Fracasso da lei marcial deu a coroa ao caos na Coreia do Sul. A ditadura de cima já reagiu à “fraqueza” de baixo.
O ex-ministro da Defesa da Coreia do Sul Kim Yong–hyun tentou cometer suicídio, mas falhou e encontra-se em estado estável, disseram as autoridades de Seul esta quarta-feira.
O comissário-geral do Serviço Correcional da Coreia, Shin Yong–hae, disse aos deputados que Kim tentou matar-se num centro de detenção em Seul, pouco antes de ser formalmente detido.
Após a tentativa falhada de suicídio, Kim foi colocado numa cela especial e não corre perigo de vida, acrescentou Shin.
Os procuradores interrogaram Kim três vezes desde da detenção inicial, no domingo, depois de ter comparecido voluntariamente para responder na investigação. O Tribunal Distrital Central de Seul tinha aprovado na quarta-feira um mandado de captura contra Kim, acusado de rebelião e abuso de poder.
Chefes da polícia detidos; buscas (falhadas) no gabinete de Yoon
Os dois principais chefes da polícia foram detidos pelo papel na breve imposição da lei marcial por parte do Presidente da Coreia do Sul.
As forças de segurança sul-coreanas disseram que o comissário-geral da agência de polícia sul-coreana, Cho Ji-ho, e o chefe da agência de polícia metropolitana de Seul, Kim Bong-sik, estavam detidos na esquadra de Namdaemun, na capital.
Os dois dirigentes policiais estão a ser investigados pelo papel no envio de forças policiais para a Assembleia Nacional, numa tentativa de impedir os deputados de entrar no parlamento para suspender a lei marcial.
Um número suficiente de deputados conseguiu finalmente entrar numa câmara do parlamento e rejeitou por unanimidade o decreto de Yoon, obrigando o Governo a levantá-lo antes do amanhecer de dia 4.
Uma unidade especial de investigação da polícia da Coreia do Sul disse esta quarta-feira ter tentado efetuar buscas na sede da polícia e no gabinete do Presidente, mas terá sido impedida de entrar no edifício, de acordo com o Yonhap, citado pela Reuters, por alegada ausência de acordo com os Serviços Secretos sobre a metodologia da operação.
Ditadura denuncia “ditadura”
A Coreia do Norte reagiu à tentativa falhada do Presidente sul-coreano, Yoon Suk Yeol, de impor a lei marcial, comparando-a a um golpe militar e acusando-o de estar a tentar dirigir uma “ditadura fascista“.
Num artigo do jornal estatal norte-coreano Rodong Sinmun, citado pela BBC, lê-se que o “ato insano” de Yoon era “semelhante ao golpe de Estado da era da ditadura militar de há décadas”.
“Ele brandiu descaradamente as lâminas e as armas da ditadura fascista contra o seu próprio povo”, lê-se ainda, entre fotografias dos protestos que contaram com milhares de sul-coreanos nas ruas.
O jornal do regime de Pyongyang diz ainda que os acontecimentos em Seul “revelaram a fraqueza da sociedade sul-coreana, que a súbita declaração de lei marcial de Yoon é uma expressão de desespero e que a vida política de Yoon pode terminar cedo”.
Inédito no país
A lei marcial, a primeira em mais de 40 anos, durou cerca de seis horas, mas desencadeou uma crise política e grandes protestos populares.
O Presidente sul-coreano, Yoon Suk–Yeol, e aliados estão a ser alvo de investigações criminais e tentativas de destituição.
O Ministério da Justiça proibiu Yoon e oito pessoas de saírem do país, uma vez que as autoridades os consideram suspeitos no caso da lei marcial, sendo a primeira vez que um Presidente em exercício na Coreia do Sul é alvo de uma proibição de viajar.
Embora o Presidente tenha imunidade contra processos judiciais enquanto estiver em funções, tal não se estende a alegações de rebelião ou traição.
Rebelião dá pena de morte
O ex-ministro da Defesa foi a primeira pessoa a ser detida no âmbito deste processo, tendo sido acusado de ter recomendado a lei marcial a Yoon e de ter enviado tropas para a Assembleia Nacional para impedir os deputados de a votarem.
Na terça-feira, Kim renunciou a uma audiência no tribunal, sobre a emissão do mandado, dizendo, através do advogado, que pedia desculpa por ter causado grande ansiedade e incómodo ao povo.
Durante um interrogatório, Kim terá admitido que propôs a lei marcial a Yoon, mas afirmou não ser uma ação ilegal nem inconstitucional.
Os procuradores têm até 20 dias para decidir se acusam Kim ou não. A condenação por rebelião implica uma pena máxima de morte.
O principal partido da oposição, o liberal Partido Democrático, apresentou uma nova moção para destituir o conservador Yoon, que no sábado escapou por pouco a uma primeira tentativa.
O Partido Popular do Povo (PPP), no poder, boicotou e invalidou a votação por falta de quórum. Mais tarde, o partido disse que, em troca do bloqueio da moção, tinha obtido a promessa de que Yoon se ia retirar para deixar a governação ao PPP e ao primeiro-ministro.
A oposição, que acusou o PPP de um “segundo golpe” de Estado, vai tentar novamente destituir o Presidente a 14 de dezembro, próximo sábado, dia em que o parlamento vota a segunda moção de destituição do chefe de Estado.
ZAP // Lusa