O solo alberga genes de resistência aos antibióticos que ameaçam a saúde pública e as atividades humanas influenciam a sua propagação, sobretudo através de bactérias como a listeria.
O solo desempenha um papel muito mais importante na propagação da resistência aos antibióticos do que se poderia imaginar.
Surpreendentemente, o solo por baixo de nós está repleto de genes de resistência aos antibióticos (ARGs) – pequenos códigos que permitem às bactérias resistir aos antibióticos.
As actividades humanas, como a poluição e a alteração da utilização dos solos, podem perturbar os ecossistemas do solo e facilitar a transferência de genes de resistência das bactérias do solo para os seres humanos.
Num novo estudo, Jingqiu Liao, professora assistente de engenharia civil e ambiental na Virginia Tech, procurou compreender de que forma as bactérias do solo contribuem para a crescente questão global da resistência aos antibióticos.
Os resultados do estudo, que foram recentemente publicados na revista Nature Communications, mostram que, uma vez que as bactérias adquirem estes genes resistentes, estes podem ser rapidamente transmitidos a outras espécies, o que faz com que esta seja uma ameaça premente para a saúde pública.
A compreensão destes padrões pode ajudar os cientistas a encontrar formas de controlar a propagação da resistência aos antibióticos, protegendo a saúde humana e preservando a eficácia dos antibióticos para as gerações futuras.
O solo não é apenas sujidade – é um ecossistema cheio de bactérias. Algumas destas bactérias transportam naturalmente ARGs, que as ajudam a combater os antibióticos.
Embora isto possa não parecer um grande problema à primeira vista, torna-se perigoso quando estas ARGs se transformam em bactérias nocivas que infetam os seres humanos.
Uma dessas bactérias é a Listeria monocytogenes. Este habitante do solo pode entrar na cadeia alimentar e causar uma doença grave chamada listeriose. Para pessoas com sistemas imunitários enfraquecidos, a listeriose pode ser mortal, com taxas de mortalidade que podem atingir os 20 a 30 por cento.
Devido à sua capacidade de propagar ARGs e infetar seres humanos, a listeria é um modelo importante para estudar a forma como a resistência aos antibióticos se desenvolve no solo e se propaga para outros ambientes.
“O solo é um importante reservatório de bactérias resistentes e ARGs”, explica Liao, em comunicado da Virginia Tech. “Os fatores ambientais podem amplificar os ARGs criando condições que promovem a sobrevivência, a propagação e a troca destes genes entre as bactérias”.
“Os mecanismos ecológicos e evolutivos subjacentes à dinâmica dos ARGs nos solos continuam a ser insuficientemente explorados. Neste estudo, utilizamos a listeria como modelo-chave para compreender a emergência e o desenvolvimento de ARGs nos solos”, acrescenta a investigadora.
No decorrer do seu estudo, os membros da equipa analisaram cerca de 600 genomas de listeria de amostras de solo que Liao tinha recolhido num estudo anterior, publicado na Nature Microbiology, e identificaram cinco ARGs principais de todos os Estados Unidos.
O estudo também revelou como os ARGs se propagam entre as bactérias. Um processo designado por transformação permite que as bactérias apanhem pedaços soltos de ADN contendo ARGs do seu meio envolvente.
Depois de uma bactéria adquirir estes genes, pode passá-los a outras — mesmo a espécies diferentes. Esta rápida partilha de genes de resistência é uma das principais razões pelas quais a resistência aos antibióticos é tão difícil de combater.
Com base nesta investigação, Liao espera agora encontrar novas estratégias para controlar a resistência aos antibióticos, de modo a que que os antibióticos possam continuar a ser eficazes no tratamento de infeções nos próximos anos.
“Estabelecer uma compreensão fundamental dos fatores ecológicos destas bactérias no solo pode ajudar-nos a compreender melhor o aparecimento, a evolução e a propagação da resistência aos antibióticos”, afirmou Liao. “Trata-se de uma ameaça urgente e global para a saúde pública“.