“Não aceito lições de moral”. Caldo entornado entre Marcelo, Moedas e Montenegro

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Manuel de Almeida, Mário Cruz / Lusa; PSD / Flickr

Depois de Marcelo Rebelo de Sousa pedir “bom senso” a Montenegro e Moedas quanto ao tema de imigração, o líder do PSD e o autarca lisboeta retaliaram.

O Presidente da República pediu hoje “bom senso” a Montenegro e Moedas quanto a um “tema tão sensível” como os imigrantes e considerou que “declarações muito emocionais feitas em cima de casos correm o risco de ser irracionais”.

“Quando se trata de um tema tão sensível como esse, nós temos de ter muito bom senso no seu tratamento. Estamos a falar de pessoas, de pessoas que são vítimas em muitos casos de redes de utilização de seres humano, e estamos a falar de deficiências do funcionamento do enquadramento dessas pessoas na sua legislação ou no acompanhamento da sua atividade laboral, e isso já é uma responsabilidade nossa”, defendeu.

Em declarações aos jornalistas no final de mais uma edição da iniciativa “Músicos no Palácio de Belém”, Marcelo Rebelo de Sousa foi questionado sobre declarações do presidente da Câmara de Lisboa, o social-democrata Carlos Moedas, e do presidente do PSD, Luís Montenegro, no que toca à política de imigração.

Na semana passada, a propósito do incêndio na Mouraria que matou duas pessoas, Carlos Moedas defendeu que se deve estabelecer limites por setores à imigração e criticou que seja possível atualmente a entrada de imigrantes em Portugal sem contrato de trabalho. Já Luís Montenegro considerou que o país deve receber imigrantes “de forma regulada” e “procurar pelo mundo” as comunidades que possam interagir melhor com os portugueses.

“Declarações muito emocionais feitas em cima de casos correm o risco de ser irracionais e de irem a reboque de posições mais emocionais que essas terão sempre mais sucesso em termos de captar a opinião pública”, salientou o Presidente da República.

Advertindo que “a cópia perde sempre para o original”, o chefe de Estado apontou que “as posições que são tomadas não podem ser tomadas atrás das emoções”.

“É facílimo ir atrás das emoções, mas quando se vai atrás das emoções há dois problemas. Primeiro, a emoção muitas vezes não ser racional, segundo problema é aquele que é mais emocional ganha sempre”, sustentou.

“O problema não é captar o sucesso da opinião pública, andar a disputar votos a ver quem é mais emocional nessa matéria — alguns dirão mais populista — mas é quem é que vê a questão com frieza em termos do interesse do país, do interesse de Portugal a curto, a médio e a longo prazo”, defendeu Marcelo Rebelo de Sousa.

O Presidente assinalou que Portugal “tem emigrantes espalhados pelo mundo e portanto não pode ter dois pesos e duas medidas”, nomeadamente o discurso de que “quando são os nossos são bons, quando são os outros são maus, mesmo que os outros estejam a fazer coisas sem as quais a economia não funcionava, que é o que se passa em muitos casos, vêm fazer e ter a seu cargo atividades profissionais que os portugueses não querem”.

Questionado se falta bom senso ao presidente do PSD, o Presidente da República apontou que esta “é uma reflexão genérica mostrada pela prática” e que “é muito simples: manter a cabeça fria e não ir a correr atrás do prejuízo, pensando que se pode cobrir quem tem posições mais emocionais”.

“O meu sogro é marroquino, a minha sogra é tunisina, não aceito lições de moral”

Carlos Moedas afirmou que não aceita lições “de ninguém” sobre emigração e imigração, realçando a experiência pessoal nesta matéria, e reiterou que Portugal precisa de uma política de imigração digna.

“Eu fui emigrante, sou casado com uma imigrante, o meu sogro é marroquino, a minha sogra é tunisina, por isso, há algo que gostaria de deixar muito claro: não aceito lições de ninguém nesta matéria, de ninguém”, declarou Carlos Moedas, na reunião da Assembleia Municipal de Lisboa, num recado a Luís Montenegro, presidente do PSD, e ainda a Marcelo Rebelo de Sousa.

Na apresentação da atividade do executivo municipal nos últimos três meses, entre novembro e janeiro, o autarca social-democrata disse que Portugal “precisa de imigrantes”, começando por deixar “uma palavra muito sentida, muito profunda, de pesar pelo trágico falecimento de duas pessoas” num incêndio num prédio no bairro da Mouraria, na freguesia de Santa Maria Maior, que ocorreu no dia 4 de fevereiro.

“Apesar de a investigação ainda estar a decorrer, sabemos, infelizmente, que estes dramas acontecem e têm acontecido na nossa cidade. Todos nos lembramos de vários destes tipos de dramas e ainda bem que nos lembramos, […] porque temos de mudar as coisas. Lembro-me, perfeitamente, ainda em julho de 2021, também na Rua Morais Soares, quando duas pessoas perderam a vida”, indicou Carlos Moedas.

