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“É devastador”: os millenials que querem ter filhos, mas não têm condições financeiras

Têm três empregos, querem mudar de carreira ou estão a mudar-se para zonas distantes para ter alojamento mais acessível. Assim é a vida dos millenials, que fazem tudo para juntar dinheiro suficiente para sustentar uma família.

“As pessoas precisam de parar de me dizer para ‘simplesmente ir em frente’, se quiser ter filhos”, começou por dizer Jen Cleary, uma ex-professora de 35 anos que contou ao jornal britânico The Guardian como a precariedade financeira a impede de realizar o sonho de ter filhos.

“A maior parte da minha geração simplesmente não se pode dar ao luxo de o fazer. Não ter filhos está fora do meu alcance e é uma realidade devastadora e frustrante”, continuou.

Mas Cleary não é a única. Muitos millenials — nascidos entre 1981 e 1996 — estão a passar pelo mesmo dilema.

A taxa de natalidade no Reino Unido atingiu o nível mais baixo de sempre, com a taxa de fertilidade das mulheres com menos de 30 anos também nos níveis mais baixos desde que há registo (1938), lê-se num relatório do Office for Nationas Statistics.

E, segundo a publicação britânica, há muitos factores que contribuem para isso: há quem tenha problemas de infertilidade; quem decida não ter filhos por escolha pessoal; e alguns decidem não o fazer devido às incertezas e perigos da crise climática.

No entanto, as questões económicas relacionadas com o aumento do custo de vida são um fator cada vez mais comum.

No mês passado, a presidente do Partido Trabalhista, Anneliese Dodds, salientou que muitas pessoas estão a ser obrigadas a adiar a criação de uma família devido a “pressões de custos”.

Uma em cada cinco mulheres não tem filhos até à meia-idade e 80% dessas situações devem-se às circunstâncias, não à infertilidade”, explicou Jody Day, fundadora da Gateway Women, uma rede de apoio às mulheres que não conseguem ter filhos.

Segundo Day, grande parte destes 80% deve-se a questões sistémicas, “como as dívidas dos estudantes e o foco na carreira, o que significa que o planeamento familiar é deixado para demasiado tarde”.

Além disso, o aumento dos preços das casas e a falta de cuidados infantis a preços acessíveis fazem com que a verdadeira segurança financeira pareça cada vez mais difícil de alcançar.

Todos estes fatores contribuem para a história de Cleary. Quando Jen e a esposa se conheceram, enquanto ambas tiravam o curso de docentes, há nove anos, começaram a poupar para um apartamento.

“Tínhamos esperança de receber um bom salário, encontrar um lugar agradável para viver e ter filhos, fosse através da adoção ou de um doador de esperma”, disse Cleary.

Alguns meses após a mudança para o novo apartamento, aconteceu o incêndio de Grenfell, que desencadeou uma reavaliação a nível nacional das práticas de construção — verificou-se que o seu apartamento tinha revestimento inflamável e as taxas de serviço eram muito caras.

“Não podíamos pagar o apartamento nem as taxas de serviço com salários de professor”, contou Cleary.

“Acabámos por vender este ano, mas perdemos 20 mil libras no processo, e temos lutado para encontrar um lugar novo. Alugámos quatro apartamentos diferentes em seis meses e continuamos a falhar a nossa pontuação de crédito quando se trata de encontrar uma nova hipoteca”, continuou.

Durante todo este tempo, o processo de iniciar um processo de adoção ou de encontrar um doador de esperma, foi-se afastando cada vez mais.

“O processo de adoção requer que se tenha vivido algures durante algum tempo, para que se tenha raízes para criar um filho, e é claro que não lhes podemos dar isso agora”, disse a ex-professora.

“A doação de esperma custa cerca de duas mil libras por vez, por isso, a menos que tenha um amigo com quem o possa fazer, é muito caro ser uma mulher lésbica e ter um bebé. Também é muito difícil adotar já se tiver tentado” ter filhos por doação de esperma.

“Há muitas barreiras e decisões a serem tomadas. Entretanto, tenho 35 anos e o meu relógio biológico está a dar sinal”, acrescentou.

Cleary deixou o seu trabalho como professora, tem agora uma função empresarial mais bem remunerada e o casal mudou-se para uma área onde o mercado imobiliário está menos inflacionado

“Parte de mim desejava que nunca me tivesse tornado professora, porque assim poderíamos ter tido dinheiro suficiente para fazer acontecer”, concluiu.

De acordo com o Child Poverty Action Group, o custo de criar uma criança até aos 18 anos em 2021 poderá ascender a 71.611 libras — quase 85 mil euros.

ZAP //

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