“A Terra é plana” e outras conspirações: o trumpismo está ligado ao negacionismo

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(dr) Boris Baldinger / Fórum Económico Mundial

O ex-presidente dos EUA, Donald Trump

Apoiantes do candidato republicano são mais propensos a rejeitar a Ciência e a “inventar” teorias da conspiração como a fraude da ida à Lua ou a implantação de chips de localização a partir da administração de vacinas, diz novo estudo.

Há uma correlação significativa entre o apoio ao ex-Presidente Donald Trump e crenças anti-científicas — particularmente em relação às alterações climáticas e à COVID-19, aponta um estudo publicado recentemente na revista PLOS One.

Os apoiantes do candidato à liderança republicana nos EUA são mais propensos a rejeitar o consenso científico sobre vários assuntos e têm tendência para acreditar e “inventar” diversas teorias da conspiração, aponta o estudo baseado em dados do inquérito POLES 2021, que envolveu 1.134 adultos dos EUA, de acordo com o IFL Science.

“A aprovação de Trump correlaciona-se com outras visões de conspiração ou rejeição da ciência”, começa por acusar a pesquisa.

Quem apoia Trump está mais inclinado a acreditar em teorias que dizem que a Terra é plana, na fraude da ida à Lua em 1969 e em conspirações como as que acusam as vacinas de implantar microchips de localização. Tendem ainda a discordar de visões científicas cimentadas como a idade da Terra, a evolução humana, o impacto das atividades humanas no clima e os benefícios das vacinas.

“Os ‘trumpistas’ mostram maior concordância não só com teorias da Terra plana e conspirações sobre a aterragem na Lua, mas também de que os perigos da COVID-19 foram exagerados pelos cientistas“, lê-se no estudo.

“Ao mesmo tempo, expressam menor concordância com conclusões científicas de que a Terra tem milhares de milhões de anos, os humanos evoluíram de formas de vida anteriores, as atividades humanas estão a mudar o clima ou que as vacinas são maioritariamente benéficas”, acrescenta.

Trumpismo e negacionismo de mãos dadas

As ligações, encontradas após a análise dos dados do inquérito — que colocou uma série de perguntas sobre a identidade e origem sociopolítica dos entrevistados e as suas opiniões acerca de assuntos como o clima e a COVID-19 —, levaram os investigadores, liderados pelo sociologista Lawrence Hamilton da Universidade de New Hampshire, a concluir que o Trumpismo está ligado ao negacionismo.

O Trumpismo consiste na ideologia conservadora populista associada nomeadamente ao populismo, nacionalismo e conservadorismo. É visto como um conjunto de mecanismos políticos e sociais que procuram atribuir — e manter — o controlo do poder associado a Donald Trump.

O negacionismo, por sua vez, é uma corrente de pensamento que se baseia na recusa em aceitar informações científicas estabelecidas, factos históricos ou evidências mais que comprovadas. Manifesta-se em praticamente qualquer área, com a científica e histórica a surgirem entre as mais comuns.

A ligação entre os dois fenómenos acaba por não ser, se pensarmos, assim tão surpreendente. A tendência está frequentemente ligada a motivações ideológicas, políticas ou económicas e pode ser promovida por grupos ou indivíduos com interesses específicos em desacreditar informações aceites pela maioria da comunidade científica.

“No caso das alterações climáticas e da COVID, os preconceitos pré-existentes contra os cientistas foram reforçados por mensagens de elites económicas e políticas que servem interesses como o uso de combustíveis fósseis ou a reeleição de Trump”, acrescenta o estudo publicado a 10 de janeiro.

Variações demográficas

O estudo aprofunda ainda certas variações demográficas na rejeição da ciência.

Enquanto as mulheres “trumpistas” são mais propensas a rejeitar vacinas contra a COVID-19, a negação das alterações climáticas mostra-se consistente entre homens e mulheres.

A idade também influencia estas crenças de maneira diferente: “trumpistas” mais velhos têm maior probabilidade de negar as alterações climáticas, enquanto os mais jovens demonstram maior ceticismo em relação às vacinas. A probabilidade de negar as alterações climáticas aumenta com a idade, enquanto a probabilidade de rejeição de vacinas diminui à medida que as pessoas envelhecem.

A rejeição da ciência é menos comum entre pessoas com níveis de educação mais elevados.

Cerca de 10% dos inquiridos acreditavam que a Terra é plana — e outros 9% não tinham a certeza.

Politização da ciência

A análise indica uma tendência mais ampla de politização da ciência.

Enquanto as identidades políticas conservadoras continuam a mostrar historicamente menos preocupação com questões ambientais e a opor-se a intervenções, parte da confiança pública na ciência será encaminhada para uma tendência anti-científica que, acreditam os investigadores, se tem vindo a acentuar na última década.

O caso de Trump é flagrante. Desde cedo na sua primeira corrida à presidência norte-americana que fomentou o conspiracionismo com um discurso polémico, provocador e chocante que muitas vezes incidiu sobre as suas posições que contrariam o consenso científico. A retirada dos EUA do Acordo de Paris e constante redução de regulamentações ambientais no seu mandato foram reflexos desse discurso.

Olhando para a sua perspetiva da saúde pública, a gestão da pandemia de COVID-19 de Trump destacou-se pela minimização da gravidade da doença e pela promoção de informações e tratamentos que nunca foram comprovados cientificamente.

“Embora o futuro pessoal de Trump seja incerto, os seus profundos efeitos na sociedade dos EUA dificilmente desaparecerão em breve; em alguns cenários, poderão intensificar-se. Mesmo que o apoio ao próprio Trump reduza, elementos de conspiracionismo e rejeição da ciência podem tornar-se mais pronunciados entre os seus principais seguidores ou associar-se a novas queixas e líderes”, alerta o estudo.

Tomás Guimarães, ZAP //

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