//

“Erro” ou “canalhice”? Editor da Lusa demite-se após referência racista a deputada do PS

32

Romualda Fernandes - PSA Lusa está no olho do furacão depois de um jornalista da casa ter identificado a deputada do PS Romualda Fernandes como “Preta” numa peça que acabou por ser replicada em vários jornais online. O PS fala de um acto “absolutamente inqualificável” e o editor de Política da agência demitiu-se.

Em causa está uma notícia sobre a constituição da Comissão parlamentar da revisão constitucional, onde se revela a lista dos deputados que a integram. Romualda Fernandes é um desses deputados e surge identificada como “Preta” na peça do jornalista da Lusa.

Nas redes sociais, há quem note que esse jornalista é o que “costuma publicar as notícias do Chega na Lusa”.

Lusa fala em “erro” e editor de Política demite-se

A agência de notícias já veio lamentar “profundamente o erro” que identifica a deputada socialista “de modo inaceitável, contra todas as regras éticas e profissionais”.

A Lusa assegura ainda que vai fazer “uma investigação sobre o que aconteceu”, apresentando também “as suas desculpas à deputada, ao PS” e a “todos os clientes e leitores” da agência de notícias.

Entretanto, o editor de Política da Lusa, José Pedro Santos, pediu a demissão do cargo ainda durante esta quinta-feira à noite, poucas horas depois da saída da notícia, segundo avança o Público.

O jornalista que escreveu a notícia, Hugo Godinho, está a ser alvo de “um processo de averiguações, a fim de apurar as circunstâncias em que a notícia foi elaborada”, avança o mesmo jornal.

“Comportamentos racistas não podem ficar impunes”

O PS manifestou o desagrado com a situação e exigiu “um pedido público de desculpas à deputada Romualda Fernandes, quer da parte dos autores do texto, quer da parte dos órgãos que o reproduziram publicamente”.

O Expresso e o Observador estão entre os media que publicaram a notícia tal como ela saiu na Lusa, com o termo “Preta” no corpo do texto associado à deputada socialista.

A direcção da bancada do PS “repudia veementemente a notícia” e a “forma absolutamente inqualificável” utilizada pelo jornalista da Lusa para identificar Romualda Fernandes.

Numa nota assinada pela líder parlamentar socialista, Ana Catarina Mendes, o partido destaca que é importante que “o jornalismo saiba respeitar as suas próprias responsabilidades na preservação dos valores da democracia e dos direitos humanos”.

A Secretária de Estado para a Cidadania e a Igualdade, Rosa Monteiro, também já veio notar que os “comportamentos racistas não podem ficar impunes e a responsabilidade dos meios de comunicação social tem de ser uma garantia da democracia”.

“Falta de respeito e profunda canalhice”

Entretanto, nas redes sociais, chovem críticas ao jornalista que escreveu a peça e à Lusa. Há quem note que o que aconteceu é “vergonhoso e inqualificável” e também quem se atire às alegações feitas pela Lusa no seu pedido de desculpas.

“Erro é quando eu escrevo “à” e o correcto é “há”. O que aconteceu com a Lusa foi uma tremenda falta de respeito e uma profunda canalhice“, aponta a utilizadora do Twitter Inês João Rodrigues.

Não é um erro de ortografia, um engano. É um descuido que abre a janela e deixa ver algo que ele não queria que víssemos, mas que estaria lá mesmo sem este descuido”, aponta, por seu turno, o utilizador Margem Sul ao poder! na mesma rede social.

Já o utilizador RMS constata que o jornalista da Lusa “tem o azar de seguir o partido de extrema-direita”, apontando que é “uma coincidência” curiosa.

Por outro lado, a jornalista Liliana Valente do Expresso faz a defesa dos profissionais da Lusa que “são de grande qualidade” e realça que “não é um episódio triste” como este “que os define”. Contudo, também frisa que “o que aconteceu foi lamentável” e “um grave insulto”.

Já Fernanda Câncio, jornalista do Diário de Notícias, apela a que se “averigue mesmo o que se passou” e se retirem “consequências”. “O que aconteceu é muito grave”, destaca ainda, pedindo à Comissão da Carteira de Jornalista que “actue”. “Estamos perante uma violação dos deveres constantes no estatuto de jornalista, que é lei”, conclui.

Por seu turno, o jornalista do Maisfutebol Vítor Hugo Alvarenga considera que este episódio é “a prova de que o jornalismo em Portugal está a viver uma crise profunda“. “Um erro inadmissível da Agência Lusa, a catalogar uma pessoa como «preta», é replicado por vários jornais que já não têm capacidade, por falta de meios nas redacções, para verificar antes de replicar”, salienta.

Note-se que em alguns órgãos de informação, as notícias da Lusa são publicadas automaticamente tal como saem na agência de notícias, através de softwares específicos. Portanto, não passam pela revisão de nenhum jornalista.

