapeá-los, tendo os inspetores usados primeiro fitas médicas para o pulsos e pés e depois algemas de metal.
Os arguidos negaram ainda ter havido confrontos físicos com a vítima, afirmando que se limitaram a algemar Homeniuk, tal como a chefia lhes tinha pedido.
O advogado de Bruno Sousa, Ricardo Sá Fernandes, argumenta que o arguido “não quis a morte de Ihor Homeniuk, nem a previu, nem se conformou com ela”, apesar de já condenarem os inspetores de tortura na praça pública. A defesa realça ainda que os inspetores libertaram o ucraniano das fitas adesivas que o prendiam e que usaram apenas “a força necessária” para o imobilizar.
Ao contrário daquilo que a versão do Ministério Público defende, o advogado garante que os inspetores não deram pontapés ou socos, nem o agrediram com o bastão extensível.
O Ministério Público considera que “os arguidos e outros inspetores tudo fizeram para omitir os factos que culminaram com a morte do ofendido, chegando ao ponto de informar aos magistrados que o ofendido foi acometido de doença súbita, conforme resulta do suposto auto de notícia realizado pelo SEF”.
O inspetor Bruno Sousa diz que a morte de Ihor Homeniuk “foi fruto das deploráveis condições em que os cidadãos estrangeiros são detidos” pelo SEF.
Segundo o Diário de Notícias, os arguidos defendem também que a investigação do Ministério Público é reputada de “manifestamente parcial, insuficiente e incompleta”, e de “desfecho precipitado”.
A advogada de Luís Silva, Maria Manuel Candal, sustenta que a precipitação foi causada “pela necessidade por parte daquela autoridade judiciária de deduzir uma acusação antes de esgotado o prazo das medidas de coação a que se encontravam – e encontram – submetidos os arguidos”.
O jornal Público sabe também que a família de Ihor Homeniuk vai juntar ao processo judicial um relatório do médico de Ihor na Ucrânia que prova que este nunca teve qualquer problema de alcoolismo nem antecedentes de epilepsia. A autópsia não indica terem havido sinais de um ataque epilético.
A defesa do inspetor Luís Silva baseia-se no facto que o cidadão ucraniano sofria de doenças crónicas, como alcoolismo e hipertensão, e que no dia em que morreu apresentava evidências de abstinência. A defesa prepara-se para alegar que o facto de não lhe ter sido administrado o medicamento para tal pode ter desencadeado os acontecimentos que levariam à sua morte.
O julgamento dos arguidos, que estão em prisão domiciliária desde a sua detenção em 30 de março de 2020, continua na quarta-feira já com o depoimento de testemunhas de acusação.
A viúva Oksana Homeniuk constituiu-se assistente no processo.
Ex-diretora do SEF e Cabrita desmentidos
A ex-diretora do SEF, Cristina Gatões, pode também estar em sarilhos, já que as suas declarações ao Ministério Público são desmentidas pelos arguidos.
Isto porque Gatões garantiu ao MP que nunca tinham sido distribuídos bastões extensíveis aos inspetores daquela polícia.
Num ofício enviado ao procurador Óscar Ferreira, a antiga diretora do SEF, que se demitiu a 9 de dezembro do ano passado, escreve que “apenas existem bastões extensíveis na Direção Regional do Algarve e na sede do SEF, no Tagus Parque”.
“Não existe nenhum bastão adquirido pelo SEF que tenha merecido distribuição individual, acrescentando-se apenas que a aquisição destes foi efetuada em 2006, não tendo havido nenhuma aquisição posterior de material desta natureza ou similar”, disse Gatões ao MP, citada pelo DN.
O ministro da Administração Interna, Eduardo Cabrita, também disse que os bastões “não integram o equipamento de pessoal do SEF, designadamente no aeroporto” e que “caso se prove a utilização de qualquer bastão extensível, isso é totalmente ilegal”.
No entanto, a contestação de Luís Silva desmente Cristina Gatões e procura demonstrar que as armas detidas pelos dois inspetores não podem ser consideradas “proibidas”. O inspetor do SEF garante que chegou a haver distribuição dos bastões extensíveis às forças de segurança, incluindo o SEF.
“Por ocasião do Euro 2004 foram distribuídos pelas diversas forças de segurança, inclusivamente pelos membros do SEF, tanto bastões extensíveis como sprays de gás pimenta, os quais nunca vieram a ser recolhidos e que passaram, desde então, a ser utilizados por esses elementos”, lê-se na contestação.
A própria Inspeção-Geral da Administração Interna (IGAI) e a PJ tinham apurado nos respetivos inquéritos que o porte desses bastões pelos inspetores do SEF era muito comum.
O Sá Fernandes vem para as televisões fazer os portugueses de parvos em vez de se limitar a tentar fazer os juízes de parvos na sala do tribunal. Pelo menos, evitava fazer publicamente figura de parvo.
Podem optar por julgamentos online. Seria bastante interessante.
Concordo!
Não sei como três presumiveis assassinos ( pelo menos ) podem estar em casa em prisão domiciliaria ? deve ser exclusivo do SEF pois qualquer outro cidadão português na mesma situação estaria preso. Este ano que estão no conforto da sua casa, vai descontar na pena que lhes vier a ser aplicada. Será que os restantes portugueses também obrigados a estar em casa já têm esse credito para um futuro crime? Mas fora o humor, esta situação é ridicula . Essa gente devia estar atrás das grades.
Eles sabem melhor que ninguém como se devem defender!