Apenas 32% das pacientes fizeram um diagnóstico e 91% foram operadas. Mais de 80% das doentes não recebe qualquer apoio da Segurança Social e muitas continuam a trabalhar quando estão a fazer tratamentos.
Um novo relatório do Instituto de Ciências da Saúde da Universidade Católica debruçou-se sobre o cancro da mama em Portugal, fazendo uma “avaliação de 360 graus” que abrange o diagnóstico e os tratamentos da doença no país.
Foram incluídos dados recolhidos em sete hospitais — os institutos portugueses de Oncologia do Porto e de Coimbra, os centros hospitalares Lisboa Norte, Trás-os-Montes e Alto Douro e Universitário do Algarve, o hospital de Évora e o Hospital da Luz em Lisboa, que é privado.
A investigação arrancou em 2018 e abrangeu uma análise de literatura, uma análise a vários indicadores relativos à qualidade do tratamento e ainda inquéritos e entrevistas a 98 doentes, 22 profissionais de saúde e cinco profissionais com cargos de chefia.
As conclusões são preocupantes, já que apenas 32% das doentes inquiridas participaram num rastreio ao cancro da mama, com a auto-apalpação e a mamografia pedida pelo médico assistente a serem os métodos mais usados.
Em média, passaram 58 dias desde o diagnóstico até ao início do tratamento. 91% das pacientes foram operadas e 48% tiveram de fazer uma mastectomia total.
O relatório aponta várias falhas na rede de apoio às doentes, tanto financeiro, com menos de 20% a receber ajuda da Segurança Social, como emocional e logístico, com 40% a recorrer a familiares para receberem apoio informal, relata o Expresso.
O impacto na saúde mental também não é esquecido. 71% das pacientes admite estar preocupada com a doença e 66% têm dificuldades em dormir.
As queixas dos profissionais são comuns a muitos hospitais — não há meios técnicos, físicos e humanos para responder a todos os casos, os tempos de espera são longos, o SNS está atrasado no uso de terapias inovadoras e há um número excessivo de consultas médicas que resultam do medo da recidiva das doentes.
“Uma das coisas que os médicos e os administradores referiram nos inquéritos foi que o acesso a meios complementares, não só para diagnóstico mas também para estadiamento [da doença], é difícil”, refere Luís Costa, oncologista no Hospital de Santa Maria, que acrescenta que todos os hospitais “foram unânimes” e consideram que os meios atuais “são insuficientes”.
A grande maioria das pacientes, especialmente as mais jovens, continua a trabalhar enquanto está a ser tratada. “Achamos que desse ponto de vista a lei do trabalho tem de estar mais ajustada”, afirma Luís Costa em declarações ao Público, recomendando a possibilidade de se trabalhar em tempo parcial e com a adaptação do posto de trabalho às necessidades da doente.
O clínico recomenda ainda a criação de uma “via verde de referenciação” para que as doentes estejam informadas de tudo após o diagnóstico. “Quando têm a notícia de que têm provavelmente um cancro, as mulheres vivem dias de muita angústia até saberem o que tem de ser feito, como e por quem vai ser feito. Tem de haver maior integração dos cuidados de saúde primários, e do médico assistente, com as instituições que podem dar resposta a esta situação”, remata.