Há três anos que chove nos corredores da urgência do hospital de Setúbal. Sindicalistas alertam para a situação precária vivida pelos profissionais de saúde sadinos.
O “estado de calamidade” em vários hospitais pelo país inteiro não é novidade. O Centro Hospitalar de Setúbal (CHS) é talvez um dos mais afetados, onde no início deste mês, 87 diretores de serviço e unidades funcionais do hospital demitiram-se em bloco.
O antigo diretor clínico, Nuno Fachada, que também se demitiu, explicou que o pedido de demissão era um “grito de revolta para a situação desesperante e de rutura em vários serviços” daquele hospital.
“Estamos em rutura nos serviços de urgência, nos blocos operatórios, na oncologia, na maternidade, anestesia, etc., etc., etc.”, acrescentou o ex-diretor do CHS.
Nas urgências do Hospital de São Bernardo, em Setúbal, “houve uma altura — no pico da pandemia — em que estavam quatro enfermeiros obrigados a seguir o turno, sem aviso prévio, porque não havia ninguém para os substituir”, denuncia a enfermeira e dirigente sindical, Zoraima Prado, em declarações ao jornal NOVO.
A situação agora é pior, contra Prado, já que para “além de tudo o que existia, temos a recuperação daquilo que não se fez no último ano e meio e continuamos a dar resposta à pandemia”.
“Os corredores já estão transformados numa espécie de enfermaria. O trabalho já é atribuído por corredor. Corredor x, seis camas — ou macas, neste caso — e a chover há três anos. Há corredores no serviço de urgência do hospital de Setúbal onde chove há três anos”, descreveu.
Nuno Fachada defendeu que “as obras de alargamento do CHS, com início previsto para o próximo ano”, devem servir para “promover e potenciar o crescimento do Hospital de São Bernardo” e que “não poderão nunca servir para condensar o resto do centro hospitalar, ou seja, encaixar o Hospital do Outão ou a unidade de psiquiatria de ambulatório”.
O semanário NOVO expõe a gravidade do problema. Digamos que uma pessoa que tenha sofrido um AVC em Grândola precisa de assistência médica urgente. Uma rutura no Hospital de São Bernardo pode custar mais 15 minutos e 16,4 quilómetros. Se o Hospital do Barreiro estiver entupido, a situação piora e o paciente tem de ser transportado para Hospital de Santa Maria, em Lisboa, demorando mais 45 minutos e 33,2 quilómetros.
“Apesar de terem renunciado aos cargos, os médicos não despiram a bata. Continuam a trabalhar”, realça o coordenador da União dos Sindicatos da CGTP, Luís Leitão.
Os enfermeiros “chegam a ter 206 turnos extraordinários para cobrir por mês”, denuncia ainda Zoraima Prado.
“O SNS tem de voltar a ser, porque já foi, atrativo. Hoje, os enfermeiros não se sentem motivados. Não há progressão na carreira, os salários são baixos e não há respeito por direitos básicos como o direito ao descanso ou os direitos parentais, nomeadamente a hora da amamentação que é básico”, prosseguiu a sindicalista.
Só este ano, a Ordem dos Médicos já fez quatro alertas públicos sobre o Centro Hospitalar de Setúbal.