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“Grito de revolta.” Demissão em bloco de 87 médicos do Hospital de Setúbal

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Patricia de Melo Moreira / AFP

Após a demissão do diretor clínico do Hospital de Setúbal, Nuno Fachada, na semana passada, 87 diretores de serviço e unidades funcionais do hospital demitiram-se em bloco.

Um total de 87 diretores de serviço e unidades funcionais do Centro Hospitalar de Setúbal (CHS) apresentaram a demissão esta quarta-feira. Estes profissionais juntam-se assim a Nuno Fachada, diretor clínico do centro hospitalar, que se demitiu na semana passada por falta de condições de trabalho.

O diretor clínico, Nuno Fachada, afirmou, esta quarta-feira, que o pedido de demissão é um “grito de revolta para a situação desesperante e de rutura em vários serviços” daquele hospital.

“O pedido de demissão do cargo de diretor clínico do Centro Hospitalar de Setúbal, e agora da restante direção clínica, diretores de serviço e departamentos, coordenadores de unidade e comissões e ainda chefes de equipa de urgência, num total de 87 assinaturas, é o último grito de alerta para a situação desesperante a que o Centro Hospitalar de Setúbal chegou, à rutura das urgências e em vários serviços primordiais do hospital”, disse.

Estamos em rutura nos serviços de urgência, nos blocos operatórios, na oncologia, na maternidade, anestesia, etc., etc., etc.”, acrescentou o diretor do CHS, em conferência de imprensa realizada na delegação de Setúbal da Ordem dos Médicos.

Acompanhado por vários diretores de serviço demissionários, pelo presidente da secção sul da Ordem dos Médicos, Alexandre Valentim Lourenço, pelo secretário-geral do Sindicato Independente dos Médicos, Jorge Roque da Cunha, e pelo Bastonário Miguel Guimarães, Nuno Fachada garantiu que o Hospital de São Bernardo, tal como está, já “não consegue mais responder à sua população”.

“É o momento de se cumprir o prometido. O Centro Hospitalar de Setúbal tem que ser reconvertido para o grupo D dos hospitais, ou seja, deixar de ser financiado como um simples hospital distrital e passar a ser uma unidade multidisciplinar”, disse.

Nuno Fachada defende que “é preciso criar condições para que se acabe de vez com a fuga dos médicos e outros profissionais para o setor privado e para o estrangeiro, por falta de meios e condições de fixação [dos médicos]”.

Por outro lado, defendeu que “as obras de alargamento do CHS, com início previsto para o próximo ano”, devem servir para “promover e potenciar o crescimento do Hospital de São Bernardo” e que “não poderão nunca servir para condensar o resto do centro hospitalar, ou seja, encaixar o Hospital do Outão ou a unidade de psiquiatria de ambulatório”.

Seria trágico ver as ansiadas obras servirem para agravar o pesadelo já existente”, disse Nuno Fachada, deixando claro que a ampliação prevista não terá capacidade para acolher o Hospital Ortopédico do Outão e o serviço ambulatório de psiquiatria.

Na conferência de imprensa, o presidente da secção sul da Ordem dos Médicos, Alexandre Valentim Loureiro, lembrou os sucessivos atrasos na ampliação do Hospital de São Bernardo e na requalificação do serviço de urgência, que, ao longo dos últimos quatro anos, têm sido sucessivamente adiadas.

Alexandre Valentim Lourenço salientou também o testemunho de alguns diretores de serviço, que na mesma conferência de imprensa, lembraram que há “dois mil doentes com cancro que têm de ser transferidos para hospitais da capital e que 50% capacidade dos blocos operatórios não é utilizada por não haver anestesistas suficientes”.

Para resolver os problemas do CHS e do próprio Serviço Nacional de Saúde (SNS), o Bastonário da Ordem dos Médicos, Miguel Guimarães, defendeu a necessidade de uma política diferente de recursos humanos”, dando como exemplo a flexibilidade e a autonomia que os hospitais tiveram na contratação de profissionais de saúde durante a pandemia.

A ampliação do CHS, que tem sido sucessivamente adiada, bem como a valorização das carreiras médicas e a revisão da política de horas extraordinárias, em que os médicos do quadro recebem menos pelo trabalho extraordinário do que os médicos tarefeiros, foram outras medidas referidas pelo Bastonário como essenciais, não apenas no CHS, que disse ser o que está em pior situação, mas em todo o SNS.

Quanto à contratação de dez médicos especialistas para o CHS anunciada segunda-feira pelo secretário de Estado Adjunto e da Saúde, António Lacerda Sales, o bastonário lembrou o testemunho dado pouco antes pelo diretor do Serviço de Ginecologia de Obstetrícia, Pinto de Almeida, segundo o qual, esse número não daria sequer para preencher o quadro médico daquele serviço.

ZAP // Lusa

5 Comments

  1. Na boca de certos políticos e políticas, o SNS é tão bom e tão maravilhoso, não é?
    A mim parece-me é que esses políticos e políticas se esquecem de dizer que a única razão que faz o SNS ser tão bom e maravilhoso é o facto de o Estado explorar até ao osso os trabalhadores do SNS, usufruíndo na prática de verdadeiro trabalho escravo, super mal pago e com cargas horárias absurdas.
    Pois é, querido Estado, com trabalho escravo também eu faço uma g’anda figura.
    Os defensores acéfalos (e defensoras acéfalas, convém não esquecer essas BElas criaturas) do Estado esquecem-se sempre disto: O Estado é o pior e o mais canalha de todos os patrões, porque: 1) é o maior e mais poderoso de todos, 2) é o mais difícil de meter na linha quando se porta mal e, pior que tudo, 3) é o único que é polícia dele próprio.
    Lembrem-se disso.

  2. O que nos vale é que o país está bem governado e tudo funciona na perfeição. E até cobram poucos impostos para aquilo que nos dão. É o que nos vale!

  3. Aqui está um bom exemplo da governação do senhor Costa! Críticas no primeiro mandato ao governo anterior não faltaram e promessas de melhoria entre as quais o regresso dos profissionais de saúde que haviam saído do país, pois passado todos estes anos não só não regressaram como se tem acentuado o declínio do SNS que está a rebentar por todos os lados sem solução à vista. A degradação e descontentamento por parte dos serviços e profissionais é mais que evidente e o governo vai-se dando ao luxo de se gabar e autopromover como se estivesse a prestar um bom serviço ao país. Quem paga é o utente que acaba muitas vezes ter que recorrer ao privado e gastar as poucas economias que conseguiu ao longo da vida!

  4. Mais uma ação Política Partidária a justificar que as Ordens profissionais tal como existem são prejudiciais ao sistema do País, ficam caras aos Portugueses, e são bloqueadoras para as necessidades do País, com intervenções inadmissíveis como formação de mais Médicos, além de defenderem interesses de ordem empresariais.

  5. Existe um problema no sistema de formações profissionais no nosso País, que o BE por razões políticas partidárias não quer assumir para assegurar bases de apoio, o PCP não tem força Política, vai metendo a cabeça na areia, os partidos do PS para a Direita por razões de afinidades e de Grupos fazem que nada se passa, porque não se compreende que os Portugueses paguem uma pipa de Euros, muitas vezes com dificuldades a pagar impostos para formar especialidades como Médicos e Enfermeiros, e no final estejam livres para escolher quem dá mais ou mesmo ir para o estrangeiro, sem que no mínimo sejam obrigados a devolver aos contribuintes o investimento que com eles tiveram, talvez seja a razão porque no estrangeiro não os formem, não investam em formações Inglorias.

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