As pessoas com deficiência motora têm de avisar a CP com 48 horas de antecedência quando querem andar de comboio e não podem viajar a qualquer hora, como aconteceu a Marisa Lino, que até já ficou esquecida numa carruagem.
Marisa Lino tem 29 anos e sofre de artrogripose múltipla congénita, uma doença rara que lhe atrofia as extremidades do corpo, pernas e braços, obrigando-a a deslocar-se numa cadeira de rodas.
Como vive em Alverca, e porque mora próximo da estação, Marisa elegeu o comboio o seu transporte público de eleição sempre que precisa deslocar-se a Lisboa.
O problema é que isso obriga a que planeie a sua vida com pelo menos 48 horas de antecedência, mas nem mesmo quando o faz é garantido que tenha a viagem que pretende.
A 30 de Setembro fez um pedido junto da CP para, a 07 de Outubro, poder ir a Lisboa assistir a uma aula de dança adaptada.
“A hora de ida de Alverca para Entrecampos marquei para por volta das três e tal da tarde. O regresso marquei para as 20:37. No dia seguinte recebi a resposta por e-mail e foi-me negado essa viagem. Não pude viajar depois das 20:30 da noite”, contou à Lusa.
Segundo a própria, a explicação por parte da CP é que depois das 20:30 as bilheteiras estão fechadas e não há ninguém nessa altura para colocar a rampa que possibilita o acesso das pessoas em cadeiras de rodas ao comboio.
A CP confirmou, através de resposta escrita, que o seu Serviço Integrado de Mobilidade (SIM), que tem por objectivo apoiar as pessoas com mobilidade reduzida, funciona “dentro dos recursos disponíveis da empresa”, sendo necessária “marcação prévia de assistência no embarque e desembarque”.
De acordo com a empresa, não é possível prestar este serviço a todas as horas porque está dependente das “disponibilidades humanas e materiais” da CP. Explicou que os recursos humanos não são iguais em todas as estações e que, por isso, há estações onde o serviço funciona até às 23:30, mas outras há onde esse “horário tem outras limitações”.
Queixou-se, por outro lado, que o facto de não poder andar de comboio à noite limita as possibilidades de encontrar um novo emprego, de fazer uma formação ou até mesmo de sair à noite com os amigos.
No entanto, as limitações no serviço da CP não são os únicos motivos de reclamação.
“Já tive duas situações em que os revisores se esqueceram de me fazer sair do comboio. Uma das vezes era para sair em Entrecampos, fui parar a Benfica, duas paragens à frente, noutra cheguei a Alverca e foi por segundos que não voltei para Sintra”, contou.
Segundo Marisa, as situações foram prontamente resolvidas, mas decidiu mesmo assim reclamar junto da CP. Posteriormente, a 19 de Outubro, um revisor da CP deixa-lhe uma mensagem no facebook, criticando a sua postura e aconselhando-a a ter apoio psicológico por ter um “problema mental”.
Em nome do revisor, o Sindicato Ferroviário da Revisão Comercial Itinerante vem explicar que a atitude daquele funcionário da CP foi resultado da frustração sentida por entender que está a fazer o melhor trabalho possível e não compreender as reclamações apresentadas por Marisa.
Para Luís Bravo, a mensagem do revisor “é o desabafar de uma situação de injustiça”, sublinhando que a utente “teve sempre toda a atenção” por parte dos revisores e funcionários das bilheteiras.
“Estes trabalhadores estão diariamente disponíveis para ajudar e não compreendem o descontentamento da Marisa face ao serviço da CP”, apontou o sindicalista.
Segundo a CP, a mensagem deixada pelo revisor “está a ser alvo de averiguação interna” e “caso se comprove violação de dever laboral, serão retiradas as devidas consequências”.
Entretanto, Marisa Lino tem alguns desejos que gostava de ver cumpridos: poder viajar depois das 20h30, não ter de organizar a vida com 48 horas de antecedência e receber um pedido de desculpas.
/Lusa