Um doente com cancro do pâncreas classificado como inoperável e já encaminhado para cuidados paliativos foi “resgatado” pelo Hospital de São João, no Porto, e submetido a uma cirurgia “potencialmente curativa”, disse o cirurgião à Lusa, esta quinta-feira.
“O doente irá agora ser acompanhado, mas já entrou no campo das possibilidades de cura. Quando chegou ao nosso hospital estava no campo do tratamento paliativo. Agora, está a caminho do Algarve” de onde é originário, disse Humberto Cristino, cirurgião do Centro de Referência de Cancro Hepatobilio-Pancreático do Centro Hospitalar Universitário de São João (CHUSJ).
Segundo o cirurgião, “os tumores do pâncreas localmente avançados com envolvimento do tronco celíaco são muitas vezes considerados inoperáveis”.
No entanto, “atualmente e envolvendo uma abordagem multidisciplinar a cirurgia pancreática de ressecção, com a remoção completa do tumor, é o único tratamento potencialmente curativo dos tumores pancreáticos”, afirmou Humberto Cristino.
Esta intervenção, “conhecida como procedimento de Appleby, ou pancreatectomia distal com ressecção do tronco celíaca, tem sido cada vez mais realizada em centros de excelência selecionados, como é o caso do Hospital de São João, um dos únicos em Portugal a realizá-la”, explicou o médico.
Esta técnica cirúrgica “altamente complexa” de ressecção não é nova, foi desenvolvida para casos de cancro digestivo e, posteriormente, adaptado pelos japoneses ao cancro do pâncreas.
Foi depois replicada por outros países, incluindo Portugal, e representa uma nova esperança para os doentes classificados como inoperáveis.
“O cancro do pâncreas ainda hoje é uma doença muito ingrata e não existem outras formas de tratamento, além do cirúrgico. Esta técnica que agora chegou a Portugal permite resgatar os doentes considerados inoperáveis e em quimioterapia. Deste caso em particular, sabemos que biologicamente é um tumor favorável e acreditamos que este doente ainda vai ter uns bons anos pela frente”, sublinhou.
Contudo, embora este procedimento, realizado em centros de referência, permita trazer para o campo dos curáveis doentes que já tinham sido encaminhados para paliativos, o especialista acredita que “o tratamento futuro deste tumor não será o que o mundo faz atualmente”.
“Por exemplo, a hepatite C tinha uma mortalidade muito alta e hoje é tratável em 98% dos casos. Os tumores do pâncreas há 20 anos tinham uma sobrevida de 5% e hoje têm uma sobrevida de 5%, o que significa que não é este o caminho, mas esta ainda é a única esperança”, disse.
A cirurgia ao tumor do pâncreas tem vários graus de complexidade e, de acordo com essa complexidade, nem todas as instituições hospitalares estão habilitadas a realizá-la.
É por esse motivo que este cirurgião do CHUSJ apela a que os doentes com esta patologia considerados inoperáveis sejam reencaminhados para centros de referência.
“Com esta técnica, este foi o primeiro caso, mas temos feito procedimentos em doentes que foram rejeitados noutras instituições, com bons resultados”, sustentou.
Defende, por isso, que os hospitais “não devem ser donos dos seus doentes”, devem referenciá-los às instituições que tem capacidade de oferecer o mais avançado que existe para os tratar.
“Uma segunda opinião é muito importante, se o hospital considera que o caso está encerrado e não existe mais possibilidades, o doente tem o direito de recorrer a outro especialista”, porque, “com frequência, acontece que um doente a ser tratado com paliativos acaba curado”, afirmou o cirurgião.
Dos doentes diagnosticados com cancro do pâncreas apenas 15% ou 20% são operáveis, ou seja, existe “um enorme leque de doentes que não tem hipótese cirúrgica”.
Dos não operáveis, apenas 20 a 30% dos casos vão ser submetidos a outros tratamentos, como a quimioterapia.
São estes doentes que devem procurar um centro de referência para ouvir uma segunda opinião e, eventualmente, submeterem-se ao procedimento de Appleby.
O Centro de Referência de Cancro Hepatobilio-pancreático do Centro Hospitalar Universitário São João (CHUSJ), assumindo a sua alta diferenciação e capacidade inovadora, suportada por cuidados altamente especializados, é um dos que em Portugal oferece às pessoas atingidas por esta patologia e nos casos em que é aplicável, a possibilidade de cirurgia radical potencialmente curativa.
// Lusa
Ainda bem que as boas notícias estão gradualmente a aparecer.
Bem haja Hospital de São João.
Será que não está na hora de ser criado a nível nacional um centro de coordenação de todos os doentes com as diversas patologias, nomeadamente as que requerem uma atenção mais cuidada para se saber se os locais onde se encontram são os que dispõem das terapias e procedimentos mais adequados, promovendo a sua transferência para outros locais com melhores hipóteses de tratamento quando o local onde se encontram não sejam os que possuem a melhor disponibilidade de assistência e tratamento? Um tratamento mais adequado e no local mais qualificado, traduzir-se-ia em encurtamentos de internamento e consequentemente menor custo para o erário que cobre essas despesas.