A Lagoa de Melides na costa alentejana é um paraíso na terra que atrai celebridades mundiais, mas está sob ameaça. Contudo, a condessa italiana Noemi Cinzano e os seus amigos ricos têm um plano para a salvar.
Noemi Marone Cinzano é herdeira do império Cinzano, a marca de vermute que existe desde o século XVIII, e também produz vinhos na Argentina. A par de outras celebridades que se deixaram encantar pelo Alentejo, a condessa tem uma casa com vista para a Lagoa de Melides, em Grândola.
A milionária mudou-se para a zona em 2012, para aproveitar o ambiente calmo e acolhedor, mas, ao longo dos anos, foi reparando que “havia cada vez menos água na lagoa”, como conta ao Jornal de Negócios.
A seca e a extracção intensiva de água da lagoa para regar são problemas que ameaçam todo o ecossistema que coexiste na área – e, logo, a paisagem de que a condessa pode disfrutar.
Assim, em 2020, Noemi Cinzano fundou a Associação Intertidal Melides com o amigo e vizinho Christian Louboutin, o famoso designer de moda que também se deixou conquistar pelo Alentejo.
Esta organização sem fins lucrativos quer promover o desenvolvimento sustentável da região, onde a lagoa é essencial.
Nesse sentido, está a implementar vários projectos, contando com doações de celebridades, nomeadamente do conceituado arquitecto e designer francês Philippe Starck que também tem uma propriedade perto da lagoa.
A associação tem cerca de 60 sócios, como apurou o Negócios, constatando que é uma espécie de clube de elite reunido em torno do carisma de Noemi e da sua especial preocupação com a água. A condessa perdeu um filho para um vírus disseminado num poço de água.
“A água foi sempre importante para mim, mas eu, de um dia para o outro, posso ir embora”, nota Noemi Cinzano, frisando que “é um assunto que diz respeito ao futuro das pessoas” da zona.
Apoios financeiros para convencer agricultores
A associação tem implementado vários projectos para “melhorar cada fase do ciclo da água”, como explica ao Negócios o coordenador executivo da Intertidal Melides, Miguel Vieira.
Um desses projectos passa pelo cultivo de “arroz sustentável” – “a maneira mais fácil de chegar ao povo”, refere Noemi Cinzano ao mesmo jornal.
O primeiro passo foi contactar os agricultores locais, para os convencer a aderir à ideia que passa por reduzir a rega, eliminar o uso de herbicidas e substituir técnicas tradicionais por abordagens mais sustentáveis.
Para incentivar a adesão dos agricultores e compensar as perdas de produção, foram criados apoios financeiros. A associação já distribuiu cerca de 100 mil euros e agrupa 12 agricultores, conforme dados do Negócios.
“Está a funcionar. As pessoas perceberam que não era só papo furado“, diz a condessa no seu sotaque do português do Brasil, onde se refugia quando o Inverno chega a Portugal.
Arroz de Melides é “quase perfeito”
Um dos agricultores aderentes é Joaquim Chainho que se dedica à produção de arroz há 33 anos. “Mudámos pela falta de água”, diz ao Negócios este orizicultor, salientando também que é uma “tentativa de melhorar a qualidade” do produto final.
A qualidade é um facto importante e pode abrir novas portas para exportação, como destaca Noemi frisando que o arroz de Melides é considerado “quase perfeito”.
Para valorizar esse facto, a Intertidal Melides está a preparar “uma espécie de selo de denominação de origem“, como explica ao Negócios o responsável pela comunicação da associação, Rossano Carvalho de Souza.
A barragem da endiabrada
Outro projecto da associação passa por criar a chamada “barragem da endiabrada”, uma represa para “reserva estratégica de água”, como sublinha a condessa numa publicação no Instagram.
O projecto deverá custar cerca de 200 mil euros e a associação espera financiá-lo com recurso a fundos europeus e com o apoio da Câmara Municipal de Grândola. Mas aguarda uma audiência com a Agência Portuguesa do Ambiente “há mais de seis meses sem resposta”, como lamenta Miguel Vieira no Negócios.
“A implementação desta infraestrutura representará um passo importante em direcção à sustentabilidade hídrica regional, mitigando os efeitos de secas prolongadas e garantindo a preservação dos actuais recursos naturais”, nota ainda Noemi Cinzano, salientando que “não será apenas mais uma infraestrutura”, mas “uma ponte para o futuro, um legado que beneficiará as gerações presentes e futuras, assegurando que a Lagoa de Melides continue a ser um tesouro natural, um centro de biodiversidade e um pilar da economia local”.
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