Miguel Guimarães, bastonário da Ordem dos Médicos, esteve na segunda-feira reunido com vários diretores clínicos de hospitais afetados pela greve dos enfermeiros da área cirúrgica.
À saída, foi questionado: “Pode garantir que não haja doentes a morrer devido à greve?”. De acordo com a revista Sábado, o bastonário respondeu: “Não posso garantir isso”.
“O que posso dizer é que os doentes mais graves estão todos a ser tratados. Aqueles com situações mais complexas, mesmo que não sejam abrangidos pelos serviços mínimos, o Ministério da Saúde tem mecanismos legais para as resolver. No Hospital de Santa Maria, já foram transferidos pacientes para Lisboa Ocidental e para São José. Mas perante a greve, não posso garantir que alguns doentes não estejam a ser prejudicados”, concluiu.
O bastonário relatou as preocupações dos diretores clínicos com os doentes cuja situação clínica é mais grave, mas garantiu que tudo tem sido feito para que sejam submetidos a cirurgia. Os doentes têm sido transportados para hospitais do Serviço Nacional de Saúde (SNS) com capacidade para os tratar.
“Existe também uma grande preocupação com as crianças porque muitas das cirurgias programadas que não são realizadas podem fazê-las perder o ano escolar.”, explicou.
Contudo, o bastonário garantiu que os diretores clínicos estão a monitorizar a situação, para “rentabilizar ao máximo os serviços mínimos estipulados, que não conseguem dar resposta a todos os casos prioritários”.
“Os doentes prioritários têm que ser operados o mais rapidamente possível, ou no hospital de origem ou noutros. Caso não haja capacidade de resposta no tempo máximo de resposta garantida”, deve recorrer-se ao sector “social e privado”.
Mais de 100 crianças com cirurgias adiadas
“Mais de 50% das cirurgias estão canceladas”, disse ao Diário de Notícias Alexandre Valentim Lourenço, presidente do Conselho Regional do Sul da OM. Em duas semanas de greve dos enfermeiros foram adiadas cerca de cinco mil cirurgias.
“Há mais de cem crianças cujas cirurgias foram adiadas“, apontou ainda Alexandre Valentim Lourenço. “Apesar de terem sido feitas cirurgias urgentes, temos de perceber que uma criança não é propriamente um adulto e há repercussões na criança que vão além de a doença ser ou não um cancro”, alerta.
Para o dirigente, a necessidade de cirurgia tem uma grande repercussão numa criança que é “completamente diferente” num adulto, sobretudo a nível psicológico. “Estar à espera dois meses para ser operado é muito pior numa criança do que num adulto. Há repercussões na sua atividade escolar”, argumenta.
Está, por isso, em causa não só a doença, mas também a condição da criança, que faz parte de “um grupo desprotegido, desfavorecido e que tem de ser acarinhado”. Nesse sentido, Alexandre Valentim Lourenço faz um apelo: “Peço que haja bom senso para que não se afetem as famílias e as crianças que não têm culpa nenhuma.”
Apesar dos efeitos da “greve cirúrgica”, como foi denominada, “os diretores clínicos garantiram que têm dado resposta a todas as operações muito prioritárias ou urgentes”. Há, no entanto, cirurgias de doentes prioritários que foram adiadas “porque nem todos conseguiram entrar nos chamados serviços mínimos“.
Outro dos problemas suscitados por esta paralisação, que começou a 22 de novembro e está prevista terminar no final do mês, é que o que agora não é considerado um doente prioritário pode passar a ser nos próximos dias.
Bastonária dos Enfermeiros admite mais mortes
Ana Rita Cavaco defende a greve dos enfermeiros aos blocos operatórios com a garantia de que os profissionais estão a “trabalhar em exaustão”. A bastonária da Ordem dos Enfermeiros admite que as mortes evitáveis possam subir, mas sublinha que já acontecem há muito tempo “por incumprimento do número mínimo de enfermeiros”.
“Estamos a falar de mortes evitáveis que acontecem todos os dias“, afirma a bastonária, acrescentando: “Se a Ordem tem denunciado ao longo destes três anos situações em que está um enfermeiro para 40 doentes, é evidente que já morreu muita gente cujas mortes podiam ter sido evitadas.”
A responsável lembra ainda uma auditoria do Tribunal de Contas do ano passado, relativamente às listas de espera, que revelou que morreram mais de duas mil pessoas sem resposta dos hospitais.
Ana Rita Cavaco garante que os enfermeiros estão a ir além dos serviços mínimos. “Há blocos operatórios que não estão a ser preenchidos, não é porque os enfermeiros não estão lá, é porque não há cirurgiões“, garante.
Nesta terça-feira, Ana Rita Cavaco reúne-se com os dois sindicatos que decretaram a greve, os cinco enfermeiros diretores e o movimento dos enfermeiros da greve às cirurgias para “ver o que estão a planear fazer” – se prolongam a greve para lá do final do mês.