A água do cometa 67P é igual à dos oceanos da Terra

Rosetta / NavCam / ESA

Imagem obtida no dia 15 de maio de 2016 pela câmara de navegação da Rosetta, a cerca de 9,9 km do centro do núcleo do Cometa 67P/Churyumov-Gerasimenko.

Uma equipa de investigadores da NASA descobriu que a água do cometa 67P/Churyumov-Gerasimenko tem uma assinatura molecular semelhante à da água dos oceanos da Terra.

A descoberta de uma assinatura molecular na água do cometa 67/P semelhante à da água da Terra reabre a hipótese de que cometas da família de Júpiter, como este, poderem ter ajudado a trazer água para a Terra.

A água foi essencial para que a vida se formasse e florescesse na Terra e continua a ser fundamental para a vida terrestre atual.

Embora fosse provável que existisse alguma água no gás e na poeira a partir dos quais o nosso planeta se materializou há cerca de 4,6 mil milhões de anos, grande parte da água ter-se-ia vaporizado porque a Terra se formou perto do calor intenso do Sol.

A forma como a Terra se tornou rica em água líquida continua a ser uma fonte de debate para os cientistas. Alguns estudos mostraram que alguma da água da Terra teve origem no vapor libertado pelos vulcões; esse vapor condensou-se e choveu nos oceanos.

Mas os cientistas descobriram também evidências de que uma parte substancial dos nossos oceanos provém do gelo e dos minerais dos asteroides, e possivelmente dos cometas, que colidiram com a Terra.

Uma onda de colisões de cometas e asteroides com os planetas interiores do Sistema Solar há 4 mil milhões de anos teria tornado isto possível. Embora a ligação entre a água dos asteroides e a da Terra seja forte, o papel dos cometas tem intrigado os cientistas.

Várias medições de cometas da família de Júpiter – que contêm material primitivo dos primórdios do Sistema Solar e que se pensa terem sido formados para além da órbita de Saturno – mostraram uma forte ligação entre a sua água e a da Terra.

Esta ligação baseia-se numa assinatura molecular chave que os cientistas utilizam para rastrear a origem da água pelo Sistema Solar. Esta assinatura específica é o rácio entre o deutério (D) e o hidrogénio normal (H) na água de qualquer objeto, e dá aos cientistas pistas sobre o local onde esse objeto se formou.

O deutério é um tipo raro e mais pesado – ou isótopo – de hidrogénio. Quando comparado com a água da Terra, este rácio de hidrogénio nos cometas e asteroides pode revelar se existe uma ligação.

Como a água com deutério tem maior probabilidade de se formar em ambientes frios, há uma maior concentração do isótopo em objetos que se formaram longe do Sol, como os cometas, do que em objetos que se formaram mais perto do Sol, como os asteroides.

As medições, efetuadas nas últimas duas décadas, do deutério no vapor de água de vários outros cometas da família de Júpiter revelaram níveis semelhantes aos da água da Terra.

“Começava a parecer que estes cometas desempenhavam um papel importante no transporte de água para a Terra”, disse Kathleen Mandt, cientista planetária do Centro de Voo Espacial Goddard da NASA em Greenbelt, no estado norte-americano de Maryland.

Mandt liderou o estudo, cujos resultados foram apresentados num artigo publicado em novembro na Science Advances, que revê a abundância de deutério no cometa 67P.

Em 2014, a histórica missão Rosetta, da Agência Espacial Europeia / ESA, que levou a sonda Philae a pousar no 67P, desafiou a ideia de que os cometas da família de Júpiter ajudaram a encher o reservatório de água da Terra.

Os cientistas que analisaram as medições de água obtidas pela Rosetta encontraram a maior concentração de deutério de qualquer cometa e cerca de três vezes mais deutério do que nos oceanos da Terra, que têm cerca de 1 átomo de deutério por cada 6420 átomos de hidrogénio.

Foi uma grande surpresa e fez-nos repensar tudo“, disse Mandt.

A equipa de Mandt decidiu utilizar uma técnica avançada de computação estatística para automatizar o laborioso processo de isolamento da água rica em deutério em mais de 16.000 medições da Rosetta.

A Rosetta efetuou estas medições na “cabeleira” de gás e poeira que rodeia o cometa 67P. A equipa de Mandt, que incluía cientistas da Rosetta, foi a primeira a analisar todas as medições de água da missão europeia ao longo de toda a missão.

Os investigadores queriam compreender quais os processos físicos que causavam a variabilidade nas razões isotópicas de hidrogénio medidas nos cometas.

Estudos laboratoriais e observações de cometas mostraram que a poeira cometária pode afetar as leituras do rácio de hidrogénio que os cientistas detetam no vapor do cometa, o que pode alterar a nossa compreensão da origem da água do cometa e da sua comparação com a água da Terra.

“Por isso, estava curiosa para saber se encontrávamos evidências de que isso acontecia no cometa 67P”, disse Mandt. “E este é um daqueles casos muito raros em que se propõe uma hipótese e se descobre que ela está realmente a acontecer“.

De facto, a equipa de Mandt encontrou uma ligação clara entre as medições de deutério na cabeleira de 67P e a quantidade de poeira à volta da nave espacial Rosetta, mostrando que as medições feitas perto da nave espacial em algumas partes da cabeleira podem não ser representativas da composição do corpo do cometa.

À medida que um cometa se move na sua órbita para mais perto do Sol, a sua superfície aquece, provocando a libertação de gás da superfície, incluindo poeira com pedaços de água gelada.

A água com deutério adere mais facilmente aos grãos de poeira do que a água normal, sugere a investigação. Quando o gelo destes grãos de poeira é libertado para a cabeleira, este efeito pode fazer com que o cometa pareça ter mais deutério do que tem.

Mandt e a sua equipa realçam que, quando a poeira chega à parte exterior da cabeleira, a pelo menos 120 quilómetros do corpo do cometa, já está seca. Com o desaparecimento da água rica em deutério, uma nave espacial pode medir com precisão a quantidade de deutério proveniente do corpo do cometa.

Esta descoberta, dizem os autores do estudo, tem grandes implicações não só para a compreensão do papel dos cometas no fornecimento de água à Terra, mas também para a compreensão das observações de cometas que fornecem informações sobre a formação do Sistema Solar primitivo.

“Isto significa que há uma grande oportunidade para rever as nossas observações passadas e preparar as futuras, de modo a podermos ter em conta os efeitos da poeira”, disse Mandt.

// CCVAlg

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