A facturação relativa a atividades ilegais como o tráfico de drogas, extorsão, prostituição e contrabando de cigarros e bebidas alcoólicas deverá ser incluído no Produto Interno Bruto (PIB) da Itália, levando a economia a crescer mais que o esperado em 2014.
O anúncio de que o instituto italiano de estatísticas Istat está a preparar-se para incluir uma estimativa da economia ilegal no PIB do país a partir deste ano causou polémica.
“PIB vai crescer em mais de 10%“, noticiou eufórico o jornal italiano Il Giorno em sua primeira página, exagerando o impacto da medida. “Com a ajuda da Máfia, nós passaremos de país em crise a locomotiva da Europa“, ironizou o editorialista Roberto Coscetti no blog “Italians”, do jornal Corriere della Sera.
No entanto, o ministério italiano das Finanças frustrou as expectativas mais optimistas, ao dizer que o impacto na economia deverá ser mínimo, sem especificar uma cifra.
Na verdade, a adição da economia criminosa ao PIB da Itália não é uma ideia assim tão original. Em 1987 o país já tinha incluído um valor estimado nos cálculos, o que resultou num crescimento estatístico de 18% de um ano para outro.
A novidade é que agora esse valor vai ser estimado de acordo com as regras da União Europeia (UE), mais especificamente do Sistema Europeu de Contabilidade (European System of Accounts, em inglês, abreviado ESA). Esse organismo é responsável por harmonizar os sistemas contábeis na UE.
A medida é exigida não só pelo ESA, mas também pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), organismo internacional que estimula o progresso econômico e o livre comércio.
O argumento é que, apesar de serem ilícitas, atividades como tráfico de drogas e contrabando acabam por gerar valor para a economia.
Estimativa difícil
As regras exatas para o cálculo, propostas pelo ESA, deverão ser divulgadas no fim do ano e estão a ser aguardadas com muita expectativa.
O tamanho da economia ilícita na Itália é objeto de grande discussão, já que é difícil estimar o que não passa por nenhum livro de contabilidade. Os métodos para chegar às estimativas variam muito. A maioria delas baseia-se em apreensões feitas pela polícia.
Um método comum é, por exemplo, multiplicar as capturas de drogas por dez e calcular o seu valor de acordo com os preços de mercado. Alguns estudos preferem não incluir atividades difíceis de quantificar, como jogos de azar, corrupção ou extorsão.
Um estudo de 2012 feito para o Banco Central italiano estimou que a facturação total do crime organizado equivaleria a 10,9% do PIB, ou cerca de 150 mil milhões de euros. Já um estudo mais recente para o Ministério do Interior redimensiona esse número para cerca de 1,7% do PIB.
Consequências concretas
A facturação de organizações mafiosas como Camorra e ‘Ndraghetta equivale a cerca de 0,7% do PIB, revelou um estudo do centro académico de investigação Transcrime, da Universidade de Milão. O estudo diz também que a Máfia é responsável por cerca de metade das atividades do crime organizado no país.
Seja qual for o método aplicado, um crescimento do Produto Interno Bruto poderá ter consequências concretas para a economia italiana – positivas e negativas.
Por um lado, isso diminuiria os subsídios recebidos da União Europeia (UE). Mas, por outro, poderia ajudar o país a ficar com o seu endividamento dentro do limite imposto pela UE.
A Itália está em crise e acaba de sair de uma recessão que durou cinco anos. Segundo a OCDE, o PIB do país deverá volta a crescer em 2014, mas apenas 0,5% – se não se contar a economia ilegal.
ZAP / BBC