Cimeira Social cheia de boas intenções deixa factura de um milhão de euros (e “erro” na comida da PSP)

Tiago Petinga / EPA

António Costa com Ursula von der Leyen, presidente da Comissão Europeia, e Charles Michel, presidente do Conselho Europeu, na Cimeira Social no Porto.

Os chefes de Estado e de Governo da União Europeia comprometeram-se, na Cimeira Social do Porto, a “trabalhar em prol de uma Europa social”. Mas o evento deixa uma polémica com as refeições distribuídas aos agentes da PSP e uma factura de cerca de um milhão de euros.

A Estrutura de Missão da Presidência Portuguesa da União Europeia (UE) gastou cerca de um milhão de euros na organização da Cimeira Social no Porto.

As contas são avançadas pelo Correio da Manhã (CM) que refere que estão em causa “dezenas de contratos” por ajuste directo para o fornecimento de vários itens, como, por exemplo, máscaras anti-covid, prendas institucionais, comida, bebidas, alcatifas, automóveis, palcos e sistemas de som, entre outros.

Além disso, há também os gastos com as estadias em hotéis para as comitivas dos vários países que participaram na Cimeira.

As despesas da presidência portuguesa da UE já tinham sido destacadas pelo site internacional Politico que noticiou “gastos incomuns” com “um centro de imprensa vazio” e “milhares de euros para bebidas e centenas de fatos”.

Sindicato da PSP indignado com comida “degradante”

Para a história da Cimeira Social no Porto fica ainda a indignação dos agentes da polícia destacados para fazerem a segurança do evento com as refeições que lhes foram distribuídas pela organização.

Muitos dos mais de 6 mil agentes destacados para a Cimeira foram deslocados pela PSP de comandos noutras cidades e “receberam sandes, sumos, uma pequena caixa com bolos, e uma embalagem com batatas assadas, como alimentação para as refeições de almoço e jantar”, como avança o CM com base em declarações do presidente do Sindicato dos Profissionais de Polícia (SPP), Mário Andrade.

“Consideramos degradante que os agentes recebam estes alimentos para um dia inteiro de trabalho. Muitos estão fora do seu local de trabalho e de residência e não têm alternativas”, aponta Mário Andrade neste jornal.

Uma fonte oficial da Direcção-Nacional da PSP assegura, entretanto, ao mesmo diário, que “foi um erro” e que “não foi nada disto que ficou combinado com a estrutura de missão que organiza a Cimeira Social”.

“Já sinalizámos o nosso desagrado por esta situação, e o Director-Nacional ordenou que os agentes recebessem em dinheiro o valor do almoço desta sexta-feira (consumido da comida entregue pela estrutura de missão), e que daqui até domingo, quando termina a Cimeira, recebam as refeições que tinham ficado combinadas”, salienta a mesma fonte ao CM.

Declaração do Porto firma compromisso com “Europa Social”

Na conclusão da Cimeira Social do Porto, fica o compromisso dos chefes de Estado e de Governo da UE no sentido de “aprofundar a implementação” do Pilar Europeu dos Direitos Sociais como um “elemento fundamental da recuperação” pós-crise pandémica.

“A sua implementação reforçará o impulso da União no sentido de uma transição digital, verde e justa e contribuirá para alcançar uma convergência social e económica ascendente e para enfrentar os desafios demográficos”, sublinham os líderes europeus na Declaração do Porto, firmada na conclusão da Cimeira, neste sábado.

No documento, vinca-se que “à medida que a Europa se recupera gradualmente da pandemia de covid-19, a prioridade será passar da protecção à criação de empregos e melhorar a qualidade do emprego, onde as pequenas e médias empresas (incluindo as empresas sociais) desempenham um papel fundamental”.

Para tal, fica o “compromisso com a unidade e a solidariedade”, o que “também significa assegurar a igualdade de oportunidades para todos e que ninguém seja deixado para trás”, reforça ainda a Declaração.

Polémica com a palavra “género”

Um ponto polémico da Declaração do Porto diz respeito à utilização da palavra “género” que foi contestada, mas não bloqueada ao nível do Conselho pela Polónia e pela Hungria.

Nessa parte, os líderes europeus comprometem-se a “intensificar esforços para combater a discriminação” e a “trabalhar activamente para reduzir as disparidades de género no emprego, remuneração e pensões e para promover a igualdade e justiça para cada indivíduo”.

“A Europa deve ser o continente da coesão social e da prosperidade”, sustentam ainda, reforçando o “compromisso de trabalhar em prol de uma Europa social“.

A Cimeira Social que arrancou na sexta-feira teve no centro da agenda o plano de acção do Pilar Europeu dos Direitos Sociais, apresentado pela Comissão Europeia em Março passado.

Este plano prevê 3 grandes metas para 2030: ter pelo menos 78% da população empregada, 60% dos trabalhadores a receberem formação anualmente e retirar 15 milhões de pessoas, cinco milhões das quais crianças, das condições de risco de pobreza e exclusão social.

O objectivo era, nesta Cimeira Social, obter um compromisso político forte sobre um programa com medidas concretas para executar esse Pilar Social Europeu, com um texto não vinculativo de 20 princípios para promover os direitos sociais na Europa aprovado em Gotemburgo (Suécia) em Novembro de 2017.

O texto defende um funcionamento mais justo e eficaz dos mercados de trabalho e dos sistemas de protecção social, nomeadamente ao nível da igualdade de oportunidades, acesso ao mercado de trabalho, protecção social, cuidados de saúde, aprendizagem ao longo da vida, equilíbrio entre vida profissional e familiar e igualdade salarial entre homens e mulheres.