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Do otimismo de Costa ao desgaste do Governo. Vem aí mais um Estado da Nação

Mário Cruz / Lusa

O primeiro-ministro, António Costa

O primeiro-ministro abre, esta quarta-feira, o debate sobre o Estado da Nação, na Assembleia da República, no qual o Governo e os partidos vão analisar, ao longo de quase quatro horas, a situação do país.

Depois da intervenção inicial do primeiro-ministro, António Costa, que poderá durar até 40 minutos, os partidos terão direito a pedidos de esclarecimento e intervenções, pela seguinte ordem: PSD, PS, BE, PCP, CDS, PAN, PEV, Chega e IL.

O líder do PSD, Rui Rio, vai estar ausente devido à morte de um familiar próximo, disse à agência Lusa fonte oficial do partido.

O encerramento do debate fica a cargo do Governo, que dispõe de 10 minutos. Habitualmente, é um ministro, e não António Costa, a fazer esse discurso. Em 2020 foi a ministra de Estado e da Presidência, Mariana Vieira da Silva, e no ano anterior o então ministro das Finanças, Mário Centeno.

O início do plenário está marcado para as 15h00 e a grelha de tempos prevê 230 minutos e 30 segundos de discussão, ou seja, quase quatro horas.

Segundo o Diário de Notícias, espera-se que António Costa aproveite o seu discurso para assinalar o princípio do fim de um ciclo na governação, marcado pela pandemia, e o início de um novo, no qual se avistam os milhões que vão começar a chegar da União Europeia.

Esta terça-feira, no Centro Cultural de Belém, o chefe do Executivo já tinha assinalado que Portugal deverá atingir a imunidade de grupo no final do verão, “um momento importantíssimo para a confiança e libertação total da sociedade“, prevendo que se possam bater ainda este ano recordes na captação de investimento.

Apesar de todo este otimismo por parte do Governo, o mesmo não deverá pairar nas bancadas da oposição, adianta o DN, que escreve que “todos preparam diagnósticos críticos”.

Este é um cenário possível de antever também pelas declarações de vários deputados à Lusa, esta terça-feira, no âmbito deste debate sobre o Estado da Nação.

Ao fim de um ano e meio da pandemia de covid-19, a oposição critica a forma como a crise socioeconómica e pandémica foi gerida e acusou o Governo de estar desgastado, pedindo também maior apoio para as famílias e as empresas.

Críticas à gestão da pandemia e ao desgaste do Governo

“Gostava muito de não ter que responder ao atual estado da nação porque a nação está num estado muito mau”, afirmou, por exemplo, o deputado do PSD Afonso Oliveira.

O vice-presidente da bancada social-democrata considerou que antes da pandemia “o país estava mal”, com “uma economia estagnada há 20 anos e, portanto, o estado já era mau a esse nível”.

Com a pandemia, que é uma “circunstância excecional” e que “todos os países tiveram de enfrentar”, o Governo não agiu “em conformidade com o que era exigível num caso destes”, criticou.

Sobre o Governo, diz que está “gasto, cansado, com vários ministros a cometerem muitos erros, com o Governo a cometer vários erros em várias dimensões da vida do país e um primeiro-ministro que vai assistindo a esta realidade sem tomar nenhuma decisão sobre essa realidade”.

Por seu lado, o líder da bancada bloquista, Pedro Filipe Soares, considerou que este é um estado da nação que “nos deve preocupar e exigir mais para responder às urgências que o país apresenta”.

O deputado sustentou que “os corolários destas detenções do sistema financeiro” expõem um “retrato de uma elite que viveu às custas do Estado, dos favores públicos e debaixo da alçada do sistema financeiro”.

A pandemia também ficou marcada, explicitou o líder parlamentar do BE, por “um orçamento curto para as necessidades de salvaguardar os serviços públicos de qualidade”, nomeadamente, na saúde.

Já os apoios, aprovados para fazer face ao desemprego crescente decorrente da paralisação económico-financeira provocada pela covid-19, chegaram “sempre atrasados, quer às pessoas, quer à economia”.