O Expresso refere que a notícia da Lusa publicada no seu site “foi corrigida no preciso momento” em que se “detectou” o “grave insulto que constava na notícia original”. “Aos visados e aos leitores, as nossas desculpas”, pede também o jornal.

O Observador também esclarece que logo que detectou a “referência racista” no artigo da Lusa “corrigiu a notícia”. Além disso, a publicação “repudia o sucedido e apresenta as suas desculpas aos leitores e à visada”.

Susana Valente, ZAP //

32 Comments

  1. Parece-me uma canalhice. No entanto, aproveito para dizer que nunca vi esta deputada em lado nenhum a fazer seja o que for!!! Isto leva-me a pensar a quantidade de gente que anda a mais pela AR às nossas custas.

    • Nem todos os parlamentares têm vocação para oradores. Por detrás dos oradores há toda uma equipa de estrategas, pessoas que fazem monitorização e análise, escrevem projetos lei, estudam assuntos, participam em reuniões decisórias, lêem tudo o que a comunicação social publica bem como todos os emails e cartas dirigidos por cidadãos aos grupos parlamentares, preparam comissões de inquérito, negociam com outros grupos parlamentares. Muitos são especialistas em temas concretos pelo que é necessária diversidade. Os deputados que você nota são só a ponta do iceberg. Sorte a sua ter “gente que anda pela AR às suas custas” pois nem imagina o preço que pagava se assim não fosse.

  2. Se este caso for parar a tribunal e se o juiz for tão racista como o jornalista, o caso vai ser arquivado por falta de provas…
    Será que a nota da etnia da deputada é de facto racismo? Se calhar é um elogio, uma menção honrosa a uma minoria descriminada e ainda assim presente no parlamento. Se todos os outros deputados na lista tivessem a sua etnia anotada entre parêntesis a lado do nome talvez não fosse discriminação. A interpretação daquela nota é tão racista como a razão que levou o jornalista a escrever a etnia da deputada? O racismo existe e está em todos nós, mas nuns mais do que noutros…

  3. Em Portugal há muito o hábito de não chamar “os bois pelos nomes”.
    A Lusa diz que se tratou de um erro.
    Erro? Qual erro?
    Quando se chama a alguém o que foi chamado à deputada não se trata de um erro. Trata-se, antes, como alguém já lhe chamou, de uma canalhice.
    Não é um deslise ortográfico, uma desatenção, ou algo similar.
    Reflecte antes um posicionamento racista intolerável.
    O jornalista que escreveu isso devia ser de imediato despedido da Lusa, e sem indemnização, porque há justa causa para tal.
    Eu não confundo a Lusa com o energúmeno extremista que teve o dislate de escrever o que escreveu, mas fico a aguardar pelos próximos desenvolvimentos do caso.
    Espero bem que a Lusa não invente ” estórias” para o manter.

    • “Tremenda falta de respeito e uma profunda canalhice” é um primeiro ministro definir como excelente um seu ministro, que é das coisas mais anedóticas que existiram na governação de Portugal depois do 25 de abril.

  4. Sem duvida “uma coincidência” curiosa. Estranho!! por mais louco que seja o jornalista não me parece que seja kamikase ao ponto de por em jogo a sua carreira, sustento e futuro. Depois de pintar e vandalizar estátuas, não quero acreditar que a extrema esquerda desça tão baixo ao ponto de prejudicar um jornalista.

  5. Tem graça , ainda não vi nenhum deputado branco ( ou agora também já não se pode dizer branco ?) em parlamentos de Angola , Moçambique etc .
    Deve ser porque lá é tudo muito pluralista

    • Diga antes “claro” 🙂
      Isso é uma treta tudo. Branco é branco, preto é preto. Tenhos amigos pretos e sempre me disseram que os deveria tratar por pretos e não por negros, simplesmente porque eu também sou branco e não sou claro.
      Ao tratá-los por negros eles sentem que eu estou a querer “suavizar” como se ser preto fosse algum pecado ou alguma maldade.
      Deixem-se dessas tretas. Quem não tem preconceitos (brancos e pretos) é assim que se trata.
      Aqui só para nós, eu acho que sentia ofendido se me chamassem “claro”. Qual claro??!!!! Branco! O mesmo seria válido se fosse preto!

      • Assino por baixo. Estes prescrutores dos bons costumes que têm a mania que tudo é racismo, vão-se Catar, já não há paciência. Se a cor da Senhora é preta qual é o problema. Ontem no comboio alguém queria sentar-se ao pé de mim e eu disse, desculpe, temos que praticar a distância! Qual distância branca Di merda!, e sentou-se. Eu levantei-me é claro. Deveria eu ter chamado a polícia porque, eu sim fui agredida. Mas não sou preta, claro. Vão dar banho ao cão.

      • As pessoas todas têm um nome e é por ele que devem ser tratadas. Fora isso só estaremos a falar de tristes e infelizes.