O presidente da câmara reforçou que conhece “a emigração e a imigração na primeira pessoa, como poucos em Portugal”, e defendeu que “o país precisa de uma política de imigração digna”.

“Aquilo que nós temos em Portugal hoje não é digno e é isso por aquilo que irei lutar. Irei lutar exatamente como político por essa dignidade da nossa imigração, exatamente porque conheço, exatamente porque quero que isso mude e porque é um desafio para todos”, declarou.

Nesse âmbito, o autarca pediu aos vereadores da Habitação, Filipa Roseta (PSD), dos Direitos Humanos e Sociais, Sofia Athayde (CDS-PP), e da Proteção Civil, Ângelo Pereira (PSD), “que reunissem o mais rápido possível com o SEF [Serviço de Estrangeiros e Fronteiras]”, para se trabalhar em conjunto, para se encontrarem “soluções entre todos”

Carlos Moedas deixou, ainda, um apelo a todos os presidentes de juntas de freguesia para colaborarem na resposta necessária, uma vez que estes autarcas “são essenciais no papel que têm de proximidade junto de todas estas comunidades”.

O social-democrata frisou que as comunidades de imigrantes “são bem-vindas, são lisboetas” e que o município lutará “por elas, mas com dignidade”.

Montenegro diz que pedido de bom senso não foi para si “de certeza absoluta”

O presidente do PSD recusou que o pedido de bom senso do Presidente da República sobre imigração tenha sido dirigido a si, salientou não admitir qualquer acusação de xenofobia e rejeitou que haja qualquer aproximação ao Chega.

“Não ouvi as declarações do Presidente da República, mas posso ter a certeza absoluta de que não se dirigiam a mim, porque o Presidente da República é uma pessoa sensata, que me conhece bem, os meus valores morais, éticos e humanos”, afirmou Luís Montenegro, questionado pelos jornalistas no final de uma iniciativa do PSD sobre habitação em Lisboa.

Sobre a declaração do Presidente, de que a cópia “será sempre melhor que o original”, Montenegro salientou que o PSD, como partido fundador da democracia, será sempre “o original” e, à pergunta se as suas declarações recentes, revelam uma aproximação ao Chega respondeu com uma única palavra: “Não”.

“Nos últimos dias eu disse – e reafirmo – que as pessoas que trabalham não devem, numa sociedade justa e equilibrada, ter um rendimento inferior às pessoas que não trabalham. Não falei de desempregados e pensionistas, como vejo para aí nas redes sociais”, disse.

Questionado a quem se dirigia, o presidente do PSD concretizou: “Estou a falar das pessoas que estão na esfera de dependência das prestações sociais – prestações que são necessárias, não defendo que acabem – mas não podemos ter uma sociedade que incentiva que esse número de pessoas aumente em detrimento das que trabalham”.

“Isto parece-me tão óbvio que fico sinceramente admirado como poderão alguns dos nossos adversários deturpar essas palavras”, afirmou.

No caso das suas afirmações sobre imigração, Montenegro classificou de escandaloso o tipo de críticas que lhe têm sido dirigidas e, questionado sobre quem diz que roçam xenofobia, desafiou o jornalista a dizer quem fez esse tipo de acusações, dizendo não as admitir e ameaçando até processar quem as fizer.

“Há cinco anos disse num congresso do PSD que era preciso haver um programa nacional de atração, acolhimento e integração de imigrantes (…) Defender que possamos ser profissionais, no sentido bom do termo, e procurarmos saber quantas pessoas precisamos, em que áreas, com que qualificações, isto significa algum tipo de xenofobia? Em que país do mundo?” questionou.

“Eu não fecho as portas a ninguém, defender este programa não significa que as portas se fecham para os outros. Sinceramente, acho que se podiam distrair a falar do que interessa às pessoas e não em manobras de retórica semântica”, criticou.

ZAP // Lusa

4 Comments

  1. “O Presidente da República pediu hoje “bom senso” a Montenegro e Moedas quanto a um “tema tão sensível” como os imigrantes e considerou que “declarações muito emocionais feitas em cima de casos correm o risco de ser irracionais”.”

    O Presidente sabe do que fala(?).
    Vejam-se as suas declarações sobre a pedofilia na igreja! (“declarações muito emocionais feitas em cima de casos correm o risco de ser irracionais”.)

  2. Carlos Moedas com posição de estadista. É um Senhor. Com disciplina e rigor consegue concretizar o que os outros prometeram e nada fizeram, apesar dos engodos que lhe são colocados. Os Lisboetas não se distraíram e penalizaram o Medina nas eleições autárquicas.

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