O líder parlamentar comunista, João Oliveira, considerou que o estado da nação “é, naturalmente, um estado de grandes problemas económicos e sociais, que decorrem da epidemia e das medidas restritivas tomadas, e que vieram trazer ao de cima muitas das principais vulnerabilidades do nosso país” como, por exemplo, “um país dependente em relação ao estrangeiro”.

Para o parlamentar, o estado da nação é também assinalado pelas “dificuldades que atingem milhares de trabalhadores que, neste momento, estão a ser vítimas de despedimentos coletivos” e de outros “problemas muito acentuados”.

O CDS também é duro nas críticas, com o líder parlamentar Telmo Correia a destacar que “o estado da nação é obviamente preocupante” mas que também é “particularmente grave”, na sua opinião, o “estado da governação”.

“Existem limitações sérias de liberdade, existem limitações de democracia, existem limitações ao próprio escrutínio que o Parlamento sempre teve em relação ao Governo. Há um Governo que parece fechado em si mesmo, há ministros que já deviam ter saído há muito tempo e que só por teimosia dos próprios não saem”, defendeu.

O PAN, representado pela sua líder parlamentar, Bebiana Cunha, defendeu que a gestão da pandemia “traz bastantes preocupações”, porque tem faltado “um planeamento” e “tem-se feito muito a correr atrás do prejuízo”, e defendeu que os apoios às famílias e às empresas devem ser mantidos “enquanto for necessário”.

“Ao mesmo tempo, aquilo que temos defendido nos apoios às empresas implica é que haja compromissos ambientais porque continuamos a enfrentar uma crise climática e ambiental”, lembrou a deputada.

PS fala em país que se reinventou e ausência de oposição

Já a líder parlamentar socialista, Ana Catarina Mendes, deixou “uma palavra de reconhecimento a um país que se reinventou” durante o último ano, “que se mobilizou, que criou parcerias, que não parou, que não baixou os braços perante as adversidades”.

A última sessão legislativa foi “particularmente difícil”, admitiu. No entanto, assinalou o aumento de 7% da despesa na saúde, para responder à pandemia, e os apoios aprovados para as famílias e para impulsionar o tecido económico de Portugal.

“Ainda temos muito para fazer, não estamos libertos desta pandemia e esta pandemia veio e ainda está para ficar, mas é preciso, sempre, perante as adversidades conseguirmos superá-las e superá-las significa trabalhar”, sublinhou.

Nesse sentido, a dirigente da bancada socialista disse que “é de relevar o papel da oposição e a ausência de oposição na tentativa de resolver os problemas” do país.

“Quando o PSD há um ano recusava votar o Orçamento do Estado porque dizia que dava tudo a todos, é completamente incompatível com aquilo que hoje diz, que é preciso dar mais apoios”, completou.

Como surgiu o Estado da Nação

O debate sobre o estado da nação foi criado em 1992, durante os tempos de maioria absoluta do PSD de Cavaco Silva. No entanto, o primeiro debate só aconteceu no ano seguinte, a 1 de julho de 1993.

Este tipo de debate foi justificado como uma forma de fazer um maior escrutínio parlamentar à atividade do Executivo, e inspirado, em parte, pelos discursos do estado da União dos Presidentes dos Estados Unidos, numa altura em que eram escassos os debates com o chefe do Governo na Assembleia da República.

No ano passado, no primeiro debate sobre o estado da nação da atual legislatura e que aconteceu já em pandemia, o primeiro-ministro considerou que Portugal precisava de uma base de entendimento política sólida, afirmando que essa condição seria indispensável com a crise pandémica e rejeitou “competições de descolagem” entre partidos e “calculismos” eleitorais.

A este apelo dirigido sobretudo aos partidos à esquerda, o BE contrapôs que “o PS recusou” um “acordo formal para a legislatura” proposto pelo partido e o PCP deixou António Costa sem resposta, insistindo na necessidade de uma política “de esquerda” e “patriótica”.

ZAP // Lusa

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