    • Se a maior parte dos mencionados são brancos, o jornalista quis salientar que aquela pessoa não o era. Era preta. Condena-se o preciosismo do jornalista, por causa disto? Preocupa-me muito mais termos um pacóvio Cabrita a fingir de governante.

    • É só pura ignorância tua. O desconcertante é exatamente o facto de em África os brancos serem muito bem tratados e considerados, só não o sabe quem nunca lá esteve.

    • Curiosa esta forma de enquadrar o racismo. Quantos brancos já foram vítima de pretos! Há gente que não tem que fazer e arvoram-se em moralistas. Já não há paciência.

  6. Não vejo mal nenhum em dizer que uma pessoa preta é preta. Vejo todo o mal em a discriminar meramente por o ser.
    Quanto ao texto jornalístico publicado, com uma lista de nomes (de deputadas e deputados), esse está escrito de forma quase infantil. Está mal escrito. É despropositado dar um tratamento especial ao nome duma deputada, escrevendo apenas para esse uma nota entre parêntesis. Ou seja, o texto está um bocado mal amanhado. Mas isso por si só não é razão para um linchamento.
    Por outro lado, linchamentos são precisamente coisas que, pela sua natureza, acontecem sem haver propriamente uma “razão”. Acontecem porque a turba urra e atropela e todos se juntam à turba nem que seja por medo de ser também linchados se ficarem de fora. É triste, mas é a Natureza Humana.
    E neste caso a Natureza Humana reina, soberana.
    Coitado do jornalista…!

    • “Não vejo mal nenhum em dizer que uma pessoa preta é preta. Vejo todo o mal em a discriminar meramente por o ser.” Muito bem dito, está aqui resumido tudo, e que serve para muita coisa.

    • Em poucas palavras descreveu o essencial!
      Se à frente do meu nome escrevessem branca, eu também iria pensar o porquê de tal idiotice!

      • De facto, se em Angola, Moçambique, ou outro país qualquer de maioria negra se um jornalista se dirigisse a um membro branco do governo, ou a um deputado como o “branco” estariamos todos indignados e com toda a razão. Em Angola, o Pepetela é o Pepetela, em Moçambique, o Mia Couto é o Mia Couto e por aí fora.

      • Os nomes acompanham as pessoas por onde andarem elas. O Pepetela vive em Angola, o Mia Couto vive em Moçambique, só para citar dois exemplos. Tanto em Angola como em Moçambique vivem milhares de outros portugueses, de resto pergunto, aonde é que não se encontra um português? Se temos o direito de andar pelo mundo, temos de reconhecer aos outros o direito de também estarem em Portugal. De resto um dos princípios básicos da emogração é o de que a emigração se faz prioritariamente do conhecido para o conhecido.

      • se fosse em Africa já não achavas tão estranho escreverem branca entre parenteses

  7. Tem graça; neste caso todos os colunáveis, sejam eles políticos, deputados, jornalistas, etc, etc, mas principalmente os socialistas, vieram a terreiro dizer cobras e lagartos deste jornalista, seja ele lá quem for, mas quando o Galamba disse as alarvidades que disse sobre o programa “6ª às nove” e respectivos(as) jornalistas, não vi ninguém elevar-se desta maneira. Pois é… Mais, ao que parece, o editor desse jornal teve a coragem e a ombridade de se demitir; e o Galamba? Fica? Pois é…
    Realmente a política tal, como a praticam, é mesmo muito porca.

    • O que acho é que se a Lusa não despedir, no imediato, este jornalista deixa de ter condições objetivas para manter a cooperação com os países africanos.

  8. Evidentemente, o que conta é a intenção com que se escreve algo, mais do que aquilo que se escreve. E, neste caso, parece muito provável que a intenção fosse insultar. No entanto, cabe também perguntar por que razão, em Portugal, a menção da cor da pele se tornou num tabu absoluto, especialmente se a pessoa mencionada for de raça preta, sob pena, para quem quebre esse tabu, de ser considerado o maior vilão à face da Terra. Porquê? Como alguém já aqui disse, preto é preto, branco é branco, e não há que “suavizar”, dizendo por exemplo “negro”, como se ser preto fosse algum defeito! Em grande parte (ainda que provavelmente não neste caso), o racismo está na sociedade portuguesa, que continua subconscientemente a considerar que ser preto é um grande infortúnio e que, por uma questão de educação, tal não deve, em caso algum, ser mencionado. Nesse aspecto (felizmente não em todos), as sociedades inglesa e americana estão muito à frente da nossa, pois aí não existe tal tabu, pode-se falar livremente de pretos e brancos e as pessoas de ambas as raças referem-se a si próprias, com orgulho, por essas palavras. Veja-se o caso recente do movimento “Black Lives Matter”. Há também filmes e séries de televisão americanos com a palavra Black (referindo-se à raça) no título e na sinopse, sem que ninguém se ofenda, como “Black is King”, realizado pela Beyoncé, que trata “the voyages of black families throughout time”, para citar.

Deixe o seu comentário

Your email address will not be published.